12/01/2013

Corção defende Chesterton de um detrator tardio.


Há talvez três anos, tenho sobre minha mesa uma cópia de um capítulo de um livro de Martin Gardner, matemático americano, morto em 2010. O livro me foi mostrado por um amigo e eu tirei cópia de um capítulo onde o autor faz uma crítica tanto a Chesterton quanto a Belloc, em suas posições críticas à teoria da evolução, que Gardner aborda como se fosse uma teoria científica, e uma verdade absoluta. O livro se intitula Fads and Fallacies in the Name of Science, e em português ganhou o título de Manias e Crendices em Nome da Ciência, Ed. Ibrasa, 1960. O capítulo copiado tem o título “Geologia versus Genesis”.  O mote do texto pode ser aquilatado pela frase: “O golpe que esse livro (Origem das Espécies, de Darwin) fez cair sobre a cristandade produziu uma explosão fácil de se compreender.” Gardner parece desconhecer que a adoção dessa “teoria” por parte dos maiores cientistas evolucionistas é exatamente por causa do golpe e não por causa da veracidade da teoria. O golpe é que acreditando-se na “teoria”, que é na verdade uma religião, não é preciso se acreditar no Genesis, fim último do cientificismo. O valor da “teoria” está na exclusão do Genesis. Mas isso eu já abordei em Por que a academia adota a Evolução?.

No que diz respeito a Belloc e Chesterton, Gardner começa por se referir ao grande debate de Belloc e Wells ficando, claro, do lado de Wells. Inclui aí também Chesterton e sua resposta ao livro de Wells, Outline of History, que se constitui em uma de suas obras-primas, O Homem Eterno. Ao fazer isso, ele diz: “O grande e bom amigo de Belloc, Gilbert Chesterton, raramente tocou na evolução, em seus livros. Quando o fez, sempre escreveu coisas mais ou menos insensatas.” E aí ele fala de O Homem Eterno. A defesa das ideias de Chesterton expressas neste livro, vou deixar para Corção. Quero apenas assinalar que Chesterton escreveu copiosamente contra a teoria da evolução e suas consequências, tanto em livro – A Coisa, por exemplo – quanto em centenas de artigos de jornal. Eu mesmo já pensei em organizar uma coletânea de seus artigos de jornal sobre darwinismo e evolução. Gadner talvez não tivesse bem informado sobre isso.

Mas eis que sou surpreendido por um artigo de jornal de um grande chestertoniano, o maior dos brasileiros: Gustavo Corção. Leio na excelente coletânea, Gustavo Corção Tomista, Org. D. Lourenço Fleichamn, Ed. Permanência, 2012, um artigo intitulado “Um Argumento Infeliz”. Corção comenta uma passagem destacada por Gardner, que supostamente demonstraria as manias e crendices de Chesterton: “Os animais superiores não desenham retratos cada vez melhores; o cão não pinta melhor, no seu estágio avançado, do que em sua forma primitiva de chacal: o cavalo selvagem não foi impressionista, e o cavalo bem tratado não se tornou pós-impressionista... Uma vaca num campo não parece demonstrar nenhum impulso lírico, nem se preocupa comas oportunidades raras de ouvir a cotovia...” Gardner reconhece que Chesterton fala aqui da diferença profunda e essencial que separa os homens dos animais. E para isso, Gadner tem o seguinte contra-argumento: “A resposta simples é que a mesma grande diferença existe também entre um homem e uma criança recém-nascida. A réplica de que a criança se transforma em homem é irrelevante.” Corção, depois de reparar na grande incapacidade de Gardner em perceber que o problema à mão não é de arqueologia ou de etnografia, mas de filosofia, responde: “Não seria esta a resposta de Chesterton ao cientista americano, e sim uma outra, prodigiosamente mais simples. Ele não diria que a grande diferença que existe entre a criança e o homem será vencida quando a criança se transformar em homem. Diria: não existe diferença entre a criança e o homem, a criança é igual, rigorosamente igual ao homem. (...) [Aqueles que subscrevem filosofias nominalistas] consideram apenas aspectos acidentais exteriores, e com eles pretendem especificar o homem, o pássaro e os demais habitantes do universo.” Aponta mais adiante uma outra incapacidade de Gardner: “O cientista americano, preso aos seus hábitos de observador dos fatos empíricos, nem chegou a perceber a que realidade humana, a que definição, se referiam Chesterton e Belloc quando argumentavam contra a filosofia evolucionista.”

Mas no final do artigo de Corção há a emergência do grande chestertoniano que ele é. Ele diz, no último parágrafo: “No fim do capítulo, Martin Gardner lembra aos católicos um excelente conselho tirado de Santo Agostinho, no qual o grande doutor dizia que o cristão deve acautelar-se de falar sobre assuntos científicos que não conheça, porque pode acontecer que algum pagão presente, mais versado no assunto, possa corrigi-lo. Dou o mesmo conselho a Martin Gardner. Descreva os achados das ciências que conhece, mas abstenha-se cuidadosamente de enveredar por caminhos filosóficos, porque pode acontecer que algum leitor menos informado em Astronomia, Geologia, Física, ou Química, tenha estudado alguma coisa de Filosofia, e então perceba, nua e esquálida, a miséria da improvisada filosofia do cientista.”

Eis aí a resposta que eu gostaria de ter dado a Gardner!

Agradeço a Deus por nos ter dado um intelectual como Corção.

Nenhum comentário: