30/09/2009

Sétimo Selo lança "As Cruzadas" de Raimundo Lúlio


Já disse aqui neste blog que as editoras Paulus e Vozes não são editoras católicas. Ou melhor, são tão católicas quanto a CNBB que, agora, apóia um abortista para o Supremo Tribunal Federal. Protegei, São José, Guarda providente da Divina Família, a raça eleita de Jesus Cristo!

Mas há editoras verdadeiramente católicas no Brasil. Uma delas é a Sétimo Selo, que está lançando As Cruzadas, de Raimundo Lúlio. A editora ainda mantém em catálogo livros extraordinários de Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino e Gilbert Keith Chesterton, além do recém lançado A Candeia Debaixo do Alqueire que já teve a primeira tiragem esgotada. Que Deus mantenha a pequena Sétimo Selo nos alimentando de obras essenciais de nossa Fé!

29/09/2009

Lições das missas dominicais pós-Vaticano II– Parte XXIII

Comento artigo do Pe. José Bortolini, n’O DOMINGO, de 30/08/2009. O Evangelho deste dia, na Missa de Paulo VI, é Mc 1, 1-8; 14-15; 21-23. Os fariseus perguntam a Jesus: “Por que os seus discípulos não seguem a tradição dos antigos, mas comem o pão sem lavar as mãos?” Daí Jesus diz a eles poucas e boas sobre o que é tradição verdadeira e o que não é.

Mas antes de comentar o que Jesus diz, vamos ver o que Pe. Bortolini nos ensina em seu artigo “O Peso da Tradição”. O título já nos alerta para o que vem depois. A tradição, para Pe. Bortolini é pesada, incômoda. Depois de uma introdução animadora, em que fala que a tradição “é em si uma coisa boa com bons objetivos”, ele vem logo com esta: “Mas nem sempre é assim, como no caso dos que são católicos por tradição e batizam seus filhos ‘porque sempre foi assim’. Tradição, traição.” Estas palavras vindas de um padre têm muito PESO. Vejam só que o católico que é católico por tradição é traidor. O católico que batiza seu filho por tradição é traidor. São palavras terríveis!

Mas o ataque que Pe. Bortolini prepara é mais amplo. Ele diz logo em seguida: “Entendida sob esse aspecto, a tradição se torna um peso e não favorece a vida. Mais ainda, quando se trata de tradição religiosa, ela engessa a religião, impedindo-a de caminhar à altura dos tempos e iluminar a história da humanidade.” Aqui entendemos bem o que ele fala. Pe. Bortolini é padre modernista, e todo padre modernista se sente moderno, em paz com o mundo, em paz com os protestantes, com os maçons, com os abortistas, com o comunismo, com Lula e, portanto, com o príncipe deste mundo. Isto é “caminhar à altura dos tempos”, justo o que Jesus não fez. Ele é contra a tradição religiosa católica, ou seja, ele é contra a Igreja de Sempre, aquela que Jesus fundou. Católico que respeita a tradição é traidor. Sim, somos traidores do mundo, somos traidores de Satanás, mas não de Jesus.

Se Pe. Bortolini só tivesse dito isto, vá lá, pois nós, depois de tantos comentários sobre seus textos em o’DOMINGO, esperamos quase tudo dele em termos de idéias heréticas. Mas ele fez mais. Ele tentou usar as palavras que Jesus dirigiu aos fariseus em favor dos modernistas e contra da tradição católica. Se isto não é farisaísmo, não sei o que é.

Diz o modernista Bortolini: “Os fariseus e alguns mestres da lei conservavam muitas coisas da tradição dos antepassados, defendiam-nas e condenavam os que não as observassem.” E, por isso, segundo Pe. Bortolini, Jesus condena os fariseus; por eles manterem tradições dos antepassados. Será que foi mesmo assim? A falsidade da afirmação do padre é facilmente demonstrada com uma frase apenas do Evangelho. Jesus não estava condenando a observância da tradição religiosa dos judeus. Ele diz: “Vós abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens.” Aí está! O mandamento de Deus é para ser seguido, é o que constitui a verdadeira tradição! Jesus condena os fariseus por seguirem a tradição dos homens, tradição falsa. Jesus desmascara Pe. Bortolini!

Mas o padre não se contenta com pouco. Ele diz em seguida: “Jesus declara boas todas as coisas.” De onde este pobre padre modernista tirou isto eu não sei. Jesus faz justo o contrário. Ele enumera as coisas más que saem do coração do homem e que constituem as verdadeiras impurezas, em contraposição às impurezas materiais que possam ser ingeridas pelo homem. Ou seja, Ele separa o joio do trigo, como sempre fez.

O destemido Bortolini ainda tem a coragem de terminar o artigo com a seguinte pergunta maldosa: “E nós, será que já nos libertamos de todas as tradições que impedem nossa vida e a dos outros?” Depois de tudo que ele nos disse ao longo do artigo, imagino que sua pergunta possa significar: E nós, já deixamos de batizar nossos filhos por tradição? Já deixamos de ser católicos por tradição? Já nos afiliamos ao PT, já nos tornamos membros da maçonaria, já estamos caminhando à altura dos tempos?

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26/09/2009

A lógica e o tênis

Nota: Eis aqui uma das muitas situações em que o grande Chesterton nos ensina ser católicos em qualquer discussão, por mais idiota que pareça. Aqui ele comenta o que um jogador de tênis disse sobre o tênis como praticado na Inglaterra e, neste comentário, ele defende toda a metafísica medieval, que é, antes de tudo, católica. Este texto é um capítulo do livro A Coisa.


Gilbert Keith Chesterton


Quando digo que duvidamos do aprimoramento intelectual produzido pelo protestantismo, pelo racionalismo e pelo mundo moderno, isso geralmente causa uma confusa controvérsia, que é um tipo de emaranhado semântico. Mas, em geral, a diferença entre nós e nossos críticos é esta: eles entendem que crescimento é um aumento do emaranhado; enquanto nós entendemos que pensamento é desemaranhar o emaranhado. Mesmo um pequeno pedaço de fio reto vale mais do que toda uma floresta de mero emaranhamento. Que haja mais assuntos sendo discutidos, ou mais termos sendo usados, ou mais pessoas usando-os, ou mais livros e autoridades citadas – tudo isso não é nada para nós se as pessoas usam impropriamente os termos, entendem mal os assuntos, invocam autoridades à esmo e sem o uso da razão; e finalmente conseguem um resultado falso. Um camponês que diz simplesmente, “Tenho cinco porcos; se mato um, fico com quatro porcos,” está pensando de uma maneira simples e elementar; mas está pensando tão clara e corretamente quando Aristóteles e Euclides. Agora, suponha que ele leia ou passe os olhos nos jornais e livros populares de ciência. Suponha que ele comece a chamar um porco de Terra e outro de Capital e um terceiro de Exportação, e finalmente chega a um resultado de que quanto mais porcos ele mata, mais ele possui; ou que cada porca que pare faz decrescer o número de porcos no mundo. Ele aprendeu a terminologia da economia como um meio de simplesmente se emaranhar com a falácia econômica. Ela é uma falácia em que ele nunca cairia se tivesse firmemente imbuído do dogma divino de que porcos são porcos. Para tal tipo de instrução e avanço, não temos nenhum uso; e é verdade, neste sentido somente, que preferimos um camponês ignorante a um pedante instruído. Mas isso não é porque consideramos a ignorância melhor do que a instrução ou o barbarismo melhor do que a cultura. É simplesmente porque consideramos que uma clara cadeia lógica de pequena extensão é melhor que uma interminável extensão do que é interminavelmente emaranhado. É simplesmente porque preferimos um homem que faça uma simples soma certa do que uma longa divisão errada.

O que observamos sobre toda a cultura atual do jornalismo e das discussões gerais é que as pessoas não sabem como começar a pensar. Não somente que seu pensamento é de terceira ou quarta mão, mas que ele começa já na terça parte do processo. Os homens não sabem de onde vêm seus pensamentos. Eles não sabem quais as conseqüências de suas palavras. Eles chegam ao final de toda controvérsia e não sabem de onde ela começou ou de que se trata. Eles estão sempre supondo certos absolutos, que, se corretamente definidos, chocariam até eles próprios como sendo não absolutos mas absurdos. Pensar é assim estar num emaranhado; continuar a pensar é se aprofundar mais e mais no emaranhado. E por trás de tudo há sempre algo entendido; que é realmente mal-entendido.

Por exemplo, leio um artigo do admirável Sr. Tilden, o grande tenista, que estava debatendo o que está errado com o tênis inglês. “Nada pode salvar o tênis inglês,” disse ele, exceto certas reformas de um tipo fundamental, que ele explica a seguir. O inglês, parece, tem uma maneira estranha e artificial de considerar o tênis como um jogo, ou uma coisa divertida. Ele admitia que isso é parte de um tipo de espírito amador em tudo que é (como ele observou verdadeiramente) também uma parte do caráter nacional. Mas tudo isso se coloca no caminho do que ele chama da salvação do tênis inglês. Por salvação ele entende o que outros chamariam de tornar o tênis perfeito e outros de torná-lo profissional. Tomo isso como uma passagem muito típica, tirada de jornais ao acaso, e que contém a visão de uma pessoa perspicaz e arguta sobre um assunto que ele compreende totalmente. Mas o que ele não compreende é a coisa que ele supõe entender. Ele conhece totalmente seu assunto e ainda assim não sabe do que está falando; porque ele não conhece suas suposições básicas. Ele não percebe a relação de meios e fins, ou axiomas e inferências, em sua própria filosofia. E ninguém estaria provavelmente mais surpreso e mesmo legitimamente mais indignado que ele, se eu dissesse que os primeiros princípios de sua filosofia parecem ser estes: (1) Há na natureza das coisas um certo Ser absoluto e divino; (2) Todos os homens existem para o bem e a glória desse Sr. Tênis e são obrigados a se aproximar de sua perfeição e obedecer sua vontade; (3) A esta elevada obrigação eles submetem seus desejos naturais de divertimento nesta vida; e (4) Eles são obrigados a colocar esta lealdade em primeiro lugar, e amá-lo mais apaixonadamente que a tradição patriótica, que a preservação de seu próprio estilo nacional, que suas virtudes nacionais. Este é o credo ou esquema da doutrina que é aqui desenvolvida sem ser definida. A única maneira que temos de salvar o tênis é impedi-lo de ser um jogo. A única maneira de salvar o tênis inglês é impedi-lo de ser inglês. Não ocorre a esses pensadores que algumas pessoas podem gostar do tênis porque ele é inglês e apreciá-lo porque ele é divertido. Há algum padrão abstrato e divino na coisa, para quem todos devem se levantar, sacrificando todo o prazer e afeição. Quando os cristãos dizem a mesmo coisa sobre os sacrifícios feitos para Cristo, soa como uma coisa inaceitável. Mas quando jogadores de tênis dizem isso em relação aos sacrifícios exigidos pelo tênis, soa muito natural e casual na confusão dos pensamentos e expressões da atualidade. E ninguém nota que um tipo de sacrifício humano está sendo oferecido a um tipo novo e anônimo de deus.
Nos velhos e bons tempos do racionalismo vitoriano, era convencional zombar de Santo Tomás de Aquino e os teólogos medievais; e especialmente repetir perpetuamente uma surrada piada sobre o homem que discutia quantos anjos poderiam dançar na ponta de uma agulha. Os confortáveis e comerciais vitorianos, com seu dinheiro e mercadorias, poderiam muito bem ter sentido uma ponta mais afiada da mesma agulha, mesmo que fosse seu outro lado. Teria sido bom para suas almas ter procurado pela agulha, não no palheiro da metafísica medieval, mas no elegante agulheiro de sua própria Bíblia de bolso. Teria lhes sido melhor meditar, não sobre como muitos anjos poderiam permanecer numa ponta de agulha, mas sobre como muitos camelos poderiam passar no buraco de uma. Mas há outro comentário sobre essa curiosa piada, que é mais relevante para nossos propósitos aqui. Se o místico medieval realmente discutiu sobre anjos permanecerem sobre uma agulha, pelo menos ele não discutiu como se o objetivo dos anjos fosse permanecer sobre uma agulha; como se Deus tivesse criados todos ao Anjos e Arcanjos, todos os Tronos, Virtudes, Potestades e Principados, somente a fim de que pudessem ser algo para vestir e decorar a inconveniente nudez da ponta de uma agulha. Mas essa é a maneira de raciocinar dos modernos racionalistas. O místico medieval não teria dito nem mesmo que uma agulha existe para ser suporte de anjos. O místico medieval teria dito, em primeiro lugar, que uma agulha existe para fazer roupas para os homens. Pois os místicos medievais, em sua maneira obscura e transcendental, estavam muito mais interessados nas razões reais das coisas e na distinção dos meios e dos fins. Eles desejavam conhecer a razão da existência de uma coisa, e como uma idéia dependia da outra. E eles poderiam até mesmo ter sugerido, o que tantos jornalistas parecem esquecer, a possibilidade paradoxal de que o tênis foi feito para o homem e não o homem para o tênis.

Os modernistas foram particularmente infelizes quando disseram que não se deve esperar que o mundo moderno tolere os antigos métodos silogísticos do escolástico. Eles estavam propondo que se desfizesse do único instrumento medieval que o mundo moderno exigirá mais urgentemente. Teria sido melhor ter dito que o renascimento da arquitetura gótica foi sentimental e fútil; que o movimento pré-rafaelano na arte foi somente um episódio excêntrico; que o uso da palavra “guilda” para todo tipo possível de instituição social foi artificial e fingido; que o feudalismo da jovem Inglaterra foi muito diferente do da antiga. Mas esse método elegante de dedução, com a definição de postulados e a real resposta da questão, é algo que a nossa sociedade midiática está em desesperada e urgente necessidade; como um envenenado está em necessidade do antídoto. Tomei aqui um único exemplo que atraiu meu olhar de centenas de milhares que acontecem a cada hora. E como o tênis, como qualquer outro jogo, tem de ser jogado tanto com a cabeça quanto com as mãos, penso que seja altamente desejável que ele seja discutido ocasionalmente pelo menos tão inteligentemente quanto ele é jogado.


Leiam, do livro "A Coisa": Por que sou católico, A Revolta contra as Idéias.

21/09/2009

Algumas sugestões apologéticas

Fiz, recentemente, uma palestra sobre as mentiras que são ditas sobre a Igreja Católica. Falei sobre as Cruzadas, a Inquisição, o cientificismo, e as pseudo-ciências – o freudismo e o darwinismo. Registro aqui algumas fontes de informações que usei, na esperança de que isso seja importante para mais alguém.

Sobre as Cruzadas usei um livro da Regine Pernoud (versão em inglês): The Crusaders – The Struggle for the Holy Land. Há também a obra extraordinária de Steve Runciman em três volumes: A História das Cruzadas.

Sobre a Inquisição há:
1. No site da Permanência: A História da Inquisição, A Inquisição Espanhola: Uma Questão Candente, O Processo Galileu.
2. No site da FSSPX dos EUA: Defense of the Inquisition. Este foi o melhor texto. Estou tentando contatar o autor, pois foi isto que a FSSPX americano me sugeriu, para solicitar a permissão para traduzir o texto para este blog. Estou tendo muitas dificuldades.
3. O livro “A Inquisição em seu Mundo”, do prof. João B Gonzaga, Editora Saraiva, 1993. Este livro está fora de catálogo e só é possível encontrá-lo em sebos.
4. Sobre o processo contra Galileu há o livro de Pietro Redondi, “Galileu Herético”, Companhia das Letras, 1991. Hoje está fora de catálogo.
5. Em 2006, traduzi para o MSM um interessante artigo de Gene Calahan sobre o caso Galileu, que foi recentemente publicado na Revista Mineira de Psiquiatria.

Sobre o cientificismo:
1. Há o grande Gustavo Corção. Um de seus textos sobre o assunto eu já postei aqui no blog.
2. Há um livro recente e muito bom de David Berlinsky: The Devil Delusion – Atheism and its Scientific Pretensions, cuja resenha, de George Gilder, já traduzi neste blog.
3. Há também um livro que sempre cito aqui no blog: Não tenho fé suficiente para ser ateu, de Geisler e Tuker, Editora Vida.

Sobre Darwinismo:
1. Há o livro de David Berslinsky citado acima.
2. Há o livro de Geisler e Tuker citado acima.

Sobre Psicanálise há o extraordinário livro de Rudolph Allers, “Freud: Estudo Crítico da Psicanálise”, Livraria Tavares Martins, Porto, 1970. Imagino que este livro seja encontrado somente em sebos. Agradeço ao prof. Carlos Nougué a sugestão de leitura deste livro em seu site Contraimpugnantes. Vale a pena ler o artigo do professor intitulado “Castidade e teoria psicanalítica”.

Há ainda, sobre esses assuntos, o site Montfort, do prof. Orlando Fedeli, onde se podem encontrar diversos textos, sobretudo respostas às cartas, que são muito elucidativos. Usem o mecanismo de busca do site que vocês encontrarão muita coisa boa.

SANTA CATARINA DE SENA

Do livro Tesouro de Exemplos.

Nasceu em Sena, cidade da Itália, em 1347, no dia em que a Igreja celebra o mistério da Encarnação.

Seu pai dedicava-se à indústria tintureira.

Catarina fora precedida, no lar paterno, por vinte e um irmãos. Contava apenas seis anos, quando Nosso Senhor a favoreceu com uma visão extraordinária e profética.

Sobre a torre do convento de S. Domingos viu num trono resplandecente, no qual estava sentado Jesus Cristo, revestido como um Papa, com a tiara na cabeça, e tendo a seu lado S. Pedro, S. Paulo e S. João. Jesus Cristo infundiu-lhe um conhecimento sobrenatural do que é a Igreja e um amor ardentíssimo à mesma, e anunciou-lhe que seria uma grande capitã de seus exércitos e que se valeria dela para purificar a sua Igreja.

Aos catorze anos, manifestou a seus pais o desejo de ingressar na Ordem Terceira de S. Domingos. Para provar sua vocação, empregaram-na nos trabalhos mais humildes. Foi a criada de todos. Portou-se com tamanha humildade que seus pais consentiram que seguisse a vocação religiosa.

Para que compreendesse ainda mais a Igreja, Jesus Cristo fê-la morrer, e sua alma, separada do corpo, percorreu o céu e o purgatório e mostrou-lhe mesmo o inferno, onde os separados para sempre da Igreja sofrem eternamente e logo a ressuscitou. Assim preparada, começou o seu apostolado. Não pregava dos púlpitos, porque isso compete aos sacerdotes; falava, porém, a enormes auditórios tanto nas praças como em pleno campo. Seguiam-na milhares de discípulos, entoando salmos de penitência; seguiam-na muitos sacerdotes, que confessavam os pecadores arrependidos. Aqueles eram para a Igreja dias difíceis. O Papa mudara-se para a cidade de Avinhão, na França, e esta troca de residência do bispo de Roma escandalizava e dividia os católicos.

Obedecendo a Jesus Cristo, S. Catarina apresentou-se ao Papa, que era Gregório XI, e intimou-o a voltar para Roma. O Pontífice pediu-lhe uma prova de que o Espírito Santo a inspirava e ela respondeu: "Tu mesmo o prometeste, com voto, no dia de tua elevação ao Pontificado". O Papa, ao ver descoberto esse segredo, que a ninguém da terra havia confiado, não vacilou mais e transferiu-se para Roma.

S. Catarina pediu a Deus que aceitasse a sua vida pela salvação do sucessor de Gregório XI, Urbano VI, a quem os demônios queriam assassinar, induzindo os romanos à sublevação. Aceitou Jesus a sua oferta, sendo a sua última enfermidade um verdadeiro martírio. Seu corpo parecia um esqueleto.

A 29 de abril de 1380, aos trinta e três anos de idade (isto é, na mesma idade em que morreu Jesus Cristo, segundo se crê) seu rosto iluminou-se e sua alma voou para o céu.

Festa: 30 de abril.

Ler também: Santa Catarina de Gênova, Mais uma historinha do Tesouro de Exemplos, Tesouros de Exemplos – mais três historinhas, Mais duas historinhas católicas: Ah! se a Vozes ainda fosse uma editora católica!,Quando a Vozes ainda era uma editora católica

18/09/2009

SANTA CATARINA DE GÊNOVA

Do livro Tesouro de Exemplos.

Esta Santa, falecida em 1510, não foi santa desde seus primeiros anos de vida.

Nasceu rica, viveu entre as diversões e nos dias de sua mocidade não foi lá muito piedosa, não. Era como tantas moças de hoje, que pensam ser muito santas, só porque vão à missa de preceito e não dão graves escândalos.

Casou-se, afinal, com um moço muito rico, o qual de cristão tinha apenas o nome. Isso bem o sabia ela antes de casar-se; mas, como acontece, deixou-se fascinar pelas riquezas, pela elegância e até pelas audácias daquele aventureiro do amor.

E sucedeu o que era de esperar: aquele homem, por causa de sua vida licenciosa, não pôde fazê-la feliz. Enquanto ela, em casa, chorava a sua desgraça, ele, como louco, corria de orgia em orgia. Esquecida de Deus, a pobre mulher maldizia a hora em que se casara com um vilão como aquele.

Menos mal. Morreu o canalha (e dizem que morreu convertido), e a jovem viúva pôde respirar. Buscou ainda a felicidade nas diversões, reuniões barulhentas e nos espetáculos. Tinha uma fome canina de felicidade, e cada dia se sentia mais desgraçada.

Certo dia ouviu uma voz interior que lhe dizia:
- Catarina, só em Deus acharás o verdadeiro amor e a felicidade.

A jovem viúva ficou muito comovida. Parecia-lhe, porém, impossível que a felicidade estivesse escondida atrás das grades de um convento e debaixo de um grosseiro hábito religioso. Não entrava em sua cabeça que o amor pudesse viver no silêncio do claustro e entre cilícios e disciplinas.

Catarina tinha uma irmã, que, mais piedosa do que ela, se fizera religiosa e vivia contentíssima no convento. Quantas vezes esta santa religiosa, prostrada aos pés do sacrário, havia pedido a Jesus por aquela irmãzinha sua, que andava pelo mundo, tão fútil, tão infeliz!

Deus atendeu a sua oração. Um dia Catarina foi visitá-la. Estava triste como nunca a pobre viúva. E ali, no regaço de sua santa irmã, deixou correr lágrimas muito amargas. Disse-lhe: Sou uma desgraçada; o mundo é um impostor; o amor não é mais que egoísmo brutal; não, não agüento mais! quero morrer.

A santa irmã deixou que ela se desabafasse e, enxugando as lágrimas, disse-lhe:
- Catarina, parece mentira que andes tão louca e enganada. Já não te disse mil vezes que só Deus é a verdadeira felicidade e que só nele encontrarás o amor puro que não deixa na alma remorsos e desengano?. Deus te chama ao seu amor e tu te empenhas em fazer-te surda às suas vozes amorosas. Resolve-te de uma vez a consagrar-te a Deus e encontrarás a paz e o amor. Faze uma boa confissão e confia na divina misericórdia. Estou certa de que Nosso Senhor te fará feliz.

A dor e os desenganos, e mais que tudo a mesma graça de Deus haviam preparado já o coração de Catarina. Caiu de joelhos diante da imagem de Jesus crucificado e chorou amargamente, dizendo: Meu Jesus, não mais pecar, não mais pecar. Jesus, Amor infinito das almas, toma o meu coração. É teu.

E assim, banhada em lágrimas, ajoelhou-se aos pés de um santo confessor. Ali esteve longo tempo. Quando se levantou, já era outra.

Ajoelhara-se pecadora, levantara-se santa, porque esse foi o dia de sua definitiva conversão. Dai em diante, viveu e morreu como santa.

Festa: 22 de março.

Ler também: Mais uma historinha do Tesouro de Exemplos, Tesouros de Exemplos – mais três historinhas, Mais duas historinhas católicas: Ah! se a Vozes ainda fosse uma editora católica!,
Quando a Vozes ainda era uma editora católica

12/09/2009

Mais uma historinha do Tesouro de Exemplos

Este é o exemplo de sacerdócio que o Papa Bento XVI quer dar aos padres do mundo inteiro. Este é, segundo Bento XVI, o ideal que todo padre deve almejar em sua vida. Penitência, oração, instrução, sacramento e ... santidade.


São João Maria Vianney


Nasceu de família humilde numa pequena aldeia da França, em 1785. Aos oito anos guardava um pequeno rebanho e, levando consigo uma imagenzinha de Nossa-Senhora reunia os companheiros da sua idade e diante da imagem rezavam o rosário. Outras vezes, confiava à sua irmãzinha a guarda das ovelhas e procurava um lugar solitário para rezar.

Aos treze anos deixou o rebanho e começou a trabalhar na roça.

"Quando estava na roça - conta ele mesmo - rezava em voz alta, se não havia ninguém perto; e em voz baixa, quando havia ali algum companheiro. Ao manejar a enxada, costumava dizer: É preciso arrancar da alma as más ervas. Quando, depois de comer, os outros dormiam a sesta, eu aparentava dormir, mas continuava conversando com Deus em meu coração. Quando ouvia o relógio, dizia: Coragem, minha alma; o tempo passa; a eternidade chega; vivamos como condenados a morrer. E rezava uma Ave-Maria".

Estudou para padre. Muito lhe custou passar nos exames; mas, à força de trabalho, penitência e oração, conseguiu chegar a bom termo. Seus superiores mostraram-se benévolos com ele, porque reconheciam sua virtude e seu zelo.

Foi destinado a reger a pequenina paróquia de Ars. Os moradores de Ars eram indiferentes; não iam à igreja. João Maria recorreu a suas armas favoritas: passava horas inteiras, em oração, diante do sacrário; mortificava-se, disciplinava-se e tudo oferecia a Deus para que tocasse os corações de seus paroquianos. Ao mesmo tempo, esmerava-se em tratá-los com amor e prodigalizar-lhes conselhos e esmolas.

Pouco a pouco fez-se o milagre, e Ars começou a ser uma paróquia exemplar. A fama da santidade do cura de Ars transpôs fronteiras não só daquela aldeia, mas até da França. Milhares e milhares de pessoas chegavam de toda a parte para confessar-se com o Santo, ouvir os seus sermões, solicitar seus milagres. Em 1840, contaram-se mais de 20.000 peregrinos, e esse número continuou aumentando.

Levantava-se, invariavelmente, à meia-noite para dirigir-se à igreja e sentar-se no confessionário. Os penitentes sucediam-se sem interrupção até as sete, hora em que o vigário celebrava. Terminada a missa, outra vez confissão até as onze. Subia, então, ao púlpito e fazia a sua instrução catequética. Saía da igreja ao meio-dia. Dois guardas precisavam defendê-lo dos empurrões do povo, pois todos queriam vê-lo, falar-lhe, tocá-lo, receber sua bênção, guardar alguma palavra sua. Às 13 horas, novamente confessar até à reza da noite.

Perguntaram-lhe uma vez:
- Se Deus vos permitisse escolher entre estas duas coisas: ir para o céu, agora mesmo, ou ficar na terra, até o fim do mundo, trabalhando na conversão dos pecadores, que faríeis?
- Ficaria na terra.
- Até o fim do mundo?
- Sim, até o fim do mundo.
- Mas, com tanto tempo ainda, não vos levantaríeis tão de madrugada... não é?
- Ah! meu amigo; levantar-me-ia como agora, à meia noite, e seria o mais feliz dos servidores de Deus.

Gozava do dom da profecia e de penetrar no mais secreto das vidas e das consciências. Gente não disposta a confessar-se, resolvida a fazê-lo mal, ficava surpreendida quando o Santo recordava pecados ocultos, e saía chorando do confessionário. Dissipava as dúvidas com muita facilidade.

Fez grandes e inúmeros milagres tanto em vida como depois de sua morte, cuja data ele mesmo anunciou com exatidão. A 9 de agosto de 1859, aos setenta e três anos de idade, sua alma voou para o céu, onde goza e gozará do prêmio eterno de seus trabalhos e penitências.

Festa: 9 de agosto.

Ver Quando a Vozes ainda era uma editora católica

08/09/2009

Palavras duras de Bento XVI para a CNBB

O Santo Padre, dirigindo-se a bispos brasileiros (regionais oeste 1 e 2 da CNBB), usa de palavras duras para descrever a situação da Igreja no Brasil e, para mais uma vez, fazer uma crítica ao Concílio Vaticano II. Ele diz que depois do Concílio Vaticano II, “insensivelmente caiu-se na auto-secularização de muitas comunidades eclesiais”. Recentemente escrevi aqui sobre as famigeradas CEB’s (Comunidades Eclesiais de Base) e de um tal Encontro Intereclesial. Disse que estas CEB’s são um antro de comunismo dentro da Igreja. O Santo Padre, muito mais cuidadoso, disse que dentro de muitas comunidades eclesiais (que dirá das “de base”?) “caiu-se na auto-secularização”.

O Santo Padre diz mais. Diz que alguém que procure a Igreja, quer encontrar Jesus ressuscitado dentro de nossos corações compassivos. O que ele não disse, por ser sempre cauteloso, é que quem procura a Igreja não quer encontrar Marx redivivo em nossa língua afiada.

Disse ainda que “jovens sedentos de transcendência” batem às portas dos seminários e que a Igreja deve recebê-los “segundo o modelo do Cristo Bom Pastor”. O que ele não disse, por ser sempre cauteloso, é que é no seminário que acontece exatamente a auto-secularização da Igreja. O que ele não disse é que é aí que os jovens sedentos de transcendência aprendem a ser marxistas da mais baixa qualidade. O que ele não disse é que é nos seminários que se estuda Kant, Hegel, Marx, Wittgenstein etc., mas não se estuda Santo Tomás de Aquino, por exemplo.

Ou seja, neste discurso o que o Santo Padre diz é tão significativo quanto o que ele, sendo papa, não pode dizer tão claramente. Seguem as parte mais significativas do discurso. Os negritos são meus.

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(...) Prezados Irmãos, nos decênios sucessivos ao Concílio Vaticano II, alguns interpretaram a abertura ao mundo, não como uma exigência do ardor missionário do Coração de Cristo, mas como uma passagem à secularização, vislumbrando nesta alguns valores de grande densidade cristã como igualdade, liberdade, solidariedade, mostrando-se disponíveis a fazer concessões e descobrir campos de cooperação. Assistiu-se assim a intervenções de alguns responsáveis eclesiais em debates éticos, correspondendo às expectativas da opinião pública, mas deixou-se de falar de certas verdades fundamentais da fé, como do pecado, da graça, da vida teologal e dos novíssimos. Insensivelmente caiu-se na auto-secularização de muitas comunidades eclesiais; estas, esperando agradar aos que não vinham, viram partir, defraudados e desiludidos, muitos daqueles que tinham: os nossos contemporâneos, quando vêm ter conosco, querem ver aquilo que não vêem em parte alguma, ou seja, a alegria e a esperança que brotam do fato de estarmos com o Senhor ressuscitado.

Atualmente há uma nova geração já nascida neste ambiente eclesial secularizado que, em vez de registrar abertura e consensos, vê na sociedade o fosso das diferenças e contraposições ao Magistério da Igreja, sobretudo em campo ético, alargar-se cada vez mais. Neste deserto de Deus, a nova geração sente uma grande sede de transcendência.

São os jovens desta nova geração que batem hoje à porta do Seminário e que necessitam encontrar formadores que sejam verdadeiros homens de Deus, sacerdotes totalmente dedicados à formação, que testemunhem o dom de si à Igreja, através do celibato e da vida austera, segundo o modelo do Cristo Bom Pastor. Assim esses jovens aprenderão a ser sensíveis ao encontro com o Senhor, na participação diária da Eucaristia, amando o silêncio e a oração, procurando, em primeiro lugar, a glória de Deus e a salvação das almas. Amados Irmãos, como sabeis, é tarefa do Bispo estabelecer os critérios essenciais para a formação dos seminaristas e dos presbíteros na fidelidade às normas universais da Igreja: neste espírito devem ser desenvolvidas as reflexões sobre este tema, objeto da assembléia plenária da vossa Conferência Episcopal, em abril passado.

Certo de poder contar com o vosso zelo no tocante à formação sacerdotal, convido todos Bispos, seus sacerdotes e seminaristas a reproduzirem na vida a caridade de Cristo Sacerdote e Bom Pastor, como fez o Santo Cura d’Ars. E, como ele, tomem por modelo e proteção da própria vocação a Virgem Mãe, que correspondeu de um modo único ao chamado de Deus, concebendo no seu coração e na sua carne o Verbo feito homem para doá-lo à humanidade. Às vossas dioceses, com uma cordial saudação e a certeza da minha oração, levai uma paterna Bênção Apostólica.

05/09/2009

A Revolta contra as Idéias

Nota do Tradutor: Este é um capítulo do livro The Thing (A Coisa), publicado em 1929. Aqui vemos Chesterton expressar algumas de suas idéias sobre o capitalismo, sobre a Reforma e fazer uma defesa dos valores medievais. A propósito, a "coisa" do título é exatamente a Igreja Católica e perpassa, sem menção direta, todos os capítulos do livro. Espero um dia poder traduzir este livro.


Gilbert Keith Chesterton


Ao mesmo tempo em que o Daily Express fornece-nos terríveis informações sobre o México, a seção de cartas do Daily Express fornece-nos informações quase igualmente tão terríveis sobre a Inglaterra. Isso dá-nos uma idéia do quão monstruosas e disformes são as coisas que ainda existem em nosso meio, veladas pelas vilas de tijolos vermelhos e por chapéus de feltro. As horrorosas revelações sobre a Inglaterra foram, claro, principalmente psicológicas. Não foi a anarquia do estado que fez fracassar a luta dos povos latinos. Foi a anarquia da mente, que é um caráter especial daqueles a quem chamamos, nos momentos de raiva, de anglo-saxões. Um ateu mexicano seria muito capaz de cortar a garganta de um padre ou praticar tiro de canhão em uma freira. Mas ele seria incapaz de afirmar, como fizeram os protestantes no jornal, que era certo para Calles[1] perseguir aquela crença naquela ocasião, porque era errado para os católicos perseguirem qualquer crença em qualquer ocasião. Nenhum anarquista consegue ser tão anárquico. Calles poderia ter explodido a catedral de São Pedro, mas ele não culparia um espanhol por ter feito o que um mexicano, louvado por ele, estava tentando fazer. A esse respeito, mesmo Calles é mais católico e mais latino. Ele quer fazer as coisas à sua própria maneira, e impedir milhares de pessoas de fazer as coisas à maneira deles; mas ele não quer ambas as coisas. Este sacramento selvagem, o milagre do desaparecimento e reaparecimento do bolo, do bolo que é sempre devorado e sempre permanece – este milagre pertence à religião da irracionalidade e somente acontece nas capelas de nosso próprio e livre país.

Em meio à confusão de tais palavras, houve uma frase numa das cartas que é de algum interesse sociológico para nós. Um desses intolerantes “tolerantistas” estava tentando defender Calles por meio da sugestão de que somente um preconceituoso pode acusá-lo de extremismo anárquico e anti-religioso. É muito injusto (foi dito) chamar Calles de ateu ou bolchevique. De fato, podemos aprender de todas essas cartas que Calles é provavelmente um metodista wesleyano e freqüenta regularmente a capela de East Croydon. Mas ele é ainda pior. Eles parecem considerar que é um favor a Calles fazê-lo o extraordinário elogio de comparando-o aos reformadores do século XVI. O correspondente aqui em foco usa isso com um argumento contra o alegado anarquismo do mexicano – caso ele seja mexicano. “Calles e seus partidário são estigmatizados como ateus e bolcheviques – Por quê? Foram os reformadores ingleses bolcheviques? Certamente não.”

Com isso concordamos alegremente. Com uma sincera unanimidade podemos repetir, “Certamente não.” Os reformadores ingleses certamente não foram bolcheviques. Ninguém concordará com a elegante afirmação de que os reformadores ingleses foram capitalistas. Poucas pessoas na histórias mereceram ser descritos tão exatamente, tão completamente, como tipicamente capitalistas. Eles foram muitas outras coisas além de capitalistas; alguns deles eram mal-educados, alguns cavalheiros, alguns poucos eram homens honestos, muitos eram ladrões, um tipo mais ordinário de cortesões, um tipo melhor de monomaníacos; mas eles eram todos capitalistas e o que eles criaram foi o capitalismo. Todos eles conduziram suas poderosas operações políticas baseados numa enorme acumulação de capital; mas eles nunca, mesmo com seus olhos moribundos, perderam a luz de esperança e expectativa; a promessa e a visão de mais capital.

Mas o que nos preocupa hoje em dia é isto: é o capitalismo deles que permaneceu. De fato, muitos deles tinham outros ideais de simplificação espiritual que poderiam, em certo sentido, ser comparados ao comunismo. Nunca devemos chamar de bolchevique um homem como Cranmer ou um homem como Burleigh. Poderíamos dizer, com Hamlet, “Pois quiséramos que fôsseis tão honesto”. Mas havia homens naquele movimento, ou naquela confusão, que eram tão loucos e honestos quanto os bolcheviques. Havia entusiasmos teóricos e especialmente teológicos que moviam particularmente em direção à simplicidade; como aqueles dos bolcheviques. Mas uma coisa deve ser fixada: aquelas teorias estão mortas. Havia um esquema lógico e imponente de pensamento; mas foi isso que foi completamente abandonado pelo pensamento moderno. Havia ideais sinceros em alguns dos primeiros protestantes; mas eles não são os ideais dos protestantes modernos. Assim, o calvinismo foi uma definida filosofia; o que é suficiente para distingui-lo do pensamento moderno. Mesmo que os protestantes modernos retenham elementos do calvinismo, o calvinismo está morto. Se eles retivessem elementos de comunismo, como alguns deles poderiam tê-lo feito, aquele comunismo estaria agora morto. Nada além de seu capitalismo está vivo.

Devemos lembrar que mesmo falar sobre a corrupção dos monastérios é um elogio aos monastérios. Pois não falamos da corrupção dos corruptos. Ninguém pretende afirmar que as instituições medievais começaram com mera avareza e soberba. Mas as modernas instituições assim o fizeram. Ninguém diz que São Bento escreveu suas regras de trabalho a fim de fazer seus monges preguiçosos; mas somente que eles se tornaram preguiçosos. Ninguém diz que os primeiros franciscanos praticavam a pobreza para obter riqueza; mas somente que as fraternidades posteriores obtiveram riquezas. Mas é completamente claro que os Cecils, os Russels etc. quiseram de início ficar ricos. Que o que foi a morte para o catolicismo foi realmente o nascimento do capitalismo. Desde então, temos tido não a inconsistência de um homem que, fazendo voto de pobreza, ficasse rico; mas uma consistência assaz chocante, de um homem que, fazendo um voto de riqueza, ficasse mais rico ainda. Depois disso, não houve mais fim a corrida da ambição; e a crença coisas cada vez maiores. É certamente verdade que os reformadores não foram comunistas. Pode ser argumentado competentemente que os religiosos eram comunistas. Mas a questão mais vital não é o comunismo, mas um certo espírito comparativo. O grande proprietário de terras aumento e o pequeno proprietário diminuiu. Ambos eram orgulhosos em possuir terras. Mas o orgulho se tornou cada vez maior na posse de grandes propriedades, e não na posse da propriedade. Assim, por seu lado, o merceeiro parou de se preocupar com seu próprio negócio e somente conseguia se orgulhar do número de negócios com que se preocupar. Disso veio toda a megalomania mercantil de hoje; com sua transformação universal do pequeno negócio em grandes corporações. Esta foi a conclusão natural do movimento, na direção oposta à transformação de todos os pequenos negócios em guildas. Mas sua gênese foi a mudança de um ideal de humildade, em que muitos fracassavam, para um ideal de orgulho, em que, por sua própria natureza, somente alguns conseguem o sucesso.

Nesse sentido, podemos concordar com o correspondente do jornal; que os reformadores não foram revolucionários. Podemos tranqüilizar aquele simples cavalheiro com a nossa total percepção de que eles não foram bolcheviques. Podemos absolver integralmente os Cranmers e os Cromwells de qualquer desejo incansável de sublevar o proletariado. Podemos absolver os grandes nomes de Burleigh e Bacon da mancha de qualquer perigosa simpatia com o pobre. A marca distintiva dos reformadores foi um profundo respeito pelos poderosos, mas um respeito ainda mais profundo pela riqueza; e uma reverência realmente incomensurável pela própria riqueza. Algumas pessoas gostam desse espírito, e consideram-no como a mais razoável fundação de um governo estável; não precisamos discutir sobre isso aqui. Esse espírito é, geralmente, o que é considerado respeitabilidade por todos os que não têm nada mais para respeitar. Ninguém poderia certamente confundi-lo com revolução. Mas a questão de importância histórica poderia ser colocada de outra forma, também mais ou menos favorável aos reformadores. O capitalismo não era apenas sólido, era em certo sentido, cândido. Ele estabeleceu uma classe a ser adorada aberta e francamente por sua riqueza. Este é o contraste real entre esta e a ordem medieval. Tal riqueza veio do abuso dos monges e abades; veio da ação de comerciantes e grandes proprietários. Os abades avarentos violaram seus ideais. Os empregadores avarentos não tinham ideais para violar. Pois nunca houve, propriamente falando, um ideal capitalista do bem; apesar de haver um grande número de homens bons que são capitalistas seguindo outros ideais. A Reforma, especialmente na Inglaterra, foi acima de tudo o abandono da tentativa de governar o mundo por meio de ideais, ou mesmo por meio de idéias. A tentativa falhara indubitavelmente, em parte, porque aqueles que eram os supostos idealistas fracassaram em sustentar os ideais; e muitos dos supostos aceitadores da idéia geral frustraram a realização das idéias. Mas aquela tentativa sofreu o ataque daqueles que odiavam, não somente aqueles ideais, mas qualquer ideal. Foi o resultado dos apetites impacientes e imperiosos da humanidade, que odeiam ser limitados por laços; mas, acima de tudo, por laços invisíveis. Pois os reformadores ingleses não estabeleceram um ideal oposto ou um conjunto alternativo de ideais. Como nosso amigo disse verdadeiramente, eles não eram bolcheviques. Eles estabeleceram certas coisas muito formidáveis chamadas fatos. Eles estabeleceram quase abertamente que iam governar o reino meramente por meio de fatos; pelo fato de alguém chamado Russel ter tido duzentas vezes mais dinheiro que seus vizinhos; pelo fato de que alguém chamado Cecil ter obtido o poder de mandar qualquer vizinho para a forca. Os fatos são sólidos, pelo menos enquanto duram; mas a coisa fatal sobre eles é que eles não duram. Somente as idéias duram. E hoje um homem pode chamar-se Russel e ter consideravelmente menos dinheiro que um homem que chama-se Rockefeller; e a história pode assistir o espetáculo impressionante de um homem chamado Cecil ser expulso da política e chamado de idealista e um fracassado.

O mesmo progresso que fez os grandes proprietários os destruiu. O mesmo avanço comercial que exaltou a Inglaterra perante a Europa a humilhou perante a América. Na exata medida em que temos nossas afeições saudavelmente ligadas a esta aventurosa e patriótica Inglaterra dos últimos poucos séculos, devemos perceber que nossas afeições estão fadadas a ser traídas. O processo chamado prático, a tentativa de governar por meio de meros fatos, tem em sua própria natureza a essência de todas as traições. Descobrimos que os fatos, que parecem sólidos, são, de todas as coisas, as mais fluidas. Como os professores e os arrogantes dizer, os fatos estão sempre evoluindo; em outras palavras, eles estão sempre evadindo-se, escapando ou fugindo. Homens que se prostram ante a riqueza de um grande proprietário, porque isso permite-lhe comportar-se com um cavalheiro, têm de se prostrar ante a mesma riqueza de alguém que não consegue comportar-se como um cavalheiro; e, eventualmente talvez, ante a mesma riqueza que não esteja ligada a nenhum ser humano reconhecível, mas investida em uma companhia irresponsável num país estrangeiro. A riqueza cria, de fato, asas para si mesmo, e pode até habitar as mais longínquas partes do oceano. A riqueza torna-se disforme e quase fabulosa; de fato, são satíricos inconscientes que falam de “fabulosa riqueza”. Grandes financistas compram e vendem milhares de coisas que ninguém jamais viu; e que são, para todos os propósitos práticos, imaginárias. Assim termina a aventura de se acreditar apenas em fatos; termina num conto de fadas de fantásticas abstrações.

Devemos retornar à idéia de governo por meio de idéias. Há apenas um grão de verdade na já mencionada fantasia do comunismo. Mas há idéias muito mais ricas, mais sutis e mais bem equilibradas no catolicismo medieval. Repito que este catolicismo foi arruinado tanto por católicos quanto por protestantes. Os pecados medievais impediram e corromperam as idéias medievais, antes de os reformadores decidirem abandonar todas as idéias. Mas seguir aquelas idéias foi a coisa certa a fazer, ou tentar fazer; e não há e nunca haverá nada mais a fazer exceto tentar de novo. Muitos homens medievais fracassaram na tentativa de pôr em prática aqueles ideais. Mas muitos homens modernos estão fracassando ainda mais desastrosamente na tentativa de viver sem eles. E através deste fracasso estamos gradualmente entendendo as reais vantagens daquele esquema antigo que apenas parcialmente fracassou; segundo o qual, em teoria pelo menos, o homem da paz era mais elevado que o homem da guerra, e a pobreza, superior à riqueza.

Há uma curiosa e pequena frase no ensaio de Macaulay sobre Bacon; aquela grande explosão dos filisteus contra os filósofos. Numa pequena sentença, o grande filisteu trai a fraqueza de todo seu argumento de utilitarismo. Falando desdenhosamente do escolástico, ele diz que Santo Tomás de Aquino deveria sem dúvida (tal era sua simplicidade) ter pensado ser mais importante fabricar silogismos do que pólvora. Nem mesmo a Conspiração da Pólvora[2] poderia impedir aquele protestante resistente de supor que a pólvora é sempre útil. Desde seu tempo temos visto muito mais pólvora. Não é necessário ser um pacifista para considerar que a pólvora não necessita continuar a ser útil em tão larga escala. E uma grande parte do mundo atingiu agora um estado de reação no qual está disposto a clamar, “Se houver qualquer silogismo que nos salve de toda essa pólvora, pelo amor de Deus, permita-nos ouvi-lo.” Eles estão preparados, em desespero, a aceitar até a lógica. Eles não ouvirão apenas a religião, eles talvez ouçam até a razão, se ela prometer-lhes um pouco de paz.

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[1] Plutarco Elias Calles, ditador mexicano, anti-católico e maçom, em cujo governo aconteceu a Guerra dos Cristeros (1926-29), que acabou num massacre de católicos mexicanos. (N. do T.)
[2] Conspiração da Pólvora foi organizada por católicos para explodir o Parlamento quando o rei James I, em 5 de novembro de 1605 o estivesse presidindo. (N. do T.)