Pe. João Batista Lehmann
Na Luz Perpétua
Figura
singularíssima entre os Santos é Joana d’Arc, a humilde camponesa de Domremy,
que, chamada por Deus, libertou sua terra, a França, do jugo dos estrangeiros,
para, como mártir dessa missão, terminar a vida numa fogueira.
Filha
de pobres camponeses de Domremy, na Lorena, nasceu Joana em janeiro de 1412.
Longe dos grandes centros de civilização e da política, recebeu Joana a
educação que os bons e piedosos camponeses tem por costume dar aos filhos, e
assim a menina cresceu em simplicidade, piedade e temor de Deus, em nada se
distinguindo das companheiras, a não ser por uma piedade mais acentuada e
acendrada, como também por uma compaixão extraordinária para com os pobres.
Entrando na idade de 13 anos, começou para Joana uma nova época da vida. Por diversasa
vezes a menina ouviu vozes celestiais e apareceram-lhe o Arcanjo S. Miguel e
outros Anjos, que a prepararam para a grande e extraordinária missão, para a
qual Deus a tinha destinado.
Tristíssima
ou antes, desesperada era a situação da França, cujo governo estava nas mãos de
Carlos VII. O norte dos ingleses, tendo ficado Carlos VII senhor apenas dos
Estados ao sul do Loire. Com o sítio de Orléans, os ingleses ameaçavam
apoderar-se também do resto da França. O chamado de Joana coincide com este
período humilhante da monarquia francesa. O que as vozes angélicas exigiam da
jovem, não era nada menos que salvar a França, libertar Orléans e conduzir o
rei a Reims, para ser solenemente coroado. Tarefa aparentemente impossível para
uma pobre e fraca donzela, além de tudo inexperiente e tímida! Mas as vozes
tornaram-se cada vez mais insistentes e exigiram de Joana o mais pronto
cumprimento da vontade de Deus. Visões que teve também de Santa Catarina e
Santa Margarida, animaram-na a não se opor aos planos divinos.
Enormes,
quase insuperáveis dificuldades se levantaram diante de Joana quando esta
revelou sua resolução à família. Dificuldades de outra espécie surgiram, quando
Joana, em nome de Deus, exigiu ser em audiência recebida pelo rei. Este só se
convenceu da missão sobrenatural da donzela, quando esta lhe revelou um
segredo, só por ele e por Deus conhecido. Ainda assim o monarca providenciou
para que se fizesse a mais severa observação, mas todos: homens e mulheres,
foram unânimes em declarar e depor que em Joana não havia nada de exagero ou
fraude. Joana designou um altar da Igreja de Santa Catarina de Fierbois,
debaixo do qual acharia uma espada, de que se deveria servir, na campanha
contra os ingleses. A espada doi de fato encontrada. Profecias por ela enunciadas
cumpriram-se ao pé da letra, principalmente a que lhe predizia os ferimentos
que receberia no assédio de Orléans. Os ingleses foram rechaçados, Orléans foi
libertada e Joana levou o rei em triunfo a Reims, onde se realizou a coroação
do monarca. Desde o princípio de sua atividade, tinha Joana declarado
positivamente que, realizada a coroação do rei em Reims, consideraria terminada
sua missão. Desejava voltar para o seio da família. O rei, porém, no posto de
comandar as tropas. Se Joana tinha preparado para o rei a solene coroação,
outra coroa a ela esperava, a do martírio. Na batalha de Compiège caiu nas mãos
dos ingleses, que a encarceraram no forte de Beaurevoir, perto de Cambrai.
Infeliz numa tentativa de fuga, foi encontrada desacordada e novamente levada à
prisão. Instalou-se então o processo contra a heroína. Rodeada só de inimigos,
abandonada pelo próprio rei, que tanto lhe devia, foi Joana julgada por um
tribunal iníquo, presidido pelo bispo Pedro Cauchon, de Beauvais, que outro
interesse não tinha, senão de ser agradável aos ingleses. Sem ter um advogado,
que lhe defendesse a causa; sem que lhe fossem ouvidos os protestos e solene
apelação para a Santa Sé, Joana foi condenada à morte, a ser queimada viva. Na
hora solene da execução (30 de maio de 1431) Joana se houve com toda a grandeza
e dignidade. Heroína fora na vida, como heroína morreu, invocando o nome de
Jesus.
“Estamos
perdidos nós todos”, exclamou um oficial inglês, que assistira àquela cena,
“pois ela é uma santa”. Os soldados, habituados à vida rude de guerreiro,
enxergavam em Joana “um ser angélico, em cuja presença ninguém se atrevia a
dizer ou praticar incoveniências”. Joana não permitia a blasfêmias entre os
soldados, e mantinha entre eles a mais rigorosa disciplina. Confessava-se quase
diariamente e, além dos sacrifícios e privações, que a vida no acampamento lhe
impunha, praticava o jejum e a abstinência com muito rigor. A família requereu
revisão do processo junto a Santa Sé, para que fosse reabilitada a inocência de
grande heroína. A Santa Sé anuiu a este justo pedido, e o Papa Calixto III não
só anulou o processo de Rouen, como também declarou solenemente a inocência de
Joana. Pio X beatificou-a em 10 de abril de 1909. Em 1924 foi Joana canonizada
por S.S Pio XI na presença de milhares de cristãos, e sob o entusiasmo mais
justo de todos os católicos da França e do mundo.
Reflexões
Incompreensíveis são os juízos de Deus
e inescrutáveis seus caminhos. De um modo admirável Deus se interessa pelos
destinos de uma nação. Para defender os direitos de um rei, de rei indigno,
recorre à intervenção de uma pobre donzela e esta morreu vítima de um processo
iníquo. “Quem já conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro?”
(Rom. 11.34)