15/04/2010

Dawkins e o Milagre de Fátima

 

Misturar Dawkins e a Virgem Santíssima num artigo me embrulha o estômago e me entristece a alma. Mas não fui eu que misturei, foi ele. Recebi, outro dia, de um amigo um link em que havia um artigo desse demente inglês sobre o milagre do sol.

O artigo é muito curto. Começa com um trecho de Hume: “[…] nenhum testemunho é suficiente para demonstrar um milagre, a não ser que o testemunho seja de natureza tal que a sua falsidade seja mais milagrosa do que o fato que tenta demonstrar.” David Hume, «Dos Milagres» (1748)

O silogismo bobinho que Dawkins monta a partir da frase de Hume é o seguinte:

Premissa maior: Milagres não ocorrem

Premissa menor: 70.000 pessoas afirmam ter presenciado um

Conclusão: Houve uma alucinação em massa que atingiu 70.000 pessoas

Depois de descrever tudo que aconteceria se o sol se movesse, ele diz: “Não temos alternativa senão a de seguir Hume, escolher a menos miraculosa das alternativas disponíveis e concluir, contrariamente à doutrina oficial do Vaticano, que o milagre de Fátima nunca aconteceu.”

Aí vem a apoteose final: “Além disso, não é de todo claro que nos caiba a nós explicar como é que aquelas 70 000 testemunhas foram enganadas.”

Perguntemos a Dawkins para começar: qual testemunho é suficiente para demonstrar a afirmação de Hume? A resposta implícita, claro, é que o testemunho suficiente é o do próprio Hume. A frase de Hume é verdadeira porque assim ele o diz.

O verdadeiro milagre é alguém com bom senso acreditar na baboseira de Hume.

Mas a frase final do artigo do Dawkins é de uma cretinice tão grande que me faz lembrar Chesterton descrevendo o ambiente das discussões intelectuais da Londres do final do século XIX, das quais ele foi testemunha: “havia uma agradável atmosfera de discussão de todas as coisas, sem qualquer particular senso de responsabilidade de se chegar a qualquer conclusão sobre elas.” Ou seja, o cara começa por dizer que a única alternativa ao suposto milagre é acreditar que houve uma alucinação coletiva de 70.000 pessoas. Ora, qualquer pessoa minimamente responsável tentaria explicar como 70.000 pessoas sofrem de tal mal subita e simultaneamente. Se tal explicação existisse, seria o modo mais fácil de se desacreditar a autenticidade do milagre. Mas, não, ele não se sente minimamente responsável por matar a curiosidade de seus leitores.

O que ele diz então é o seguinte: Não há milagres porque assim o diz Hume. As 70.000 pessoas que viram o sol dançar sobre suas cabeças, por não poderem estar presenciando um milagre, estavam em estado de alucinação coletiva, cujo modo de funcionamento não sinto vontade de explicar.

Nós católicos dizemos: nós não acreditamos em Dawkins; nós acreditamos no milagre de Fátima, porque assim nos atesta a Igreja e as 70.000 pessoas. Desta forma, as 70.000 pessoas viram o sol dançar sobre suas cabeças. Como ele fez isso, nós não o sabemos, pois os milagres sempre envolvem mistérios que nossa razão não alcança.

Aguardem um artigo de Chesterton sobre milagres.

15 comentários:

Gabriel Ferreira disse...

Caríssimo Angueth.

Realmente é de doer no coração de Cristo esse simulacro de argumento. Excelente post com a devida desconstrução.

Abraço.

Unknown disse...

Antonio,

Tu acha possivel o Papa fazer a consagração da Russia ao Imaculado Coração de Maria junto com todos os Bispos agora em maio quando SS estará em Fátima? Tenho rezado por esta consagração,mas não sei não,pois maio já está ai e juntar todos os Bispos seria trabalhoso e ser tudo preparado com alguma antecedência,e maio já está ai.

Que NS Jesus Cristo e Nossa Senhora de Fátima abençõe a ti e a todos.

Flavio

Antonio Emilio Angueth de Araujo disse...

Caro Flávio,
Salve Maria!

Tudo vai depender se os ataques ao Papa se intensificarem. Estou sabendo que há a intenção de uma grande concentração de padres, bispos e cardeais ao final do ano sacerdotal em apoio ao Papa. Isto acontecerá em junho, por conseguinte, após a visita em Fátima.

Note que a Consagração de a Santíssima Virgem pediu envolve o Papa e todos os bispos. Quem sabem em junho? Mas isso só acotecerá se o mundo e a Igreja se tornarem ainda mais inimigos um do outro. É assim que sempre foi e assim que deve ser.

Em JMJ.

Antônio Emílio Angueth de Araújo.

Unknown disse...

Antonio,

Tu sabe quantos são os Bispos da Igreja?

abraço e fique com Deus.

Flavio.

Unknown disse...

Olá, Sr. Angueth!

Esse post (Dawkins e o milagre de Fátima)calha extraordinariamente ao saneamento de uma dúvida que me perseguia já há algum tempo.

Há uns 2 anos, tomei conhecimento das aparições de Fátima e do Milagre da Dança do Sol (sim, senhor, eu nasci ontem, apesar de ter 35 anos).

Considerei esses acontecimentos um grande reforço à fé católica que eu tanto venho buscando (também nasci ontem neste aspecto). Ora, um acontecimento como a Dança do Sol, presenciado por 70.000 pessoas (boa parte delas atéias ou agnósticas que foram lá pretendendo apenas se rirem dos católicos, mas que saíram de lá chorando e convertidas, segundo li), nos expõe a algo que certamente transcende a realidade tal qual acostumamo-nos a reconhecê-la.

Mas o tentador estava sempre lá, soprando no fundinho do meu ouvido: "e você acredita que essas 70.000 existiram e presenciaram algo? Não acha que isso é invenção de grupos de interesses?" e inúmeras outras hipóteses conspiratórias.

Pelas mais variadas razões, não possuo os instrumentos (inclusive intelectuais) necessários a confirmar a mera existência do fato de que 70.000 previamente informados compareceram a determinado lugar para ver o sol dançar e... viram!

Ah, como eu gostaria de ter esta certeza.

E olha só! O maior detrator da fé católica de nosso tempo sana-me a dúvida e solidifica-me a fé! E como? Ora, para impugnar o milagre, ele não nega o fato de que 70.000 pessoas convidadas para ver o sol dançar, compareceram no local e data e viram.

Minha dúvida, assim, é espancada por uma fonte altamente confiável: aquele que, segundo seu comportamento público habitual, está empenhadíssimo em fortalecê-la!

E, além de fortalecer minha fé ele ainda me convence de ser, mesmo, um bobão ilustrado (como tantos o acusam de ser). Afinal, se 70.000 deliram o mesmo delírio simultaneamente e se isso ainda é inexplicado após quase um século (justo no século de maiores avanços da ciência, tecnologia e medicina!), tem-se de ser muito idiota para não perceber, aí, um milagre!

Viva, viva! Muito obrigado por esse texto!

Até logo!

Anônimo disse...

Sobre milagres ...

O senhor Dawkins tem razão: para Deus, milagres não existem. Isso é inquestionável.

O fato é que tudo aquilo que existe já estava no campo das possibilidades. Então, não conhecendo as leis supremas de Deus, para o homem tudo que é novo é milagre.

Para Deus, entretanto, não há milagres. Ele opera no campo de suas próprias leis, algumas das quais permite que os homens descubram. Outras Ele deixa fora do alcance humano enquanto achar conveniente.

Por outro lado, tudo é milagre. Só existem milagres. Como eu posso existir aqui e agora senão por um milagre de Deus?

O evolucionista diz que tudo veio do nada, numa grande explosão. Isso não é um milagre? Se tudo vem do nada, tudo já estava contido no nada. Que milagre!

Ao senhor Dawkins eu diria que a própria possibilidade de conhecer é um milagre. O senhor Dawkins é fruto um milagre!

Alucinação coletiva pode existir? Sim, pode. E isso faz parte do milagre. Já aconteceu de os homens ficarem loucos por tulipas holandezas.

Anônimo disse...

Sobre milagres ...

Prezado Luiz Ricardo,

Concordo com Dawkins que não existem milagres. Contudo, eles não existem sob a perspectiva de Deus, pois para os homens, só existem milagres.

A existência do homem é um milagre. Quem a explica, senão aceitamos que Deus o criou?

Porém, o cientista ateu diz: - Tudo é fruto de uma explosão do Nada. Mas, pode-se argumentar: - então Tudo já estava contito no nada. Que milagre!

Anônimo disse...

Seria mesmo uma boa idéia juntar todos os bispos e todos os padres do mundo num só lugar?

Há poucos dias ocorreu um acidente aéreo em que morreu toda a cúpula governante e religiosa de um país católico, pessoas estas que viajavam no mesmo avião.

Unknown disse...

Anônimo,

Foi Nossa Senhora em Fátima que pediu que o Papa,junto com todos os Bispos,consagrasse a Rússia ao seu Imaculado Coração.

Está tudo bem explicado no livro O Derradeiro Combate do Demônio,sugiro que leia.

Portanto não vejo porque se preocupar como essa reunião do Papa com todos os Bispos para a consagração,pois foi Nossa Senhora que pediu.

O que acho impressionante é não terem até hoje atendido o pedido de Nossa Senhora.

abraço e fiquem com Deus.

Aldrin Iglesias disse...

Olha, isso é um assunto delicado e eu não quero parecer desagradável, mas acho que houve umas injustiças aqui.

Perguntemos para começar: o que é filosofia e o que um filósofo faz?

Parece-me que para contradizer David Hume, deliberadamente foi ignorado que ele é um filósofo e que o que ele tem são opiniões expressas em livros com argumentos racionais.
A gente lê, reflete e podemos concordar ou não com ele. Hume apenas pede isso de seus leitores. Ele não faz uso da autoridade, por exemplo, para que sua visão de mundo seja aceita. O diálogo entre ele e seus leitores é proximo e em pé de igualdade. Existe modéstia por parte do autor.

Hume não precisa de "testemunhos" para suas idéias ou se acha o dono da verdade.
A não ser que você, Anguet, compartilhe da opinião de Olavo de Carvalho em "O Futuro da Pústula" (14 de agosto de 2006), e acredite que alguns filósofos modernos criavam teorias e que depois "as vendiam como realidade" para seus leitores.

Quanto a responsabilidade de Dawkins, ora, essa mesma responsabilidade é automaticamente transferida para todos que não acreditam no milagre? Temos todos que demonstrar como as 70 mil pessoas se enganaram?
As pessoas que dizem ter presenciado o milagre dizem: "Eu acredito"; mas só os que não acreditam são obrigados a dizer: "Eu não acredito e vou provar porquê você esta errado"?

Hawkins já assumiu uma grande responsabilidade por expressar uma opinião a respeito de um assunto tão sensível para milhares de pessoas, isso não tem valor?

Hume e Dawkins tem opiniões que podem ser julgadas desagradaveis e agressivas, mas ambos devem ser tratados com mais equilíbrio e modéstia.

Abraços

Antonio Emilio Angueth de Araujo disse...

Caro Jornal Tresler,

Você diz que Hume não precisa de testemunhos. Foi exatamente o que eu disse. O testemunho é ele mesmo.

Hume, na frase citada, não faz uso do argumento de autoridade, mas você está fazendo por ele.

Eu subscrevo totalmente a opinião do Olavo no artigo "O Futuro do Pústula", na última parte do mesmo. Acredito que alguns filósofos modernos fazem exatamente isso. Ou seja, são comerciantes de idéias e não filósofos. Aliás, mesmo não sendo filósofo, é exatamente o que Dawkins faz.

A responsabilidade de todos os que não acreditam em milagres, ao comentar sobre algum, dizendo que ele não ocorreu, é apresentar provas, ou então declarar sem mais rodeios, que aquilo é uma opinião sem nenhuma base lógica ou factual. Não acredito, porque não acredito. Esta é a mesma responsabilidade de quem não acredita na existência de Deus. Primeiro provar que Santo Tomás de Aquino está errado em suas cinco vias. Deus provar que Deus não existe. Se isso não ocorrer, temos de mostrar que o caro é um impostor.

É claro que numa mesa de boteco você pode falar o que quiser. Quando escreve numa mídia pública, usando o peso do nome, tem de ter responsabilidade de provar o que diz. Difamar o Vaticano, usando a mão de Hume, falar que 70000 pessoas surtaram simultâneamente e dizer que não se sente responsável em explicar porque isto ocorreu é, na melhor das hipóteses, impostura intelectual. As 70000 pessoas que viram, não precisam provar nada; elas viram. Fato não se prova, fato se descreve. Isso é filosofia!

Dawkins não assumiu responsabilidade alguma ao falar a besteira que falou, apenas difamou o Vaticano e os católicos.

Eu não costumo tratar difamadores baratos com equilíbrio e modéstia, sobretudo quando a agenda de Dawkins é por demais conhecida de todos.

Obrigado pelo comentário e pela visita.

Antônio Emílio Angueth de Araújo.

Paulo_r disse...

o "o milagre do sol" 13 de Outubro de 1917 . antes de todos os comentários deveria ser lido o que vem no jornal 'o século' , o artigo da época escrito por José Almeida Garrett ( professor).A meu ver algo de admirador acontecer em Fátima , não creio em alucinações colectivas e nem em milagres ou em passos de dança do sol.aconselho a todos a lerem o artigo de josé Almeida Garrett testemunha in loco do acontecimento. ( procurem no Google)

UM ABRAÇO

Antonio Emilio Angueth de Araujo disse...

Caro Paulo,

Não entendi muito bem seu comentário. De qualquer forma, a descrição do prof. Garret só corrobora o fato miraculoso. Para facilitar aos leitores, acessem http://www.fatima.org/port/essentials/facts/pmiracle.asp .

Antônio Emílio Angueth de Araújo.

Aldrin Iglesias disse...

Acho que existe uma diferença entre contar uma história e defender uma opinião, é por isso que acredito que um filósofo não precisa de “testemunhos”.

Desculpe se eu não deixei tão claro que nós podemos e devemos ter independência diante de um filósofo. Eu tenho diante de David Hume e tenho diante de Tomás de Aquino. Mas isso em nenhum momento os torna “impostores” diante de mim. Isso seria violento e arrogante de minha parte. Temos opiniões diferentes do que seja a Filosofia e sua relação com a Religião.

Eu não usei o argumento de autoridade para defender David Hume. Eu lembrei que Hume é um filósofo e que, portanto, escrever que uma opinião dele seria verdadeira porque assim ele quer é uma objeção infantil. Mas eu devia ter deixado isso mais claro também.

Hawkins não vende seus livros gratuitamente e não dá palestras também gratuitamente. Isso o torna um “comerciante de idéias”? Nada razoável isso.

Hawkins em seu artigo parece dizer que o Vaticano tinha a obrigação de demonstrar que o Milagre de Fátima realmente aconteceu. Responsabilidade que viria junto com os “lucros” por assim dizer, que o uso daquela história trouxe à Igreja Católica. Mas provar como? O Milagre de Fátima é objeto de fé, não acho que deve ser alvo da ciência.

Abraços

Antonio Emilio Angueth de Araujo disse...

Resposta ao Jornal Tresler: Filosofia e Impostura