J.-K. Huysmans
A Caminho, primeiro romance
da trilogia
autobiográfica do autor
É, a princípio, o cântico de exultação, a saudação jubilosa
do ser ainda pequeno, balbuciando carícias respeitosas, acariciando com
palavras de doçura, com meiguices de criança que procura amimar a sua mãe; é a Salve
Regina, Mater misericordiae, vita, dulcedo et spes nostra, salve.
Depois esta alma, tão cândida, tão simplesmente feliz, cresce
e, conhecendo as derrotas voluntárias do pensamento, as perdas repetidas das
faltas, ela junta as mãos e pede, soluçando, uma ajuda. Ela já não adora
sorrindo, mas chorando; é o Ad te clamamos exsules filii Hevae; ad te suspiramos
gementes et flentes in hac lacrymarum vale.
Enfim chega a velhice; a alma jaz, atormentada pela saudade
dos avisos desdenhados, pelo pesar das graças perdidas; e, tornando-se mais
lamentosa, mais fraca, ela espanta-se diante da sua libertação, diante da destruição
da sua prisão carnal que sente próxima; então pensa na eterna inanição daqueles
a quem o Juiz condena, e implora de joelhos a Advogada da terra, a Protetora do
céu; é o Eia ergo Advocata mostra, illos tuos misericordes oculos
ad nos converte et Jesum benedictum fructum ventris tui nobis post hoc
exsilium ostende.
E a esta quintessência de oração que Pedro de Compostela ou
Hermann Contract compôs, São Bernardo, num acesso de hiperdulia, ajunta as três
invocações do fim: O clemens, o pia, o dulcis Virgo Maria.
Elas selam a inimitável prosa, como com um tríplice sinete, por estes três
gritos de amor que reconduzem o hino à adoração acariciadora do seu começo.
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