1. Aquele que quer agradar perfeitamente a Deus deve
resplandecer em castidade e em caridade. A castidade abarca os cinco sentidos:
os ouvidos, os olhos, o olfato, o paladar e o tato. A caridade se manifesta de
quatro maneiras. Segundo o Apóstolo, tudo
desculpa, não é suspicaz, tudo espera,
não hesita, tudo sofre, não murmura, tudo suporta,[1] não é impaciente. Estas nove qualidades configuram a perfeição de quem as
possui perfeitamente e se associa, já nesta vida, aos coros angélicos. Por isso
diz o Apóstolo: nossa pátria encontra-se
nos céus.[2] E eu diria que um homem
que vive assim supera em mérito ao anjo, pois o anjo as possui por dignidade e
o homem as alcança por virtude.
2. A criatura racional, para ser ditosa, tem de amar-se a si
mesma e a Deus, o único que pode cobri-la de felicidade. Seu perseguidor e
inimigo trabalha precisamente para corrompê-la em ambas as disposições.
Corrompe e perverte sua disposição corporal mediante o apetite da gula e o fluxo
da luxúria. O asno da carne, agitado por estes dois aguilhões, se lança ao
precipício da morte. Ataca com armas invisíveis a disposição espiritual do
homem e a viola como uma peste dupla: corrompendo-a com o tumor da soberba e a
mácula da avareza. Deste modo, põe a perder toda a massa pela mistura desse fermento[3]
e toma do homem a felicidade que ele perdera.
3. Nesta vida, prestamos nosso acatamento à carne, ao mundo e
ao diabo, ou a Deus. Militamos a favor da carne, quando nos sujeitamos aos
incentivos da gula e acedemos aos estímulos da luxúria. Militamos a favor do
mundo, quando fomentamos nossa desmedida avareza e acariciamos a sublimidade da
fama. Militamos a favor do diabo se invejamos a quem progride no bem e nos
inchamos com espírito de soberba perante Deus. Militamos a favor de Deus se
lutamos humildemente com nossas boas obras e combatemos com espírito vigoroso
contra os espíritos malignos. Cada um deles dispõe de recompensas especiais: a
carne oferece a seus adeptos um prazer momentâneo; o mundo, uma glória fugaz; o
diabo, uma escravidão perpétua; Deus, uma felicidade sem fim. É o único que
prevalece.
[1]
1 Cor 13:7.
[2]
Fil 3:20.
[3]
1 Cor 5:6.
Ver também: Sentenças de São Bernardo, Sentenças de São Bernardo - II e Sentenças de São Bernardo III.
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