Leio no FratresInUnun uma intervenção de Frei Charles Morerod, pela foto um sujeito muito simpático, sobre o recente decreto da Santa Sé sobre a reforma dos estudos filosóficos em instituições eclesiásticas. Notícia alvissareira, dadas as informações que temos do nível destes estudos nos seminários espalhados pelo mundo.
Frei Morerod analisa, em sua intervenção, a importância da filosofia para o estudo da teologia. Não sou filósofo e não li o decreto, mas algumas coisas me parecem merecer um comentário.
A primeira delas é que, segundo Frei Morerod: “O Decreto de Reforma dos estudos eclesiásticos de Filosofia convida os filósofos a ‘recuperar com força a vocação original da filosofia: a busca do verdadeiro e sua dimensão sapiencial e metafísica” (§ 3).’” Duas observações são oportunas: um decreto não convida, decreta, senão não seria um decreto e sim um convite. Além disso, do jeito que estão as coisas, como convencer os filósofos modernos de que existe o verdadeiro? Aqui não basta um convite, mesmo que seja da Santa Sé.
A primeira delas é que, segundo Frei Morerod: “O Decreto de Reforma dos estudos eclesiásticos de Filosofia convida os filósofos a ‘recuperar com força a vocação original da filosofia: a busca do verdadeiro e sua dimensão sapiencial e metafísica” (§ 3).’” Duas observações são oportunas: um decreto não convida, decreta, senão não seria um decreto e sim um convite. Além disso, do jeito que estão as coisas, como convencer os filósofos modernos de que existe o verdadeiro? Aqui não basta um convite, mesmo que seja da Santa Sé.
No final da intervenção, Frei Morerod parece mudar de assunto: da teologia para a catequese e aí as coisas se complicam enormemente. Ele diz: “Por exemplo, a catequese é frequentemente confrontada com perguntas sobre a relação entre a evolução das espécies e a estória bíblica da criação. As tentativas de passar diretamente da teologia à biologia são pouco frutuosas. É necessária uma mediação filosófica.” Duas observações se impõem. A primeira delas é que a evolução das espécies não pode se confrontar com a catequese, pois esta teoria não passa de um “wishfull thinking”. Esta teoria é apenas especulação e não ciência (Ver aqui, aqui e aqui). Assim, toda vez que ela tentar se confrontar com a catequese, o catequista tem de solicitar provas desta teoria e só depois discutir alguma coisa.[1] A segunda observação a ser feita é que se fatos – fatos reais e não ciência podre – se contrapusessem à catequese não haveria mediação filosófica que resolvesse a questão. Ocorre que nenhum fato científico verdadeiro, nestes dois milênios de catolicismo, se contrapôs à catequese católica. Na verdade, o que se precisa são de exegetas muito bem preparados para nos orientar – a nós pobres católicos leigos – em como interpretar as passagens bíblicas segundo a Tradição da Igreja. Ou seja, a Igreja não pode cair nesta esparrela do cientificismo moderno (sobre cientificismo ver aqui); para lutar contra isto temos a Tradição.
Frei Morerod se equivoca ainda em dizer: “O catequista que trata da evolução é tentado a desqualificar a Bíblia como Palavra de Deus, ou a fechar-se num fundamentalismo que nega a verdade das descobertas científicas.” O Frei coloca a teoria da evolução como descoberta científica e isto ela nunca foi. Além do mais, a evolução não deve ser tema de catequese, a meu ver. Tenho aqui em mãos o Catecismo Maior de São Pio X e não vejo nada nele que toca na questão da evolução. Ou seja, não podemos admitir que uma conjectura científica muito pouco lógica possa se confrontar com verdades eternas da Doutrina Católica.
A parte filosófica da intervenção do Frei Morerod parece-me fraca. Dou um exemplo apenas, já que meus conhecimentos filosóficos são muito modestos. O frei diz a certa altura: “Um problema crucial para a teologia é a possibilidade de falar de Deus por meio de palavras plasmadas para descrever o mundo: não temos outras expressões à nossa disposição.” Aqui, sinto o (mau) cheiro de Wittgenstein e outros filósofos da linguagem, que chegaram à brilhante conclusão de que as palavras não servem para nada. Eles não notaram, claro, que para chegarem a esta conclusão usaram as famigeradas ... palavras. Ora, se Deus mesmo feito homem, se a Segunda Pessoa da Trindade, quando na terra, se o Logos Divino, usou exatamente “as palavras plasmadas para descrever o mundo” para nos ensinar tudo sobre Seu Pai, sobre a relação de Deus com o homem e, sobretudo, sobre a relação do homem com Deus, por que então o homem moderno acha que as palavras já não são suficientes para a teologia, que é o discurso sobre Deus? Se Deus as considera suficiente, não seria um orgulho extremo achá-las algo defeituosas? Todavia, deixo este assunto para gente mais competente que eu, gente do talante do tomista Sidney Silveira do ContraImpugnantes.
Como última observação, fico a imaginar se não seria importante a Santa Sé se lembrar – não sei se o novo decreto faz menção a isto – da monumental encíclica de Leão XIII, Aeterni Patris, sobre o estudo da filosofia tomista nos seminários de então. Desta encíclica retiro o trecho que encerrará este post: “Se refletirmos sobre a maldade de nossos tempos e entendermos bem a razão do que acontece em campo público e privado, descobriremos certamente que a causa geradora dos males que nos afligem e nos ameaçam está nas doutrinas culpadas que foram ensinadas sobre as realidades divinas e humanas, primeiramente pelas escolas filosóficas e, depois, se infiltraram em todas as camadas da sociedade e foram geralmente acolhidas.” (Grifo meu)
[1] Lembro-me aqui de uma passagem de Três Alqueires e Uma Vaca, de Gustavo Corção: “O evolucionismo é uma doutrina pela qual o universo irá até as últimas conseqüências, obstinadamente, como o esquartejador. Os gênios das espécies vivem a esquartejar porcos e cavalos, e os praticantes dessa esquisita religião são indivíduos que estão impacientes por serem também esquartejados.” (Grifo meu)
5 comentários:
Prezado Professor Angueth
Salve Maria
Vim dizer que estou rezando por sua recuperação e que desejo sua saúde. Porém tenho uma pergunta que seria pertinente responder:
A doutrina de Jacques Bossuet sobre o estado e os reis é ortodoxa? Eu achei suas teses um tanto protestantes, embora ele fosse ardente oponente dos tais. Fico grato pela resposta.
Dominus Tecum
Mateus G. M. F. Tibúrcio
Caro Mateus,
Salve Maria!
Não conheço a obra de Bossuet. Sei que ele foi uma figura controvertida, nada mais. Fala-se até que ele foi simpático ao jansenismo. Há um verbete sobre ele na Enciclopédia Católica, em inglês: http://www.newadvent.org/cathen/02698b.htm .
Deus lhe pague por suas orações.
Em JMJ.
Prezado Prof. Angueth, salve Maria!
O senhor já leu Dom Quixote? Se sim, poderia me falar ou dar seu parecer sobre a obra Dom Quixote de La Mancha de Miguel de Cervantes?
Tenho algumas ressalvas com relação a esse livro, parece-me que foi escrito com intenção de ridicularizar a cavalaria, ou mais propriamente e com sutileza, a Igreja.
Que Deus lhe ajude em sua recuperação.
Abraço.
Prezado Professor,
Desejo que Deus o faça muito saudável.
A Revista Guia Pratico de Teologia é Trimestral? Pois o numero três ainda não chegou em Fortaleza.
Caro Prof. Francisco,
Salve Maria!
Também não recebi nenhuma notícia da publicação do no. 3. Não tenho certeza da periodicidade dela, mas penso que seja trimestral. Caso saiba de alguma coisa, publico no blog.
Ad Iesum per Mariam.
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