09/10/2010

Um impasse apenas aparente

Impasse. Assim fica difícil ser católico.

Quando o aluno precisa ensinar o professor, a instituição de ensino perde a credibilidade. Quando o catequizando precisa catequizar o catequista, a Igreja perde a sua credibilidade. É preciso tomar mais cuidado ao ensinar, publicamente, o vigário a rezar! As ovelhas que estão fora do rebanho podem decidir que estão melhor sozinhas do que ficarem mal acompanhadas na Igreja que perdeu sua missão, competência e identidade. Em JMS

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Recebi o comentário acima no post CARTA ABERTA A DOM SABURIDO. OU, ENSINANDO O VIGÁRIO A REZAR. OU, AINDA, UMA CORREÇÃO FRATERNA e passo a respondê-lo.

Há um erro de princípio no raciocínio do leitor: a Igreja não é como uma instituição normal de ensino. O Magistério da Igreja é exercido pelo Papa e seus Bispos, mas nem tudo que o Papa e os Bispos falam está de acordo com este Magistério; apenas aquilo que está de acordo com a Tradição que sempre foi aceita pela Igreja. A regra da Fé verdadeira é a de São Vicente de Lerins: “quod ubique, quod semper, quod ab omnibus.” Este santo dizia no século V: “Na Igreja Católica é preciso pôr o maior cuidado para manter o que se crê em todas as partes, sempre e por todos. Eis o que é verdadeira e propriamente católico ...” [Comonitório, Cap. II, Editora Permanência, 2010]

Nós católicos não estamos numa escolinha em que tudo o que os professores ensinam deve ser considerado a última de todas as verdades. Ainda no século IV, os bispos arianos, em grande número, ensinavam que Nosso Senhor não era um ser incriado; para os arianos, ele era um ser muito perfeito, mas era uma criatura de Deus. Estes bispos eram seguidores do bispo Ário, o terrível inimigo da Igreja, contra quem lutou o grande Santo Atanásio. Os fiéis que sabiam que não estávamos numa simples escolinha, lutaram contra os bispos arianos e salvaram, com Santo Atanásio, a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo. Entre os séculos IX e XI, muitos bispos do sul da França se tornaram cátaros, uma poderosa heresia que quase destruiu a Igreja. Esta heresia só terminou com uma luta armada muito sangrenta. Quem se contrapôs aos cátaros estava defendendo a Fé verdadeira: “quod ubique, quod semper, quod ab omnibus.”

Não é novidade para um católico minimamente informado, que a heresia protestante invadiu a Igreja com o Concílio Vaticano II. Há hoje muitos bispos da Igreja que defendem posições que alegrariam Lutero e Calvino. Há hoje uma missa que, embora canonicamente válida na sua forma original, é celebrada, na maioria das vezes, de forma protestantizante. Há padres que celebram a missa nova de forma pia e respeitosa em relação a Nosso Senhor Jesus Cristo. Infelizmente, a maioria não se comporta dessa forma. Assim, há hoje muito o que corrigir, muito o que apontar como erro na prática de padres e bispos. Foi o que fez, e muito bem, Marcos Paulo no post acima referido.

Na Igreja, a correção fraterna sempre foi e sempre será uma eficiente prática, não só para alertar quem propaga um erro de que ele está fazendo algo condenável, mas para alertar quem possa ser influenciado pelo erro de que aquilo não é ensinamento tradicional da Igreja.

Se o leitor anônimo quiser uma amostra de erros cometidos por padres e leigos católicos no Brasil de hoje, leia minha séria de posts Lições das Missas de Paulo VI. Se quiser uma amostra digamos “do momento”, a CNBB, em nota de 8 de outubro de 2010, diz: “A CNBB é um organismo a serviço da comunhão e do diálogo entre os Bispos, de planejamento orgânico da pastoral da Igreja no Brasil, e busca colaborar na edificação de uma sociedade justa, fraterna e solidária.” Ora, a Igreja, nunca, em nenhum lugar, acreditou, pregou, escreveu ou mesmo insinuou que ela tivesse sido constituída por Nosso Senhor, para lutar por uma “uma sociedade justa, fraterna e solidária.” Isso não faz parte de nossa Fé verdadeira. A Igreja foi constituída para ser o único meio universal de salvação da alma humana, nada mais, nada menos que isso. A afirmação da CNBB ficaria bem em qualquer estatuto de loja maçônica ou de partido comunista. Assim, os leigos não podemos deixar de denunciar esta farsa, este erro, esta heresia. Temos a obrigação de corrigir quem está em erro; esta é uma regra de caridade.

O leitor diz ainda que as ovelhas talvez estejam melhor fora, que dentro da Igreja. Ora, mas pensa isso só quem não entende que a Igreja é o Corpo Místico de Nosso Senhor; que é na Igreja, por meio de seus Sacramentos, que jorra a água que, tomada, matará a sede eternamente. Não há outro lugar onde esta Água Viva possa ser encontrada. Assim, ninguém estará melhor fora dela, só porque aqui há pessoas que erram, que propagam heresias, que têm de ser combatidas: extra Ecclesiam nulla salus.

Mais uma vez a metáfora da escolinha não funciona. Se você está numa escola ruim, basta que você mude de escola. Quando se está na Igreja verdadeira, não há opção de mudança. Melhor errar dentro da Igreja – e ser corrigido pelos irmãos católicos – que ter a veleidade de acertar fora dela, onde só há lisonja ao erro.

E só para terminar: quem lhe disse que é fácil ser católico?

5 comentários:

Anônimo disse...

"E só para terminar: quem lhe disse que é fácil ser católico?"

Do jeito que as coisas estão, parece que a Igreja Católica Apostólica Romana no Brasil assumiu que é herética.

Então, o que fazer com esses heréticos?

Gederson disse...

Anônimo, a Igreja Católica Apostólica Romana no Brasil ou em qualquer outro lugar, nunca será herética. O que acontece é que a Igreja no Brasil, esta se assumindo brasileira e laical, deixando de lado a apostolocidade e sua origem romana, mas isto são apenas frutos do mal fadado e enfadonho CVII. Cimas e apostasia... sinais dos tempos...

Anônimo disse...

"A Igreja foi constituída para ser o único meio universal de salvação da alma humana, nada mais, nada menos que isso."

Então, Prof. Angueth, o senhor não acredita no Reinaldo Social de Nosso Senhor Jesus Cristo?

Se a Igreja, tendo influência temporal, não a exercitar, as pedras clamarão. Onde há alguém com sede ou com fome, é Cristo que está lá e precisa ser defendido. Essa ordem foi dada a todos, implicitamete, pelo próprio Jesus Cristo.

Se o senhor acredita que Santo Tomás tinha o direito de usar a lógica para compatibilizar fé e razão, deve conceder à Igreja usar sua influência para que o corpo, que suporta a alma, também tenha saúde.

Em NSJC

Antonio Emilio Angueth de Araujo disse...

Caro anônimo,

Depois de muito pensar, creio que entendi seu comentário: você ficou tocado quando eu disse que a Igreja não está aqui para “construir uma sociedade justa, fraterna e solidária”. Sim, vi agora em que calo eu pisei. Mas, infelizmente, vou repetir o que disse: a Igreja não está aqui para construir uma sociedade justa, fraterna e solidária. Ela está aqui para promover os meios para a salvação das almas, mesmo em condições injustas, de ódio entre os homens e de pouquíssima solidariedade.

Houve um tempo em que os valores da Igreja cobriam, como uma sombra benéfica e refrescante, toda a civilização ocidental; neste tempo os governantes, não a Igreja, construíram uma sociedade que muito se aproximou do Reinado Social de Nosso Senhor Jesus Cristo. A Igreja não estava à frente dos governos, mas havia um sentimento de caridade cristã generalizado. Foi a época em que não havia escravidão no mundo; aliás a única época em que isso aconteceu.

Portanto, a frase da CNBB é de cunho maçônico e comunista, não católico. A Igreja não prega senão a estrita observância da caridade cristã; o resto virá por acréscimo. A CNBB prega o acréscimo, apenas ele.

Talvez seja oportuna esta sugestão: leia este texto aqui.

Anônimo disse...

"Mas, infelizmente, vou repetir o que disse: a Igreja não está aqui para construir uma sociedade justa, fraterna e solidária."

É evidente que eu concordo com o que está dito. Só acrescento que a Igreja é influente e, como tal, não pode perder a oportunidade de influenciar para que o Cristo que está em cada pequenino que sofre seja socorrido. Aqueles pequeninos a que Cristo se referiu.

Marx é outra história. Ele absorveu certas bandeiras de Cristo, mas eliminou Cristo da jogada. Ele agiu como concorrente ou, se quiser, como o Inimigo que se infiltrou.

Então, é preciso não confundir as bandeiras que Marx roubou do Cristianismo com a bandeira humanista ateia de Marx. De fato, se a mensagem de Cristo fosse realmente acolhida, a mensagem de Marx não teria vez na Terra. Mas Cristo, obviamente, vencerá.

Em NSJC