30/12/2010

UM MONGE E A SUA CURIOSIDADE

Do livro Tesouro de Exemplos

Nota do blog: Com esta historinha linda, o blog deseja aos seus leitores um ano totalmente nas mãos de Deus. Que Ele seja providencial para vocês com têm sido para mim. Que Ele nos ensine Seus caminhos, com o fez para este mendigo feliz, que já participava da realeza de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Vivia um monge no silêncio de seu mosteiro. Era sábio e santo. Permitiu Deus que uma curiosidade perturbasse a paz de sua alma: "Qual será atualmente no mundo - perguntava-se - das almas a mais santa?" "E a mais sábia e mais feliz, qual será?"

Estava no coro, às primeiras horas da manhã, orava e dirigia a Deus a mesma pergunta: "Senhor, das almas que vivem agora neste mundo, qual será a mais santa, mais sábia e mais feliz?" Ouviu uma voz que lhe dizia: "Vai ao pórtico da igreja e ali te dirão qual é".

O monge pôs o capuz na cabeça, meteu as mãos nas largas mangas do hábito e atravessou os claustros silenciosos. Chegou ao pórtico. Um pobre ali estava. Passara a noite estendido num banco de pedra e naquele momento espreguiçava-se, benzia-se.

- Bom dia, irmão disse-lhe o monge.

- Bom dia, respondeu o mendigo com rosto alegre e em tom de entusiasmo.

- Irmão, replicou o monge, pelo que vejo estás contente.

- Sempre estou contente.

- Sempre? Então és um homem feliz?

- Muito feliz respondeu o humilde mendigo.

- Feliz?... não creio. Dize-me: Quando tens fome e pedes esmola e não recebes... és feliz?

- Sim, padre, sou feliz, porque penso que Deus, meu Pai, quer que eu passe um pouco de fome. Ele também passou. Mas Deus é muito bom para mim; nunca me falta um pedaço de pão.

- Dize-me - prosseguiu o monge - quando está nevando no inverno e tu, tremendo de frio, vais de porta em porta, como um passarinho que salta de um galho para outro, és feliz?

- Sim, padre, muito feliz, porque penso: é Deus, meu Pai, que quer que passe um pouco de frio, pois também ele passou frio. Aliás, nunca me falta um palheiro, onde passar a noite.

Estava o monge admirado... contemplando-o de alto a baixo, disse:

- Tu me enganas... não és pobre.

Sorriu o mendigo e respondeu: Não, Padre, eu não sou um pobre.

- Logo vi. . . Então, quem és?

- Padre, disse o outro, sou um rei que viajo incógnito por este mundo.

- Um rei?... Um rei?... E qual é o teu reino?

- Meu reino é o meu coração, onde mando sobre minhas paixões! Tenho, porém, um reino muito maior. Vê o senhor esse céu imenso, tem visto o sol, as estrelas, o firmamento? Tudo isso é de Deus, meu Pai. Todos os dias ponho-me de joelhos muitas vezes e digo: "Pai nosso que estais nos céus, como sois grande, como sois sábio, como sois poderoso! Não vos esqueçais deste pobre filho que anda por este mundo. Creia-me: Quando chegar a morte, despirei estes andrajos e voarei para o céu, onde verei a Deus, meu Pai, e com Ele reinarei pelos séculos dos séculos".

O monge não perguntou mais. Baixou a cabeça e voltou ao coro; estava convencido de ter encontrado o homem mais santo, mais sábio e mais feliz neste mundo.

 

22/12/2010

O ESPÍRITO DE NATAL

Do livro A Coisa, 1929

G.K. Chesterton

Aventurei-me muito imprudentemente a escrever sobre o Espírito de Natal; e o assunto apresenta uma dificuldade preliminar sobre a qual devo ser franco. É curioso ver atualmente as pessoas falarem sobre “o espírito” de uma coisa. Há, por exemplo, um tipo particular de pedante que está sempre nos dando lição de moral a respeito os espírito do verdadeiro cristianismo. Tanto quanto posso compreender, ele diz o exato oposto do que ele pretende. Ele explica que devemos usar os nomes “cristão”, “cristianismo”, etc., para algo que possui o espírito que especialmente não é cristão; algo que é um tipo de combinação de otimismo infundado de um ateu americano com pacifismo de um hindu moderado. Da mesma forma, lemos muito sobre o Espírito de Natal no moderno jornalismo e mercantilismo; mas isto é um oposto do mesmo tipo. Longe de preservar a essência sem a aparência, preserva-se a aparência onde não pode haver a essência. É algo similar a tomar duas substâncias materiais, como o pinheiro e as bolas de natal, e espalhá-los por todos os enormes e frios hotéis cosmopolitas ou em torno de colunas dóricas de clubes impessoais repletos de cansados, cínicos e velhos cavalheiros; ou em qualquer outro lugar onde o real espírito de Natal tem a menor chance de estar. Mas há também outro modo em que a complexidade comercial moderna devora o coração de uma coisa, enquanto preserva sua casca pintada. E este é o sistema assaz elaborado de dependência da compra e venda, e, assim, do barulho e confusão; e da real desatenção com as novas coisas que poderiam ser feitas ao modo dos antigos Natais.

Normalmente, se tudo fosse normal nos dias de hoje, seria um truísmo dizer que o Natal foi um festival familiar. Mas é agora possível (como tive a sorte ou má sorte de descobrir) ganhar a reputação de paradoxal por simplesmente afirmar que truísmos são verdadeiros. Neste caso, claro, a razão, a única razoável razão, foi religiosa. Tinha a ver com uma família feliz porque era consagrada à Sagrada Família. Mas é perfeitamente verdade que muitos homens viram o fato sem especialmente sentirem a razão. Quando dizemos que a raiz foi religiosa, não queremos dizer que Sam Weller estava concentrado em valores teológicos quando disse a Fat Boy para “por um pouco de Natal” em algum objeto, provavelmente comestível. Não queremos dizer que Fat Boy teve um êxtase de contemplação mística, como um monge ao ter uma visão. Não queremos dizer que Bob Cratchit defendia o ponche ao dizer que estava apenas observando o vinho quando este era amarelo; ou que Tiny Tim citou Timothy. Apenas queremos dizer que eles, incluindo o autor, teriam confessado humilde e entusiasticamente que havia alguém muito anterior ao Sr. Scrooge, que poderia ser considerado o Fundador da Festa. Mas, de qualquer forma, qualquer que seja a razão, todos teriam concordado sobre o resultado. A festa do Sr. Wardle centrava-se na família do Sr. Wardle; e, ainda assim, porque as românticas sombras do Sr. Winkle e do Sr. Snodgrass ameaçavam a dividi-la para a formação de outras famílias.[1]

O período natalino é doméstico; e por esta razão a maioria das pessoas se preparam para ele apertando-se em ônibus, esperando em filas, correndo pelos metrôs, comprimindo-se em casas de chá, e imaginando quando ou se vão chegar em casa algum dia. Não sei se alguns não desaparecem para sempre na seção de brinquedos ou simplesmente se deitam e morrem nas casas de chá; mas pelas suas aparências, isto é muito possível. Exatamente antes do grande festival do lar, toda a população parece ter se tornado desabrigada. É o supremo triunfo da civilização industrial que, nas enormes cidades que parecem ter casas em excesso, há uma desesperada falta de moradia. Muito tempo atrás, grande número de nossos pobres se tornaram nômades. Nós até confessamos o fato; pois falamos deles como árabes das ruas. Mas essa instituição doméstica, na sua presente fase irônica, foi além de tal anormalidade normal. A festa da família transformou tanto o rico quanto o pobre em vagabundos. Eles estão tão espalhados no confuso labirinto de nosso tráfego e de nosso comércio, que não podem, algumas vezes, sequer chegar a uma casa de chá; seria indelicado, claro, mencionar uma taverna. Eles têm dificuldade em se aglomerar em seus hotéis, quanto mais em se separar e chegar a suas casas. Tenho em mente o contrário da irreverência quando digo que o único ponto de semelhança entre eles e a família natalina arquetípica é que não há espaço para eles na estalagem.

Ora, o Natal é feito de um belo e intencional paradoxo; que o nascimento do desabrigado deve ser comemorado em todos os lares. Mas o outro tipo de paradoxo não é intencional e não é certamente belo. É mal o suficiente para que não possamos desnudar a tragédia da pobreza. É suficiente mal que o nascimento do desabrigado, celebrado no lar e no altar, deva às vezes coincidir com a morte de desabrigados em asilos e favelas. Mas não precisamos regozijar neste desassossego universal que atinge ricos e pobres igualmente; e me parece que nesta questão precisamos de uma reforma do moderno Natal.

Não emitirei outro brilho de paradoxo ao observar que o Natal ocorre no inverno.[2] Isto é, ele não é somente a festa dedicada à domesticidade, mas é colocada deliberadamente sob condições em que é muito mais desconfortável correr por aí do que ficar em casa. Mas sob as complicadas condições das modernas convenções e conveniências, surge este mais prático e mais desagradável tipo de paradoxo. As pessoas têm de correr para lá e para cá por umas poucas semanas, mesmo que seja para ficarem em casa por umas poucas horas. A velha e saudável idéia de tais festivais de inverno era esta: que as pessoas estando fechadas e sitiadas pelo clima se voltavam para seus próprios recursos; ou, em outras palavras, tinham a oportunidade de mostrar se havia algo em seu interior. Não é seguro que a reputação de nossos mais modernos e elegantes caça-prazeres sobreviveria ao teste. Algumas terríveis revelações seriam feitas de algumas figuras favoritas da sociedade, se elas fossem isoladas do poder da máquina e do dinheiro. Elas estão muito acostumadas a ter tudo nas mãos; e mesmo quando vão aos mais recentes bailes dançantes americanos, parece que só os músicos negros dançam. De qualquer forma, para a média da saudável humanidade acredito que este isolamento de todas estas conexões mecânicas seria um alento e um despertar. No presente, elas são sempre acusadas de meramente se divertirem; mas elas não estão fazendo algo tão nobre ou compatível à sua dignidade humana. Elas, em sua maioria, já não podem se divertir; estão acostumadas demais de que outros as divirtam.

O Natal deve ser criativo. Dizem-nos, mesmo os que o prezam mais, que ele é principalmente precioso para preservar antigos costumes e antiquados jogos. Ele é realmente valioso para ambos estes admiráveis propósitos. Mas no sentido a que estou me referindo, pode ser novamente possível torcer a verdade. Não é que o Natal real deva criar coisas antigas, mas coisas novas. Ele poderia, por exemplo, criar novos jogos, se as pessoas fossem realmente levadas a inventar seus próprios jogos. A maioria dos antigos jogos começava com o uso de ferramentas comuns ou peças do mobiliário. Assim, as próprias regras do tênis se baseiam na estrutura do antigo pátio de estalagem. Assim, acredita-se, as estacas do cricket foram originalmente somente as três pernas do tamborete de tirador de leite. Ora, poderíamos inventar novas coisas desse tipo, se lembrássemos quem é a mãe da invenção. Quão prazeroso seria começar um jogo em que marcássemos ponto por acertar o porta-guarda-chuva ou o carrinho porta-refeição, ou mesmo o hospedeiro ou a hospedeira; claro, com um projétil de material leve e macio. As crianças que têm sorte suficiente de ficarem sozinhas no berço inventam não somente jogos completos, mas dramas e histórias de vida completos; elas inventam línguas secretas; conduzem laboriosamente revistas de família. Este é o tipo de espírito criativo que queremos no mundo moderno; queremos tanto no sentido de desejar quanto no sentido de sentir a falta. Se o Natal pudesse se tornar mais doméstico, creio que haveria um vasto aumento do real espírito de Natal; do espírito da Criança. Mas entregando-nos a este sonho, devemos, uma vez mais, inverter a convenção corrente em uma espécie de paradoxo. É verdade, em certo sentido, que o Natal é o tempo em que as portas devam ser abertas. Mas eu mandaria fechar as portas no Natal, ou pelo menos um pouco antes do Natal; e então o mundo veria do que somos capazes.

Não posso deixar de lembrar, com um certo sorriso, que numa página anterior e mais controversa deste livro eu mencionei uma senhora que estremeceu com a idéia das coisas perpetradas por mim e pelos de minha religião por trás das portas. Mas minha memória está suavizada pela distância e pelo assunto presente, e sinto o oposto de uma controvérsia. Espero que aquela senhora, e todo o seu modo de pensar, tenha também a sabedoria de fechar suas portas; e, assim, que ela descubra que somente quando todas as portas estão fechadas é que a melhor coisa será encontrada lá dentro. Se eles forem puritanos, que professam uma religião baseada apenas na Bíblica, que eles sejam, uma vez, uma Família da Bíblia. Se eles forem pagãos, que não aceitam nada exceto a festa de inverno, que eles sejam, pelo menos, uma família em festa. A discordância ou desconforto de que os modernos críticos reclamam, não são devidos a que o fogo místico ainda queima, mas que ele já esfriou. É porque os frios fragmentos de uma coisa antigamente viva são desajeitadamente agrupados. Brinquedos de Natal estão dançando sem harmonia perante tios graves e pagãos que prefeririam estar jogando golfe. Mas isto não altera o fato de que eles poderiam se tornar mais brilhantes e mais inteligentes se soubessem como brincar com os brinquedos; e eles são muito aborrecidos com o golfe. Seu tédio é apenas o último produto mortal do processo mecânico dos esportes organizados e profissionais, naquele rígido mundo de rotina fora de casa. Quando eram crianças, por trás das portas da casa, é provável que quase nenhum deles tivesse sonhos acordados e dramas não escritos que pertencessem a eles como Hamlet pertenceu a Shakespeare ou Pickwick a Dickens. Quão mais excitante seria se Tio Henry, ao invés de descrever em detalhes todas as tacadas com que ele se livrou do banco de areia, dissesse francamente que ele estivera numa viagem ao fim do mundo e capturara a Grande Serpente do Mar. Quão mais intelectualmente verdadeira seria a conversa de Tio William se, ao invés de nos dizer de quanto ele reduziu seu handcap, ele pudesse ainda dizer com convicção que ele era o Rei das Ilhas Canguru, ou o Chefe dos Pele-Vermelhas. Essas coisas, saídas desde dentro, eram quase todas puro espírito humano; e não é normal que a inspiração delas deva ser tão completamente esmagada por coisas desde fora. Que não se suponha por um momento que eu também esteja dentre os tiranos da terra, que imporia meus próprios gostos, ou obrigaria todas as crianças a jogar meus próprios jogos. Não desrespeito o jogo de golfe; é um jogo admirável. Eu já o joguei; ou melhor, eu já brinquei com ele, o que é geralmente considerado o exato oposto de jogar. Deixemos evidentemente que os praticantes do golfe joguem golfe e mesmo os organizadores o organizem, se sua única concepção de um órgão é algo como um realejo.[3] Deixem-nos jogar golfe dia após dia; deixem-nos jogar golfe por trezentos e sessenta e quatro dias, e noites também, com bolas banhadas em tinta luminosa, a fim de serem vistas no escuro. Mas que exista uma noite que as coisas brilhem desde dentro: e um dia que os homens procurem por tudo que está enterrado em si mesmos, e descubram – no lugar onde ele está realmente escondido, por trás de portões trancados e janelas cerradas, por trás de portas três vezes trancadas e aferrolhadas – o espírito de liberdade.


[1] Sam Weller, Fat Boy, Wardle, Winkle e Snodgrass são personagens de Dickens nos Pickwicky Papers e Bob Cratchit, Tiny Tim e o Sr. Scrooge em Christmas Carol. (N. do T.)

[2] No hemisfério norte. (N. do T.)

[3] Barrel-organ em inglês. (N. do T.)

18/12/2010

TESOURO DE EXEMPLOS: DEUS RECOMPENSA OS SACRIFÍCIOS (Principalmente no Natal do Senhor)

Do livro Tesouro de Exemplos

Nota do blog: Depois do CVII, a Igreja já não prega (ou dificilmente prega) que o período de Natal é um período de penitências. Já não explica aos fiéis o significado da cor roxa dos paramentos do padre (se é que o padre usa tais paramentos). Esta historinha resgata esta verdade e nos dá esperança para que façamos nossos pedidos para Nosso Senhor; especialmente aquele pedido especial, para que Ele nasça em nossos corações no dia de Natal. Com este texto, este blog deseja a todos os seus leitores um feliz e santo Natal. Que o ano litúrgico que começou com este Advento seja um ano de conversão de todos ao catolicismo, de conversão de todos à única Igreja que salva.

Os sacrifícios escolhidos voluntàriamente fazem que Deus seja generoso e bom para conosco. Os pequenos presentes que lhe oferecemos espontaneamente exercem grande, irresistível poder sobre ele. Forçado então pela bondade do seu coração, Deus, que não se deixa vencer em generosidade, não se cansa de cumular de bênçãos aqueles que se mostram generosos para com ele.

A propósito o seguinte exemplo:

Num colégio de Friburgo, na Suíça, achava-se, poucos anos faz, uma menina que fazia extraordinários progressos nos estudos, e sentia-se feliz.

Certo dia, recebeu a superiora do Colégio uma carta do pai da criança, comunicando-lhe que, por dificuldades financeiras, não lhe era possível manter a filha no Colégio por mais tempo

Que fez a superiora? Mandou chamar a menina e disse-lhe:

-- Minha filha, uma notícia bem desagradável. Teu pai acaba de escrever-me que se acha em grandes dificuldades e que talvez seja obrigado a retirar-te do Colégio.

A menina, muito aflita, pôs-se a chorar e dizer:

-- Madre, que será de mim? Ajudai-me, Madre, ajudai-me! Dizei-me o que devo fazer.

-- Minha filha (disse a superiora muito comovida), tu podes modificar tudo isso. Sabes que dentro de algumas semanas teremos o santo Natal; sabes, igualmente, que até lá temos todos os dias a devoção ao Menino Jesus, não é?

-- Sim, Madre. . .

-- Pois bem; faze um fervoroso pedido diariamente ao Menino Jesus, para que ele te conserve aqui e oferece-lhe alguns pequenos sacrifícios. Verás que Jesus não rejeitará os teus pedidos.

- Sim, Madre, farei tudo para que Jesus me ouça, e peço também as vossas orações.

A menina, que tinha grande desejo de continuar seus estudos na companhia das Irmãs, cheia de confiança, sentou-se e escreveu ao Menino Jesus uma cartinha. Prometia não só orações fervorosas, mas fazia também o propósito de, por amor de Jesus, abster-se, todos os dias até o Natal, de queijo e frutas, de que gostava muito. E tudo isso para que Deus socorresse seu querido pai e ela pudesse continuar no Colégio.

No dia do Natal achou a superiora debaixo da imagem do Menino Jesus a cartinha da menina. Leu-a e ficou profundamente comovida.

Dois dias depois chegava uma carta do pai, que, entre outras coisas, dizia:

-- Madre, não sei como agradecer a Deus. De modo prodigioso e inesperado veio o auxílio do céu. Minha filha pode continuar aí.

Podemos imaginar a alegria de ambas, a aluna e a Superiora, vendo que a sua confiança em Deus não falhou.

14/12/2010

Chesterton nas bancas do Brasil

Este blog tem a grande alegria de anunciar que a Editora Escala, por meio de sua revista Conhecimento Prático Literatura publicará, a partir de 2011 – edição sim, edição não –, um artigo de Chesterton traduzido por este blog. É uma notícia auspiciosa, pois o grande escritor inglês terá agora um público maior e mais diversificado. Serão artigos principalmente sobre literatura, mas nas mãos de Chesterton todo assunto ganha um matiz todo especial. A fonte principal serão seus artigos de jornal, principalmente os publicados no Illustrated London News.

Este blog teve como seu primeiro post, há longos cinco anos, O Espírito dos Tempos, que é o último parágrafo da introdução de Hereges, já traduzido pelo blog e em preparativos finais de publicação. É grande a satisfação do blogueiro ao encontrar, agora, uma revista semanal de literatura que se aventure a publicar Chesterton no Brasil, em bases permanentes.

Peço aos leitores que rezem para que esta colaboração com a Editora Escala possa render muitos frutos e formar muitos admiradores e leitores de Chesterton no nosso país.

11/12/2010

Contraimpugnantes e um texto essencial

Somos seres de corpo e alma. O que acontece com uma afeta o outro, e vice-versa. Num texto fundamental, Sidney Silveira nos aponta, a partir das deformações auto-impostas no corpo, as doenças da alma. Qual médico de almas, munido de seu conhecimento profundo da filosofia, da teologia e da fé que movia o Doutor Angélico, ele vai diagnosticando os caminhos da doença que deforma o corpo e, sobretudo, que corrói a alma. Mostra ainda que esta doença tem uma só origem, que é o Maligno, príncipe deste mundo.

O único inimigo do Maligno é a Igreja que Cristo nos deixou, a Igreja Católica Apostólica Romana. Só ela tem poder contra ele, só ela pode defender o mundo do ataque em massa do demônio. Quando ela se cala, nos aproximamos do precipício. Ela está calada. Não há condenação alguma, de nada, desde o CVII. Os anátemas foram, parece, anatematizados. Há só uma fala dúbia, uma fala enganosa, que desorienta os bem intencionados e afasta os mais fracos. Se a Igreja não se posicionar incisivamente contra o mundo, e muito rapidamente, estaremos próximos do fim dos tempos. Ainda bem que temos leigos católicos como o Sidney (e seu – e também meu – amigo Nougué) para nos fornecer um pouco de lucidez em meio a tantas trevas.

Que nossos padres, bispos e o Santo Padre Bento XVI tenham forças para bradar aos quatro cantos do mundo os erros que levam à perdição das almas, tenham forças para começar a condenar o mundo, tenham forças para proclamar anátemas!

08/12/2010

Sobre darwinismo e mistério

Gilbert Keith Chesterton
Illustrated London News, 22/08/1920

Nota do blog: Chesterton e Belloc mantiveram anos de polêmica sobre darwinismo e evolução com muitos intelectuais seus contemporâneos, principalmente com H.G. Wells. Pretendo traduzir alguns de seus textos de jornal a este respeito. Começo com o que se segue.

O Sr. Edward Clodd,[1] o distinto estudante de folclore, perguntou-me sobre uma passagem que apareceu neste jornal. Ele escrevia sobre a questão mais ampla do darwinismo, à qual talvez eu trate mais amplamente em outra oportunidade. Mas como a frase que ele citou desta coluna situa-se de alguma forma em separado, talvez seja mais apropriado tratá-la separadamente. As palavras sobre as quais ele deseja maiores explicações são: “Mesmo o evolucionista está agora tímido ao explicar a evolução. Hoje, o temperamento científico é ... dúvida científica da ciência, não dúvida científica da religião.” Ele deseja especialmente saber o que quero dizer com a frase “dúvida científica da ciência”.

Bem, considero que minha afirmação negativa é pelo menos evidente o suficiente; quero dizer que as mais recentes e revolucionárias sugestões científicas não são capazes de levantar nenhuma dúvida sobre qualquer religião. O Livro do Gênesis não diz que Deus formou a substância do mundo a partir de átomos, e assim um cientista não pode ser censurado como um destruidor da Bíblia se ele diz que o mundo é formado não de átomos, mas de elétrons. O Concílio da Igreja que decretou a Co-eternidade do Pai e do Filho não decretou nenhum dogma sobre a Conservação da Energia. Assim, Mme. Curie não poderia ser queimada como herege mesmo se, como alguns afirmam, sua descoberta desestabilizasse nossas idéias sobre a Conservação da Energia. O credo atanasiano não diz que linhas retas paralelas nunca se encontram, assim ele não seria afetado pelo dizer do Professor Einstein, se é que ele o diz, de que elas não são paralelas ou mesmo retas. Os profetas não profetizaram que o homem nunca iria voar e não são, assim, desacreditados quando ele voa. Os santos certamente nunca disseram que não havia uma coisa como a comunicação sem palavras, e assim eles não têm de retratar-se se há uma coisa como a telegrafia sem fio. De muitas formas seria muito mais fácil sustentar que as modernas invenções ratificaram os antigos milagres. Bem, nesses exemplos técnicos e utilitários é ainda verdadeiro dizer que, se eles não desestabilizam doutrinas religiosas, eles também não desestabilizam doutrinas científicas. São as doutrinas sobre gravidade e energia, sobre átomos e éter, sobre a própria estrutura do universo puramente científico que têm sido afetadas ou ameaçadas pela pesquisa puramente científica.

Assim, fui levado a dizer que os homens científicos estão despedaçando seu próprio universo científico. Foi algo relacionado a isto que eu disse ao afirmar que eles não estão agora preocupados prioritariamente com dúvidas sobre religião. A frase (num sentido positivo e não relativo) refere-se, é claro, a várias idéias escriturais e teológicas que supõem-se, corretamente ou não, foram desestabilizadas pela fase anterior da ciência. Alguns parecem imaginar que estou aqui argumentando a favor daquelas doutrinas; mas isso é um equívoco completo. Das doutrinas pré-darwinianas do popular protestantismo inglês, há algumas em que acredito e algumas de que descreio firmemente; mas em nenhuma delas fundamentei minhas observações sobre o darwinismo. Estas são baseadas nas inconsistências e ilogicidades dos próprios darwinistas. Muitos críticos sinceros parecem achar difícil acreditar nisso. Um deles me perguntou, muito incisivamente, porque a asa do morcego não tinha sido divinamente projetada com penas, como a asa da coruja – quase como se eu tivesse voluntariamente recusado a cobrir o animal com uma plumagem própria. Isto é não perceber meu propósito nesta discussão particular. Se eu pessoalmente acredito no design inteligente, é por razões algo mais profundas, que nada têm a ver com asas de morcego; e certamente nunca sonhei em demonstrá-las por meio de asas de morcego. Nunca professei saber as causas de tais coisas. Eu não escrevi um livro intitulado “A Origem das Espécies”. Não conduzi detalhadas pesquisas ou proclamei conclusões dogmáticas. Não sei a verdadeira razão de um morcego não ter penas; apenas sei que Darwin apresentou uma razão falsa para ele ter asas. E quanto mais os darwinistas explicam, mais convencido me torno de que o darwinismo estava errado. Todas as suas explicações ignoram o fato de que o darwinismo supõe que uma característica animal surge inicialmente, não simplesmente num estágio incompleto, mas num estágio quase imperceptível. O membro de um tipo de rato, destinado a fundar a família morcego, diferia de seus irmãos por algum minúsculo traço de membrana; e por que isto o capacitaria a escapar de um massacre de ratos? Ou mesmo admitindo que tal diferença sirva a algum outro propósito, tal só poderia ocorrer por coincidência; e isto significa imaginar um milhão de coincidências para dar conta de cada criatura. Uma providência especial supervisionando os morcegos seria uma noção muito mais racionalista que tal cadeia de acontecimentos fortuitos.

Mas quanto a uma conclusão positiva a ser formulada, acato satisfeito a idéia do Sr. Clodd de “uma área ocupada pelo desconhecido” onde, segundo sua citação de George Eliot, “os homens tornam-se cegos, embora os anjos tudo conheçam”. Mas ainda penso que os darwinistas sendo homens, foram cegos liderando cegos. Deve ter havido uma grandeza real na ciência de Darwin, cuja acumulação detalhada não alego poder julgar. Havia certamente uma grandeza muito real na literatura de Huxley, que consigo julgar bem mais. Ninguém diz que eles não foram grandes homens, mas que cometeram um grande erro. E quanto ao que resta quando este erro é admitido, repito que me satisfaço com a frase do Sr. Clodd. Nem a minha teologia, nem a dos antigos puritanos, tampouco a biologia dos antigos darwinistas; o que resta é mistério – um mistério desconhecido e talvez insondável. O que resta depois de Darwin é exatamente o que existia antes de Darwin – uma escuridão que eu, por razões muito diferentes, acredito ser divina. Mas sendo ou não divina, ela é escura. O que é verdade real, o que realmente aconteceu na variação das criaturas, deve ter sido algo que ainda não se insinuou na imaginação do homem. Eu, por exemplo, ficaria muito mais surpreso se aquela verdade, quando descoberta, não contivesse um grande elemento de evolução. Mas mesmo esta surpresa é possível onde tudo é possível, exceto o que já foi provado ser impossível. E qualquer explicação por meio de uma completa evolução é no momento presente impossível.

Pela primeira vez, em resumo, os agnósticos se tornarão agnósticos. Esta é a minha resposta à questão do Sr. Clodd sobre a “dúvida científica da religião”. A dúvida hoje é uma dúvida real; antes ela era uma inferência de algum dogma, como o darwinismo. Os agnósticos vitorianos não eram realmente agnósticos. No fundo de suas mentes existia um universo materialista, ou pelo menos monista. Mas o universo monista está, por sua vez, se tornando místico, ou no mínimo misterioso. O próximo período de transição será provavelmente de um agnosticismo real, ou de uma ignorância mais ou menos empolgante. E o Sr. Clodd e eu podemos então concordar sobre a fronteira em que os homens são cegos e os anjos tudo conhecem, embora ele possa ficar mais satisfeito com a cegueira dos homens, e eu com o conhecimento dos anjos. Estou até agora do lado dos homens; da grande massa de reverentes e razoáveis seres humanos, que admitiriam mais facilmente estar cegos na escuridão do que nela sobrecarregados com antiquados óculos científicos, junto a um charlatão tentando convencê-los de que eles podem enxergar.



[1] Autor de vários livros sobre religiões, mitos, religião comparada, folclore e filosofia. Também escreveu diversos livros sobre ciência e evolução. (N. do T.)

02/12/2010

Um pouco mais sobre evolução

Abaixo vocês lerão um trecho de uma conferência proferida em novembro de 1981, pelo paleontólogo do Museu Britânico, Colin Patterson, ao Grupo de Discussão sobre Sistemática, composto de biólogos e funcionários do museu interessados em classificação animal; o tema era evolução. Este trecho se encontra no capítulo 14 do extraordinário The Politically Incorret Guide to Science, de Tom Bethel. Vocês verão com que certeza os próprios cientistas tratam do assunto evolução. Contrastem isso com a arrogância com que eles nos vendem suas idéias podres.

Com a palavra o Sr. Patterson:

“Até hoje, sempre quando me levantava para falar sobre um assunto, uma certeza eu tinha: que eu sabia mais sobre tal assunto que qualquer pessoa na audiência, porque eu o tinha estudado.

“Bem, desta vez isto não é verdade. Estou falando sobre dois assuntos, evolucionismo e criacionismo, e acredito poder dizer que nada sei sobre qualquer um deles. Uma das razões pelas quais comecei a desenvolver uma visão anti-evolucionária, bem, digamos não-evolucionária, foi uma percepção repentina que tive ano passado. Por vinte anos pensei estar trabalhando na área da evolução de algum modo. Uma manhã acordei e algo tinha acontecido à noite; ocorreu-me que tinha estudado algo por vinte anos e não havia uma coisa que eu sabia sobre ele. Foi um grande choque perceber que alguém possa estar tão enganado, por tanto tempo.

“Então, ou havia algo errado comigo ou havia algo errado com a teoria evolucionária. Naturalmente, sei que não há nada errado comigo. Assim, nas últimas poucas semanas, tenho tentado apresentar uma questão simples a várias pessoas e grupo de pessoas.

“A questão é: você pode me dizer alguma coisa que você sabe sobre evolução, qualquer coisa que você acredita ser verdade? Apresentei esta questão ao grupo de geólogos do Museu Field de História Natural e a única resposta que tive foi o silêncio. Tentei os membros do Seminário de Morfologia Evolucionária da Universidade de Chicago, um grupo muito prestigioso de evolucionistas, e tudo que consegui foi um longo silêncio, e então, finalmente, uma pessoa disse: Sim, sei uma coisa. ‘Que não se deve ensiná-la no ensino médio.’ [Risadas]”

Precisamos desmascarar essa corja urgentemente, pois eles estão tentando roubar as mentes de nossos filhos com uma crença, uma fé, travestida de ciência. Precisamos fazê-los começar a discutir evolução como uma religião e assim compará-la com a nossa própria. Assim teremos uma igualdade de condições e conseguiremos desmacará-los todos.