11/09/2005

Cidadania Empresarial: Um Imposto Disfarçado

Richard Teather


Responsabilidade Social Corporativa é o novo campo que uniu uma variedade de grupos de ativistas, incluindo ambientalistas, defensores dos pobres, instituições de caridade para o Terceiro Mundo e sindicatos, num clamor coletivo para que os empresários apóiem sua agenda. Esses ativistas se encontram até, em raras oportunidades, entre proeminentes membros da comunidade empresarial.

Caridade realizada por empresários tem uma longa história, apesar de que, no caso de grandes corporações, com grande número de acionistas, essa atitude carregue o risco moral de executivos comprarem respeitabilidade social com o dinheiro alheio. Uma posição moral e socialmente superior seria os acionistas receberem seus dividendos e eles próprios apoiarem ações de caridade.

No entanto, Responsabilidade Social Corporativa é considerada mais do que isso: associada ao conceito de “Cidadania Empresarial”, ela requer que todo o conjunto de ações da companhia seja executado com um olho em seu impacto social; no ambiente, nos empregados e nas “comunidades” locais e globais.

“Cidadania Empresarial” é claramente um falso conceito; uma companhia é uma entidade legal, não uma pessoa, e não pode ter crenças e princípios morais que a faça um cidadão em qualquer aspecto significativo. Ao contrário, essas crenças e princípios residem nas pessoas reais; nos acionistas da companhia, nos empregados, nos clientes e, de maneira mais influente, nos dirigentes da empresa. Cidadania Empresarial, portanto, carrega os mesmos riscos morais que a caridade empresarial; ela é um processo através do qual os diretores da companhia impõem seus princípios morais aos outros.

Ironicamente, um novo argumento tem sido levantado em apoio à Responsabilidade Social Corporativa, que explica muito da sua aprovação pelo setor empresarial. Como as companhias competem por capital, por atrair e manter recursos humanos e por comercializar produtos, aqueles que são considerados apoiadores dos valores e objetivos dos investidores, trabalhadores e consumidores terão uma vantagem comercial.

Algo disso já tem sido visto (Ben & Jerry’s nos EUA e Body Shop, uma cadeia de cosmésticos que se anuncia como uma empresa com preocupações ambientais, na Inglaterra.), mas os proponentes da Responsabilidade Social Corporativa afirmam que a crescente consciência do público sobre as questões sociais e ambientais levará essa prática, ainda localizada, a se generalizar.

Como um bom liberal e defensor do auto-interesse esclarecido, posso apoiar a Responsabilidade Social Corporativa nesse sentido. Posso até aceitar que haja um papel para os grupos de pressão na promoção do esclarecimento (desde que os executivos não se esqueçam de verificar se a suposta demanda realmente exista).

Entretanto, os ativistas, apoiados por governos (particularmente na Europa), vão além disso. Se as companhias não parecem dispostas a agir da maneira considerada adequada, então serão forçadas a fazê-lo (o que um colega, Bill Maugham, costuma chamar da escola de governo “coopere ou então ...”).

A força pode vir da lei “dura” (legislação ou limitações regulamentares) ou da lei “flexível” (tal como códigos de conduta voluntários), mas mesmo esta é somente adotada sob a ameaça da legislação. O efeito é o mesmo; companhias são forçadas a executarem ações que elas não acreditam serem comercialmente justificáveis.

Os defensores da Responsabilidade Social Corporativa dizem freqüentemente que isso é meramente uma versão atual da oposição à escravidão ou à poluição dos rios, práticas supostamente adoradas pelo capitalismo do século XIX. Isso é incorreto, pois, tudo isso seria (ou foi) resolvido pelo auto-interesse esclarecido operando sob o domínio da lei, com a proteção para os direitos de propriedade (i.e. dentro do mercado livre propriamente definido).

Mesmo a escravidão foi denunciada por Adam Smith utilizando argumentos econômicos racionais e na Inglaterra ela foi declarada inválida no século XVIII por não obedecer às condições contratuais do direito consuetudinário.

A negação das liberdades fundamentais, ou a produção de danos incontestáveis, são, portanto, evitadas por regras aceitas há muito como sendo os fundamentos do livre mercado. (A questão particular de companhias operando em países sem um sistema legal ou de proteção dos direitos fundamentais de propriedade é um assunto diverso que pretendo abordar num artigo posterior.)


Ineficiência Econômica


O primeiro problema com a Responsabilidade Social Corporativa é que ela é economicamente ineficiente. Num mercado livre, as empresas maximizam seus lucros deslocando recursos de aplicações menos valorizadas para as mais valorizadas, provendo o que os consumidores desejam. Em contraste, se as ações são forçadas por regulamentação, então os governos exigem que recursos sejam gastos em serviços que o público não valoriza, ou que não valoriza tanto que voluntariamente pague seus custos totais.

Os recursos são, então, desviados para resultados de menor valor, levando a uma redução geral do bem-estar. Isso é feito em benefício de políticos, burocratas ou seus grupos de apoio.

Mas isso envolve mais do que Economia; há um princípio democrático fundamental em risco. O mercado é essencialmente uma democracia totalmente participativa, no verdadeiro sentido ateniense. Quase todos os cidadãos estão envolvidos no mercado e suas escolhas e preferências influenciam os produtos oferecidos. Se o público realmente deseja os supostos benefícios oferecidos pela agenda da Responsabilidade Social Corporativa, no sentido de estar preparado a pagar por ela, então o mercado irá, sem demora, provê-los.

Em contraste, governos atuais estão, nas melhores democracias representativas, abertos a influências indevidas de grupos de interesse cuja representatividade é pífia (Num recente artigo no Salisbury Review londrino, mostrei que, nas últimas eleições gerais na Inglaterra, os não votantes foram o maior grupo em quase 80% das regiões eleitorais).

A escolha é, portanto, entre uma perspectiva baseada no mercado, que oferece o que as pessoas desejam, e uma diretiva governamental sob a qual os valores de uma minoria são impostos ao público em geral. E pior ainda, muitas das questões que vem à tona no debate sobre a Responsabilidade Social Corporativa, particularmente as relativas ao ambientalismo, são aquelas nas quais uma influente e relativamente afluente classe média impõe o alto custo de sua agenda sobre os trabalhadores que não a desejam e não podem sustentá-la.


Imposto Stealth?


A paisagem política tem se caracterizado recentemente por uma benéfica má vontade do eleitorado com relação a aumento de impostos. No entanto, os políticos obviamente ainda procuram aumentar seu poder e influência, o que demanda dinheiro. Assim, aumentos de impostos têm ocorrido através de métodos ocultos, seja na forma de novos impostos setoriais sobre a venda de produtos, seja com mudanças técnicas na lei fiscal.

O governo socialista de Blair, na Inglaterra, tem uma particular habilidade com tais métodos, e seus esforços têm sido chamados pela oposição conservadora como “impostos stealth” (supostamente similares ao bombardeiro stealth americano, eles não aparecem no “radar” do eleitorado).

O perigo é que a agenda da Responsabilidade Social Corporativa, caso se afaste do modelo do auto-interesse esclarecido e voluntário, torne-se outra forma de imposto.

Governos podem atingir seus objetivos (e satisfazer seus clientes) aumentando impostos e pagando pelas mudanças que eles desejem, ou alternativamente, eles podem atingir o mesmo resultado por meio de regulamentações. Se há resistência ao aumento de impostos, os políticos tendem a se voltarem para esse último procedimento.

Isso levanta uma discussão econômica adicional sobre os lugares corretos e mais eficientes sobre os quais essa carga cairá, mas isso terá que ser deixado para um outro artigo.


Conclusão


A economia, e a sociedade na qual ela opera, se defronta com uma escolha. Ela pode seguir o princípio do auto-interesse esclarecido dentro de um sistema legal, que melhor assegura os reais objetivos da população (i.e. aqueles que ela deseja a ponto de estar preparada para pagar por eles). Por outro lado, pode-se trilhar o caminho da regulamentação, pelo qual os políticos e os mais barulhentos grupos de interesse impõem seus pontos de vista aos outros.

Por mais instruídos e desinteressados que sejam esses grupos de interesses especiais, sei em qual sociedade eu preferiria viver.






Este artigo foi publicado na página do Ludwig von Mises Institute em 05/08/2003. Richard Teather é professor de Legislação Fiscal na Universidade Bournemouth, Inglaterra.

Um comentário:

Cláudia Vau disse...

Um artigo "do contra" que, diria eu, não acrescenta muito nem benificia quem procura posicionar-se relativamente à questão da responsabilidade social.
Há casos e casos, mas dizer que apenas a lei molda a actuação das empresas é tapar o sol com a peneira!
Visite o meu blog - é precisamente sobre este tema.
Já agora, tenha um bom ano.