Há toda uma gama de conseqüências da crise da Igreja após o Concílio Vaticano II. A derrocada das escolas católicas talvez tenha sido a conseqüência mais deletéria, pois tem efeitos duradouros de difícil reversão. A seguir, os leitores poderão ler dois textos, um de Nelson Rodrigues e outro de Chesterton. Nelson comenta o fechamento do Colégio Sion de Petrópolis e Chesterton fala sobre a necessidade de uma educação católica e de como ela se daria no mundo moderno.
Já não existem, ou existem muito poucas, escolas católicas no Brasil. Esta crise não é só local. Acabamos de ver, algumas semanas atrás, o Sr. B. Hussein Obama, comunista árabe, abordista e presidente dos EUA, receber um título da Universidade de Notre Dame, Universidade de Nossa Senhora. Meu Deus! Que blasfêmia! De nossas PUC’s, [PUC=Pontifícia Universidade Católica] nem se fala. São antros de abortistas, gaysistas, comunistas etc. Quem quiser entender como o Concílio Vaticano II atingiu de forma destruidora as escolas católicas, leia o capítulo XII, do Iota Unum, livro de Romano Amerio.
Mas vamos aos textos, primeiro o de Nelson, depois o de Chesterton.
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Colégio Religioso
Nelson Rodrigues
Esquecia-me de explicar que seu [de uma das grã-finas, personagens constantes nas crônicas de Nelson] telefonema tinha um motivo: o recente artigo de Gustavo Corção. O pensador católico escrevera, exatamente, sobre o espantoso fechamento de colégios religiosos. Não sei se vocês tomaram conhecimento do artigo. Ai de nós, ai de nós. Somos, e cada vez mais, leitores ineptos, relapsos. O Brasil está cheio de coisas que devem ser ditas. Corção é, precisamente, um dos nossos autores vitais. Não esperem do seu espírito nenhum silencia vil. E a minha conhecida estava, com todas as forças de sua alma, ao lado de Corção.
Já chorando, ia explicando. Fechou-se o “Sion” de Petrópolis, sob a alegação de prejuízo. Era mentira ou, se quiserem, uma falsa verdade, uma verdade violentada. O que houve é que, lá, o ensino religioso se aviltou de tal forma que as famílias católicas entraram em pânico mais profundo e justificado. Os pais foram, pouco a pouco, retirando as suas filhas. Preferiam matriculá-las no “Pedro II”, por exemplo, certos de que, neste, não se agride o sentimento religioso de ninguém. Numa palavra – O “Pedro II” merecia, sim, a confiança de qualquer pai católico.
Portanto, as autoras de toda a decadência do “Sion” de Petrópolis eram as freiras “pra frente”, as “moderninhas”, exiladas de Deus. Claro que nem todas são assim. Mas as autênticas eram logo isoladas e vencidas. Fechou-se o “Sion” e que aconteceu com as freiras de verdade? Foram amontoadas num sítio, não sei onde. É uma espécie de campo de concentração de freiras que o são de verdade e, portanto, tidas como irrecuperáveis.
A minha conhecida despediu-se com o apelo: – “Escreva, escreva!” No dia seguinte, ou dois dias depois, sou procurado na redação. Um senhor de seus 50 anos, bem vestido. Mas isso não importa. Importa é o que ele disse. Era pai de uma menina que tinha sido do “Sion” daqui. Começou assim: – “Quero dizer que o Corção está certo, certíssimo. E achei admirável que dissesse o nome do colégio. O nome do colégio era vital.”
O visitante contou-me um episódio recente. Tudo acontecera no tempo das passeatas. Hoje, temos a sensação de que as passeatas são mais antigas do que a primeira Batalha do Marne, mais antigas do que o último Baile da Ilha Fiscal. E quando havia uma, era uma festa para as freiras “moderninhas”. Acontecia esta coisa prodigiosa: – elas, que andavam de minissaia, só punham o hábito para ir à passeata. Vocês se lembram daquela dos “100 mil”. Dos “100 mil” ou outra qualquer. O fato é que, como se tratava de passeata, as freiras vestiram-se de freiras. E uma delas, professora, passou na aula e chamou uma das alunas: – “Você vai tomar conta da turma.” Largou a classe e foi, excitadíssima, com outras, para a passeata. Como pouco mais, desfilava na Avenida, dando adeusinhos para as sacadas ou entrando no coro: – “Participação, participação, participação!” Das sacadas, choviam as listas telefônicas e os cinzeiros. Depois, veio a palavra de ordem: – “Vamos sentar, pessoal.” Todos sentaram-se, inclusive as freiras “moderninhas”. Era a primeira passeata sentada, na história do homem.
E as alunas abandonadas? Mal a freira saiu, muito esfuziante e pateta, a menina incumbida de tomar conta das outras avisou: – “Não tomo conta de ninguém. Vocês façam o que quiserem.” E foi uma gritaria infernal. Súbito, entra lá uma outra professora, furiosa. Silêncio. E a professora, esganiçada: – “Quem é a responsável por esta bagunça?” Resposta fulminante da menina encarregada: – “A responsável é aquela irresponsável que foi pra farra!” Fim da história. E pergunta o pai da ex-aluna do “Sion”: – “O senhor compreende, agora, por que se fecham os colégios religiosos?” Fui levar o meu visitante até à porta. Ele saiu. Exalava uma cava depressão.
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Novos argumentos a favor das escolas católicas
Gilbert Keith Chesterton
Não há nada particularmente meritório em ser moderno. Um homem que seriamente descreve seu credo como modernismo poderia, da mesma forma, inventar um credo chamado “segunda-feirismo”, querendo dizer que ele tem uma fé especial a tudo que lhe acontece nas segundas-feiras; ou um credo chamado “manhanismo”, querendo dizer que ele acredita nas idéias que lhe ocorrem nas manhãs, mas não nas tardes.
A modernidade é apenas o momento em que por acaso nos encontramos, e ninguém que pensa considerará isso superior tanto em relação ao tempo posterior quanto ao antecedente. Mas, num sentindo relativo e racional, podemos nos congratular por sabermos das novidades do momento, por termos percebido os fatos e descobertas recentes que algumas pessoas ainda ignoram.
E é neste sentido que podemos verdadeiramente chamar de um fato científico, e especialmente psicológico, o conceito fundamental da educação católica. Nossa demanda por uma cultura completa, baseada em sua própria filosofia e religião, é uma demanda que não encontra resposta à luz da mais vital, e mais moderna, psicologia. Quanto a isso, para aqueles que se preocupam com tais coisas, dificilmente haverá uma palavra mais moderna que atmosfera.
Ora, contanto que estejam engajados em algo diferente de uma discussão conosco, nossos amigos modernos e científicos nunca se cansam de nos dizer que a educação deve ser tratada como um todo; que todas as partes da mente se afetam mutuamente; que nada é trivial demais para não ser significante ou mesmo simbólico; que todos os pensamentos podem ser “coloridos” por emoções conscientes ou inconscientes; que o conhecimento nunca pode ser colocado em compartimentos estanques; que o que parece um detalhe desprezível pode ser o símbolo de um desejo profundo; que nada é negativo, nada está a descoberto, que nada permanece separado, isolado.
Eles usam esses argumentos para todo o tipo de propósitos, alguns deles lógicos, alguns quase insanamente tolos; mas é assim, em geral, como eles agem. E uma coisa que eles não sabem é que estão argumentando a favor da educação católica, e especialmente a favor da atmosfera católica nas escolas católicas. Se soubessem, talvez desistissem de seus argumentos.
De fato, aqueles que recusam a entender que uma criança católica deve ter uma escola completamente católica vivem naqueles velhos tempos, velhos e maus tempos, em que ninguém queria educação, mas somente instrução. Eles são relíquias de um tempo morto quando se pensava que era suficiente treinar, de forma supostamente mecânica, os alunos em duas ou três lições maçantes e inúteis. Eles descendem do filisteu original que primeiro falou sobre “Os Três R’s”;[1] e a piada sobre ele é muito simbólica de seu tipo e de seu tempo. Pois ele era um tipo de homem que insistia muito literariamente sobre o letramento, e, ainda assim, se mostrava iletrado.
Eles eram homens ricos muito iletrados que exigiam ruidosamente educação. E dentre as marcas de sua ignorância e estupidez estava uma marca particular que consistia em considerar letras e figuras como coisas mortas, muito separadas entre si e da visão geral da vida. Eles pensavam que um menino que aprendia suas primeiras letras estava muito separado de um homem de letras. Eles pensavam que um menino envolvido em seus cálculos poderia se tornar uma máquina calculadora.
Quando alguém lhes disse, portanto, “Essas coisas devem ser ensinadas numa atmosfera espiritual”, eles consideraram isso um contra-senso; tiveram uma vaga idéia de que uma criança só pudesse fazer uma simples adição se tivesse envolvida pelo aroma do incenso. Mas eles consideravam uma simples adição muito mais simples do que realmente era. Quando um polemista católico lhes disse, “Mesmo o alfabeto pode ser aprendido de uma maneira católica”, eles o consideraram um fanático delirante, pensaram que ele afirmava que ninguém nunca poderia ler algo que não fosse um missal em latim.
Mas ele acreditava no que dizia, e o que ele dizia era razoável psicologia. Há uma perspectiva católica do aprendizado do alfabeto; por exemplo, ela evita que você pense que a única coisa que importa é aprender o alfabeto; ou que você despreze pessoas melhores que você, se elas acaso não aprenderam o alfabeto.
A antiga e não-psicológica escola de instrutores costumava dizer: “Que sentido pode ter em misturar aritmética com religião?” Mas aritmética está misturada com religião ou, na pior das hipóteses, com filosofia. Faz uma enorme diferença se o professor afirma que a verdade é real, ou relativa, ou mutável, ou uma ilusão. O homem que dizia, “Dois e dois é cinco nas estrelas fixas”, estava ensinando aritmética de uma maneira anti-racional e, portanto, de uma maneira anti-católica. O católico é muito mais assertivo a respeito de verdades fixas do que de estrelas fixas.
Mas não estou agora discutindo qual filosofia é melhor; estou apenas alertando sobre o fato de que toda educação ensina uma filosofia; se não por meio de dogmas, então será por meio de sugestão, de implicação, de atmosfera. Cada parte da educação tem uma conexão como todas as outras partes. Se todas não combinam para transmitir uma visão geral da vida, não é educação em absoluto. E os modernos educadores, os modernos psicólogos, os modernos homens de ciência, todos concordam em assegurar e reassegurar isto, até que começam a discutir com os católicos sobre as escolas católicas.
Em resumo, se há uma verdade psicológica possível de ser descoberta pela razão humana, ela é esta: que, a menos que os católicos possuam e gerenciem escolas católicas, eles não terão ensino católico. Pois há um argumento contrário a que famílias católicas cresçam sendo católicas, por meio de qualquer sistema que possa ser chamado de educacional no sentido atual do termo. Há um argumento contrário a qualquer concessão aos católicos, ignorando suas idiossincrasias como se elas fossem uma insanidade. Há um argumento para isso, porque há e sempre houve um argumento a favor da perseguição; pois o estado age segundo o princípio de que certas filosofias são falsas e perigosas e devem ser esmagadas mesmo se são sinceramente seguidas; de fato, devem ser esmagadas especialmente porque são sinceramente seguidas.
Mas se os católicos forem ensinar o catolicismo todo o tempo, eles não podem meramente ensinar teologia católica parte do tempo. São nossos oponentes, não nós, que têm um ponto de vista supersticioso e escandaloso sobre a teologia dogmática. São eles que supõe que um “assunto” especial chamado teologia pode ser colocado na cabeça das pessoas por um experimento que dure meia hora; e que essa inoculação mágica durará uma semana num mundo que está inundado de uma concepção de vida contrária.
A teologia é apenas religião articulada; mas, por estranho que pareça aos verdadeiros cristãos que nos criticam, é necessário tanto ter uma religião quanto uma teologia. E religião, como estão sempre muito gentilmente a nos lembrar quando este problema particular não está em foco, é uma coisa para todos os dias da semana e não meramente para o domingo ou para as missas.
A verdade é que o mundo moderno está comprometido com duas concepções totalmente diferentes e inconsistentes de educação. Ele está sempre tentando expandir o escopo da educação; e sempre tentando excluir dela toda a religião e filosofia. Mas isso é absoluto contra-senso. Você pode ter uma educação que ensine ateísmo porque o ateísmo é verdadeiro, e esta pode ser, de seu próprio ponto de vista, uma educação completa. Mas você não pode ter uma educação alegando ensinar toda a verdade, e então recusando discutir se o ateísmo é verdadeiro.
Desde o advento de uma psicologia da educação mais ambiciosa, nossas escolas têm alegado desenvolver todos os aspectos da natureza humana; isto é, produzir um ser humano completo. Você não pode fazer isso e ignorar totalmente uma grande tradição viva, que ensina que o ser humano completo deve ser um ser humano católico ou cristão. Ou você persegue essa tradição até a sua extinção ou permite a ela construir sua própria e completa educação.
Quando o ensino consistia de soletrar, contar e construir porta-panelas e cabides, você poderia até ter razão em dizer que este ensino podia ser conduzido por um batista ou um budista. Mas que sentido tem uma educação que inclui lições de “cidadania”, por exemplo; e então fingir não incluir algo como uma teoria moral, e ignorar todos os que afirmam que uma teoria moral depende de uma teologia moral.
Os instrutores professam revelar todas as dimensões do aluno; a dimensão estética, a atlética, a política etc.; e mesmo assim eles ainda vêm com o rançoso jargão do século XIX sobre o ensino público não ter nada a ver com a dimensão religiosa. A verdade é que, nessa questão, são nossos inimigos que são antiquados e ainda permanecem na asfixiante atmosfera de uma educação não-científica e subdesenvolvida; enquanto nós estamos ao lado de todos os modernos e sérios psicólogos e educadores no reconhecimento da idéia de atmosfera. Eles às vezes preferem chamá-la de meio-ambiente.
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[1] Os três erres se referem às palavras, em inglês, relativas às supostas três habilidades básicas de uma educação orientada: reading [leitura], writing [escrita], arithmetic [aritmética]. As palavras, embora não comecem todas com “r”, tem um fonema forte que envolve esta letra. (N. do T.);
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