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27/11/2018

Espiritismo: blog entrevista Chesterton


Nota: O senhor Gilbert Keith Chesterton está muito ocupado no momento e não pode conceder uma entrevista ao blog pessoalmente. Vali-me da prestimosa ajuda da senhora Francis, esposa do eminente escritor inglês, que passou-lhe as perguntas. Ele telegrafou diretamente ao responsável pelo blog com suas respostas luminosas. Agradeço de público o auxílio da senhora Francis pela já conhecida atenção com todos que, por um motivo ou outro, procuram orientações do gênio inglês. Lembro-me com carinho e saudade dos deliciosos chás por ela preparados em outras oportunidades em que me encontrei com o casal em sua residência. Vamos à entrevista.

Blog do Angueth – Penso que para começar, devo perguntar-lhe se o senhor considera o espiritismo uma farsa, uma fraude.

Chesterton – Não, em absoluto. Minha posição é de uma forte objeção ao espiritismo, não porque ele seja fraudulento, mas porque ele é genuíno.

Blog do Angueth Senhor Chesterton, não sei se o senhor sabe, mas o espiritismo é muito popular no Brasil. Aqui a situação é, talvez, um pouco diferente, pois há um sincretismo do espiritismo, digamos, inglês, com os cultos africanos. Um famoso escritor brasileiro, Lima Barreto, muito ligado, por sua origem, aos extratos mais pobres da sociedade, fez, recentemente uma observação, sobre a qual gostaria de colher suas observações. Diz nosso escritor: “O padre, para o grosso do povo, não se comunica no mal com a divindade; mas o médium, o feiticeiro, o macumbeiro, se não a recebem em seus transes, recebem, entretanto, almas e espíritos que, por já não serem mais da terra, estão mais perto de Deus e participam um pouco da sua eterna e imensa sabedoria.”

Chesterton – A marca especial do mundo moderno não é que ele seja cético, mas que ele é dogmático sem saber. Ele diz, escarnecendo dos antigos devotos, que eles acreditavam sem saber porque acreditavam. Mas os modernos acreditam sem saber no que acreditam – e sem nem mesmo saber que eles realmente acreditam. Eles sempre têm um dogma inconsciente; e um dogma inconsciente é a definição de um preconceito. Os espíritas agem segundo um dogma, que não podem declarar dogmaticamente e, portanto, somente o assumem dogmaticamente. O que o espírita assume é praticamente o seguinte: não somente a existência de espíritos, mas a inexistência de espíritos maus. Em termos populares, os espíritas são otimistas em relação ao mundo espiritual. A objeção real ao espiritismo é quase idêntica à sua afirmação. A objeção é que ele coloca um homem sobre o controle de forças espirituais, ou que ele o coloca em contato com o desconhecido. Ele supõe a rendição espiritual do médium, o que é dúbio, mesmo que a influência seja boa, e chocante, se ela for má. Ora, não é certamente auto-evidente, por tudo que sabemos, que ela não possa ser má.

Blog do Angueth – Sabemos que na Inglaterra o grande apóstolo do espiritismo é Sir Arthur Conan Doyle, o grande criador de Sherlock Holmes. Sua influência é extraordinária na popularização do espiritismo. Sabemos também que ele faz uma distinção entre um espiritismo superior, o que ele professa, e um inferior, aquele dos fenômenos materiais mais grosseiros que acontecem em sessões espíritas: mesas e objetos se movendo. Sendo o senhor um grande admirador de histórias de detetives, tendo mesmo escrito as extraordinárias aventuras do Pe. Brown, o que o senhor tem a dizer-nos sobre Sir Doyle.

Chesterton – O sucesso literário merecido de Sir Arthur Conan Doyle o faz, de fato, o grande apóstolo do espiritismo. Explico minha discordância de suas ideias. Ele concorda com os protestos contra os truques grotescos e mesmo degradantes das sessões espíritas. Ele diz que mesas e cadeiras dançantes pertencem ao “plano inferior”; que este não é seu interesse principal; que ele deseja aproximar-se do espiritismo reverentemente, de considera-lo uma religião que pode nos fornecer respostas aos grandes mistérios da vida e da morte. Penso que essa distinção é muito valiosa quando completamente invertida. Uma cadeira ou mesa que voa parece-me uma coisa genuinamente interessante. Tomemos, por exemplo, qualquer mente racional de cem anos atrás, digamos aquela de Voltaire ou Gibbon, que teria considerado uma mesa voadora não tanto meramente sobrenatural, mas simplesmente impossível. Se é possível, algo sempre considerado uma lei da natureza é quebrado. O materialismo, com todas as suas leis mecânicas da natureza está acabado. Em resumo, uma mesa dançante não pode ser considerada um incidente comum; e se ela ocorre (como parece ocorrer), é um incidente muito importante. Sou completamente incapaz de ver que uma mesa dançante, ou uma religião numa mesa dançante, seja mais convincente do que uma religião de uma mesa mais repousante e possivelmente mais útil. As coisas que reverencio, no céu e na terra, são certas virtudes ou valores; e uma mesa não indica que ela possua essas virtudes simplesmente por levantar suas pernas. A isto o espírita responderá que ele não me pede para reverenciar a mesa, mas as revelações que vêm da mesa. E, ignorante como sou de tais revelações, sei o suficiente delas para não reverenciá-las, ou mesmo respeitá-las.

Blog do Angueth – Sei que há duas objeções que são colocadas às suas posições sobre o espiritismo. A primeira é que o senhor admitidamente nunca participou de uma sessão espírita e, portanto, não tem autoridade de emitir opiniões a respeito. Esta é, inclusive, a posição do próprio Sir Arthur Conan Doyle. A segunda objeção, derivada a primeira, é a de que o senhor ignora o valor da comunicação entre este mundo e o outro. Como o senhor responderia a essas duas objeções?

Chesterton – Quanto à primeira objeção, é verdade que nunca participei de uma sessão espírita, mas há muitas coisas que não presenciei, sobre as quais não tenho a mais mínima intenção de parar de falar. Recuso-me de parar de falar sobre o Cerco de Tróia. Recuso-me a ficar mudo em relação à Revolução Francesa. Não me silenciarei sobre o assassinato de Júlio César. Se ninguém tem o direito de julgar o espiritismo exceto um homem que já participou de uma sessão espírita, os resultados, logicamente falando, são muito sérios: quase pareceria que ninguém tivesse nenhum direito de julgar o cristianismo se não participasse se sua primeira reunião em Pentecostes. O que seria temerário. Considero-me capaz de formar minha opinião sobre o espiritismo sem ter visto espíritos, da mesma forma que formo minha opinião sobre a Guerra Japonesa sem tê-la visto, ou minha opinião sobre os milionários americanos sem (graças a Deus) ter visto um milionário americano. Bem-aventurados aqueles que não viram e acreditaram: uma passagem que alguns têm considerado uma profecia do moderno jornalismo. Respondo à segunda objeção, dizendo que eu não ignoro o valor da comunicação entre este mundo e o outro. Digo apenas que um princípio diferente liga a investigação nesse campo espiritual, em relação à investigação de qualquer outro campo. Se um homem põe uma isca no anzol para pegar um peixe, o peixe virá, mesmo se ele declara não acreditar em peixes. Se um homem faz uma arapuca para passarinhos, passarinhos serão pegos, mesmo se ele considera supersticioso acreditar em passarinhos. Mas um homem não pode colocar iscas para almas. Um homem não pode construir arapucas para capturar deuses. Todos a escolas de sábios sempre concordaram que essa última captura depende, de algum modo, da fé de quem captura. Então, a coisa se resume a isto: se você não tem fé nos espíritos, seu apelo é em vão; se você tem, você precisa disto? Se você não acredita, você não pode apelar. Se você acredita, você não apelará.

Obs: Para quem desejar ler outras entrevistas de Chesterton, favor acessar o marcador BLOG ENTREVISTA CHESTERTON

23/12/2012

Blog entrevista Chesterton: Natal com Chesterton – Parte IV


Graças à Sra. Chesterton, tivemos acesso a algumas observações do gênio inglês sobre o Natal, escritas aqui e ali e coletadas por sua secretária, Dorothy Collins. O Sr. Chesterton está muito ocupado para dar qualquer declaração no momento. A Sra. Chesterton nos enviou os pequenos textos, quatro no total, a tempo de os publicarmos durante o Advento de 2012. Agradecemos a gentileza e a confiança.

Com este texto, o blog aproveita para desejar a todos os seus leitores um feliz e santo Natal. Que celebrando a primeira vinda de Salvador não esqueçamos de Sua segunda vinda e nos preparemos para ela!


Há por aí algumas contradições sobre o Natal – e, de fato, sobre as tradições cristãs em geral. Elas são aparentes em indivíduos que nos afirmam, em jornais e outros lugares, que se emanciparam de dogmas, e agora se propõem a viver o espírito do cristianismo. A que eu respondo: “Ok. Vá em frente,” ou palavras similares. Mas então sempre me encontro confrontado com este fato extraordinário. Eles começam a viver o espírito do cristianismo, e lançam-se freneticamente a impedir as pessoas pobres de beberem cerveja, impedir as nações oprimidas de se defenderem contra os tiranos (porque isso pode levar à guerra), a tirar crianças deficientes de seus pais e trancá-las em algum tipo de sanatório materialista, etc. E então eles ficam surpresos quanto digo-lhes que eles tem muito menos o espírito do que a letra do cristianismo, do que suas palavras,  do que a terminologia de seus dogmas. De fato, eles mantiveram algumas das palavras e terminologia, palavras como paz, justiça e amor; mas fazem essas palavras significarem uma atmosfera completamente estranha ao cristianismo; eles mantiveram a letra e perderam o espírito.

E tal como acontece com o cristianismo, assim também com o Natal. Se os homens soubessem exatamente o que querem dizer com Natal, e então começassem a criar novos símbolos, novas cerimônias, novas brincadeiras, isso poderia ser uma coisa boa. Algo do tipo pode acontecer, muito provavelmente, naquele mundo dos homens modernos que sabem o que o Natal significa. Mas a maior parte das modificações que são discutidas nas revistas e em outros lugares são o exato reverso disso. Elas são realmente modos por meio dos quais os homens podem manter o nome de Natal, e uns poucos esmaecidos símbolos natalinos, enquanto fazem algo totalmente diferente.


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18/12/2012

Blog entrevista Chesterton: Natal com Chesterton – Parte III


Graças à Sra. Chesterton, tivemos acesso a algumas observações do gênio inglês sobre o Natal, escritas aqui e ali e coletadas por sua secretária, Dorothy Collins. O Sr. Chesterton está muito ocupado para dar qualquer declaração no momento. A Sra. Chesterton nos enviou os pequenos textos, quatro no total, a tempo de os publicarmos durante o Advento de 2012. Agradecemos a gentileza e a confiança. Dois dos textos já foram publicados (veja abaixo). Até o Natal, publicaremos o último deles.


A caridade do Natal pode, em certo sentido, cobrir todos os homens, mas não pode, de nenhum modo, cobrir todos os princípios, senão ela cobriria o princípio da falta de caridade. É autoevidente à primeira vista que o Natal é tanto conservador quanto liberal, desde que evitemos letras maiúsculas em ambas as palavras. O Natal não seria nada se não conservasse as tradições de nossos pais; não seria nada se não desse com liberalidade aos nossos irmãos. Conservar o Natal envolve a admissão de que o mundo já possui tradições valorosas e honoráveis de um tipo local e doméstico. Ajudar os pobres no Natal envolve em si mesmo a admissão de que o mundo não possui uma distribuição econômica satisfatória, que nem tudo no mundo está bem, ou próximo do bem. Em outras palavras, o Natal, sendo uma instituição cristã, já contem em si as duas ações alternativas em relação à sociedade: a preservação do que foi bom no passado e a remoção do que é ruim no presente. Em épocas mais simples, essas coisas poderiam ter tomado formas mais simples: a primeira na forma de brinde e a segunda na forma de generosidade. Mas em qualquer forma, ou em qualquer grau, elas envolvem logicamente duas verdades que se equilibram, verdades que se complementam, embora não raro pareçam contraditórias: que, em certo sentido, as coisas devem ser como são, enquanto que em outro sentido elas não são como deveriam ser.

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13/12/2012

Blog entrevista Chesterton: Natal com Chesterton – Parte II


Graças à Sra. Chesterton, tivemos acesso a algumas observações do gênio inglês sobre o Natal, escritas aqui e ali e coletadas por sua secretária, Dorothy Collins. O Sr. Chesterton está muito ocupado para dar qualquer declaração no momento. A Sra. Chesterton nos enviou os pequenos textos, quatro no total, a tempo de os publicarmos durante o Advento de 2012.  Agradecemos a gentileza e a confiança. Um dos textos já foi publicado (veja abaixo). Até o Natal, publicaremos os outros dois textos.



Toda cerimônia depende de um símbolo; e todos os símbolos têm sido vulgarizados e apodrecidos pelas condições comerciais de nosso tempo. Isso é especialmente verdade desde que sentimos a infecção comercial americana, e o progresso tornou Londres uma cidade não superior a si mesma, mas inferior a Nova York. De todos os símbolos falsificados e esmaecidos, o mais melancólico exemplo é o antigo símbolo da chama. Em todas as épocas e países civilizados, foi sempre natural falar de um grande festival em que “a cidade era iluminada.” Não há sentido atualmente em se falar que a cidade foi iluminada. Não há propósito em iluminá-la por qualquer entusiasmo normal ou nobre, tal como o sair-se vencedor numa batalha. Toda a cidade está já iluminada, mas não por coisas nobres. Está iluminada somente com o propósito de se insistir na imensa importância de coisas triviais e materiais, adornadas por motivos inteiramente mercenários. O significado de tais cores e tais luzes foi, portanto, inteiramente aniquilado. Não adianta lançar um foguete dourado ou púrpuro para a glória do Rei ou do País, ou acender uma imensa fogueira vermelha no dia de São George, quando todos estão acostumados a ver o mesmo alfabeto ardente proclamando uma pasta de dentes ou uma goma de mascar. A nova iluminação não fez a pasta de dentes ou a goma de mascar tão importantes quanto São George ou o Rei George; porque nada poderia. Mas ela fez as pessoas se cansarem do modo de proclamar grandes coisas, por seu eterno uso para proclamar pequenas coisas. A nova iluminação não destruiu a diferença entre a luz e a escuridão, mas permitiu a luz menor ofuscar a maior.

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10/12/2012

Blog entrevista Chesterton: Natal com Chesterton – Parte I


Graças à Sra. Chesterton, tivemos acesso a algumas observações do gênio inglês sobre o Natal, escritas aqui e ali e coletadas por sua secretária, Dorothy Collins. O Sr. Chesterton está muito ocupado para dar qualquer declaração no momento. A Sra. Chesterton nos enviou os pequenos textos, quatro no total, a tempo de os publicarmos durante o Advento de 2012. Agradecemos a gentileza e a confiança. Até o Natal, publicaremos os outros três textos.
  
A antiga frase “o Natal está chegando” é especialmente apropriada para uma época em que esta é quase a única coisa a respeito da qual sabemos algo: que ela está chegando. Pode ser verdade, num sentido mais amplo, que o Natal esteja chegando: no sentido de que o Natal está voltando. O Natal pertence a uma ordem de ideias que nunca realmente pereceu, e seu desaparecimento é agora pouco provável. Ele teve de início uma espécie de glamour de uma causa perdida; foi como um por do sol eterno. São as coisas que nunca morrem que ganham a reputação de estarem moribundas. 

Somos constantemente lembrados, especialmente por aqueles céticos empedernidos que parecem nunca ser capazes de dar um passo além em suas concepções, que muitos costumes do Natal são coisas pagãs. O que essas pessoas não veem é um fato muito interessante: que se essas coisas são pagãs, elas sobreviveram o paganismo. Se essas tradições foram tão fortes que sobreviveram a tão tremenda insurreição, como foi a mudança de toda a religião da Europa, a queda do império universal e o surgimento da Igreja universal, não parece impossível que elas possam sobreviver a alguns poucos mecanismos elétricos e a tateantes e ineficientes leis educacionais.

17/10/2012

Imparcialidade em discussões religiosas: blog entrevista Chesterton.


Blog do Angueth – Senhor Chesterton, é um prazer encontrá-lo nesta estação ferroviária. Para onde o senhor está indo?

Chesterton – Na verdade, estou aguardando um telegrama de Frances. É que eu esqueci meu destino, mas sei que estou indo para uma palestra no norte da Inglaterra. Passei-lhe um telegrama e aguardo sua resposta.

Blog do Angueth – O senhor parece estar escrevendo algo neste pedaço de papel.

Chesterton – Estou escrevendo meu artigo semanal para o The Illustrated London News. Tenho de enviá-lo ainda hoje, por telegrama e só consegui encontrar este guardanapo.

Blog do Angueth – Estou então fazendo o senhor perder tempo.

Chesterton – Em absoluto, estava mesmo precisando interromper o trabalho por alguns instantes.

Blog do Angueth – Talvez eu possa assim fazer-lhe algumas perguntas sobre um assunto muito importante?

Chesterton – Certamente.

Blog do Angueth – Como leitor de seus artigos no The Illustrated London News, não posso deixar de notar que o senhor mantém um debate intenso com os céticos e racionalistas que abundam em todos os lugares.

Chesterton – Sim, há uma singular maioria dessa espécie de homens atualmente.

Blog do Angueth – Imagino que o senhor já tenha se defrontado com o arrogante argumento de que, em assuntos de religião e filosofia, quem se associa a uma escola de pensamento ou a um credo, tem automaticamente questionada sua imparcialidade em discussões que envolvem tais assuntos.

Chesterton – Com efeito, este é de fato um argumento comum, embora altamente contraditório.

Blog do Angueth – Como assim?

Chesterton – Bem, agnóstico é aquele homem que não chegou à conclusão alguma sobre qualquer coisa e um homem religioso é aquele que chegou a conclusões muito firmes sobre tudo. A contradição está em considerar o agnóstico imparcial porque ele não chegou à conclusão alguma e o religioso parcial porque ele, ao contrário, chegou a muitas conclusões sobre quase todas as coisas, ou pelo menos, sobre o todo.

Blog do Angueth – De qualquer modo, é curioso ver como esses intelectuais agnósticos ficam às vezes indignados com homens religiosos que ousam contradizê-los em seus assuntos prediletos.

Chesterton – Isto é um fato. Lembro-me de uma vez discutir com um jovem e honesto ateu, que ficou chocado quando questionei algumas de suas suposições, que eram absolutamente sagradas para ele, tais como a proposição não provada da independência da matéria e a improvável proposição de seu poder para dar origem à mente. Ele finalmente recorreu à questão, que formulou com calorosa indignação: “Bem, o senhor pode me dizer sobre algum intelectual, proeminente na ciência ou na filosofia, que aceitou ou aceita a existência de milagres?” Eu disse: “Com prazer. Descartes, Dr. Johnson, Newton, Faraday, Newman, Gladstone, Pasteur, Browning, Brunetière – e tantos quanto o senhor queira.”

Blog do Angueth – Não posso esperar pela resposta do jovem ateu.

Chesterton – Bem, o jovem admiravelmente idealista reagiu extraordinariamente dizendo: “Oh, mas é claro que eles tinham de aceitar a existência de milagres; eles eram cristãos.” Ora, ele primeiramente me desafiou a encontrar um patinho feio, e então ele desqualifica todos os meus patinhos por serem feios. O fato de que todos esses grandes intelectos compartilhavam a visão cristã era de algum modo a prova de que ou eles não eram grandes intelectos ou não compartilhavam aquela visão.

Blog do Angueth – Isto é realmente impressionante!

Chesterton – O argumento se reveste de uma forma charmosamente conveniente: “Todos os homens que contam compartilham de minha conclusão; pois se eles não compartilharem, eles não contam.” Oh, suspeito que o telegrama de Frances acaba de chegar, pelo aceno do telegrafista. Infelizmente, tenho de ir.

Blog do Angueth – Muito obrigado e boa viagem!

Chesterton – Thank you very much.


29/09/2012

A Queda do Homem: blog entrevista Gilbert Keith Chesterton.


Blog do Angueth – Devo agradecer novamente vossa disponibilidade de nos conceder mais uma entrevista.

Chesterton – Curiosamente, há épocas em minha vida que tudo que faço é dar entrevistas, participar de debates e ser saco de pancadas do Sr. Bernard Shaw e do Sr. H.G. Wells.

Blog do Angueth – Sei que certa vez o senhor se irritou com este último senhor acerca de uma discussão sobre o Jardim do Éden e a Queda do Homem.

Chesterton – Eu pertenço, como um produto da evolução biológica (dogma defendido pelo Sr. Wells), à ordem dos paquidermes. Não sou movido minimamente por qualquer irritação.

Blog do Angueth – Mas o que me interessa aqui é o que o senhor pensa sobre a Queda. Como vivemos uma época em que todas as antigas heresias convivem entre nós, há hoje muita gente, mesmo dentro da Igreja Católica, que menospreza a Queda e considera que se deve relativizar a história do Gênesis. Como o senhor mesmo disse certa vez: “a mente do homem moderno é uma curiosa mescla de calvinismo deteriorado e de budismo diluído.” Eu perguntaria então: o que nos ensina a história da Queda do Homem? Que visões podem ser acalentadas por quem nela acredita?

Chesterton – A Queda é uma visão de vida. Ela não é apenas a única visão esclarecedora da vida, mas a única encorajadora. Ela afirma, contra as únicas filosofias alternativas reais, aquelas dos budistas, dos pessimistas e dos prometéicos, que nós usamos impropriamente um mundo bom, e não simplesmente que estamos presos num mundo mau. Ela remete o mal ao uso errado da vontade, e assim declara que ele pode eventualmente ser corrigido pelo correto uso da vontade. Qualquer outro credo, exceto este, é uma forma de rendição ao destino. Um homem que guarda esta visão de vida descobrirá que ela ilumina milhares de coisas; sobre as quais, as éticas evolucionárias não têm nada a dizer. 

Blog do Angueth – O senhor poderia nos dar um exemplo destas coisas iluminadas por esta visão?

Posso dar vários. O colossal contraste entre a inteireza da máquina humana e a contínua corrupção de seus motivos. O fato de que nenhum progresso social parece nos livrar do egoísmo. O fato de que os primeiros, e não o últimos, homens de qualquer escola ou revolução são geralmente os melhores e os mais puros; tal como William Penn foi melhor que um quacker milionário ou Washington melhor do que um magnata americano do petróleo. Aquele provérbio que diz: “O preço da liberdade é a eterna vigilância,” que é propriamente apenas um modo de declarar a verdade do pecado original. Aqueles extremos de bem e mal em que o homem excede a todos os animais pelos padrões do céu e do inferno. Aquele sentido de perda sublime que está em cada verso de toda grande poesia, e em nenhum outro lugar em maior quantidade do que na poesia dos pagãos e céticos: “Miramos o antes e o depois, e nos consumimos pelo que não é”; que clama contra todos os arrogantes e progressistas, das profundezas e abismos do coração partido do homem, de que a felicidade não é somente uma esperança, mas também, em certo estranho sentido, uma memória; e que somos todos reis no exílio.

Blog do Angueth – Mas então, senhor Chesterton, o correto entendimento da Queda é um antídoto contra o maniqueísmo, contra o panteísmo e, de quebra, o fundamento de nossa esperança?

Chesterton – Talvez possamos afirmar isto!

Blog do AnguethThank you very much! Say thanks to Mrs. Chesterton for the wonderful tea!

11/09/2012

50 anos de Vaticano II: blog entrevista Gilbert Keith Chesterton.

Blog do Angueth – Sabemos que aggiornamento foi a palavra de ordem do Concílio Vaticano II. Esta palavra foi usada para indicar atualização, adaptação, conformação da Igreja aos novos tempos, aos tempos modernos, ao século XX. Este conceito fundamentou a afirmação, na melhor das hipóteses, ufanista de Paulo VI, que disse, ao fim do concílio: “A religião de Deus que se fez homem se encontrou com a religião (pois é uma religião) do homem que se faz Deus.” Sabemos também que em nome deste aggiornamento a Igreja foi varrida por um tsunami de proporções apocalípticas. O senhor, como grande católico e defensor da Igreja, como um erudito de primeira grandeza, como defensor fidei, certamente não se furtará a nos dar sua opinião sobre tão importante tema eclesial moderno. Would you please share your thoughts with us? (Desculpem-me, mas o homem é inglês!)

Chesterton – Embora não conheça este “Blog do Angueth”, nem saiba o que seja um blog, exceto talvez um parente distante de Frances, que tenha perdido um g em seu nome (Frances Blogg, esposa de Chesterton), reconheço que a pergunta é importante e que sua resposta é ainda mais importante.

A Igreja não pode mudar com os tempos; simplesmente porque os tempos não mudam. A Igreja pode apenas manter-se firme ao longo dos tempos, apodrecer e feder com os tempos. No mundo econômico e social em si nada há exceto aquele tipo de atividade que é chamada degeneração; o fenecimento das elevadas flores da liberdade e sua decomposição no solo aborígene da escravidão. Desse modo, o mundo está em grande medida no mesmo estágio que estava no começo da Idade das Trevas. E a Igreja tem o mesmo papel que teve no começo da Idade das Trevas; o de salvar toda a luz e liberdade que ela puder salvar, o de resistir a queda vertiginosa do mundo e o de esperar por dias melhores. Tal é o que uma Igreja real certamente faria; mas uma Igreja real poderia ser capaz de fazer mais. Poderia fazer das idades das trevas mais que um tempo de semear; poderia fazer delas o exato reverso das trevas. Poderia apresentar seu ideal mais humano, ao modo de um contraste tão súbito e atrativo à tendência desumana dos tempos, que inspirasse repentinamente os homens a uma das revoluções morais da história; de modo a que os homens ainda viventes não experimentassem a morte antes de terem visto a justiça retornar.

Não desejamos, como dizem os jornais, uma Igreja que mude com os tempos. Desejamos uma Igreja que mude o mundo. Desejamos que ela mova o mundo de muitas coisas em direção às quais ele agora se encaminha; por exemplo, o Estado Servil. É por este teste que a história realmente julgará qualquer igreja, seja ela a Igreja real ou não.

Blog do Angueth – Thank you very much!


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Nota do blog: Já escrevi aqui o que penso sobre as posições de Chesterton acerca do Concílio Vaticano II, tivesse ele vivido os tempos pós-conciliares. O texto acima apareceu num artigo do grande católico inglês, no jornal New Witness, sobre se a Igreja deve mudar com os tempos ou não. Para quem sabe ler, a conclusão sobre a posição dele em relação ao CVII é óbvia!