Michael J. Matt
The Remnant Magazine
20 de abril de 2012
Tradução autorizada.
Lembra
como a crença católica era descomplicada antes da Igreja ficar “sofisticada”?
Os católicos geralmente aceitavam sem qualquer questionamento, não somente que
Cristo está presente no Sacramento do Altar, mas também que Noé realmente
construiu sua arca, que Jonas passou mesmo três dias dentro de uma baleia e que
o Mar Vermelho de fato se lançou sobre as carruagens do faraó e de seus
cocheiros, varrendo seu exército e com isso salvando o povo escolhido.
Até
os relatos bíblicos acera da Criação apresentavam poucos obstáculos para os
crentes: Deus criou o universo por amor. Ele viu que era bom e desejou
partilhá-lo. Então Ele criou Adão a Sua imagem e semelhança. Ele deu aos nossos
primeiros pais todas as graças, e então testou sua fidelidade a Ele. Eles
falharam no teste e caíram em desgraça, levando junto a natureza. Pecado,
doença e morte passaram a existir no mundo enquanto a serpente se arrastava
para fora do Jardim do Éden.
Até
crianças entendiam que o projeto de Deus havia sido totalmente abalado devido
ao livre arbítrio de Homem em desobedece-Lo. Bebês são capazes de perceber que
Deus não criou doença, sofrimento e morte, mas que estes foram resultado da
desobediência do Homem. O pecado cometido por um homem que andava ao lado de
Deus e que possuía a graça do entendimento trouxe um fim ao Paraíso criado por
Deus.
Os
católicos costumavam aceitar essas coisas pelo que são. Portanto, quando uma
criança era atropelada e morta por um automóvel ao correr atrás de sua bola
pela rua, por exemplo, seu pai não cerrava o punho, o erguia aos céus e culpava
Deus por tê-la “matado”. Não, a criança simplesmente se esqueceu de olhar para
os dois lados. Sua morte estava de acordo com a ordem natural. É por isso que
pais ensinavam a seus filhos as normas de segurança em primeiro lugar, pelo
fato de ser bem possível que pessoas – até mesmo crianças – sofressem ou morressem
antes de sua hora. Com o suicídio se dá o mesmo. Deus não deseja que o homem se
jogue da ponte por sobre as rochas abaixo. Mas Ele o permite, assim como
permite o sofrimento da família desse homem, resultante de sua terrível decisão
de acabar com a própria vida. Deus não “matou” o homem na ponte mais do que
“matou” a menininha que correu atrás de sua bola no meio da rua.
Portanto,
longe de culpar Deus pela existência de sofrimento no mundo, católicos sempre
rezaram pedindo-Lhe proteção em caso de escolhas errôneas de sua parte, ou no
caso de catástrofes naturais, como enchentes, terremotos ou acidentes de
trânsito.
Não
há nenhum grande mistério nisso. Nós imploramos pela intercessão dos santos e
anjos de Deus todos os dias – não que seja provável que Deus mude de ideia e
decida não nos matar naquele momento; mas que Ele, com Sua divina providencia,
intervenha a nosso favor contra a frequentemente brutal mãe natureza. Estas
intervenções celestiais são o que chamamos de milagres. E estes milagres
oferecem provas adicionais de que não estamos sozinhos no mundo; que Deus está
do nosso lado; que Ele não desistiu de nós, depois de nosso primeiro pecado,
prometendo ainda um redentor Que renovaria todas as coisas. E para nos mostrar
que ninguém está imune ao sofrimento trazido ao mundo consequente do pecado de
Adão, Ele mesmo foi crucificado e morto e com isso ofereceu ao homem o sermão definitivo
sobre o sofrimento redentor.
Tudo
a respeito da salvação e de historia do mundo deve ser analisado sobre o prisma
da Queda de Adão e Eva. Pecado original, sofrimento, morte, a Encarnação, o
nascimento de uma Virgem, todos os Sacramentos, a Ressurreição, a Igreja
Católica – tudo isso aconteceu porque Lúcifer não serviu e Adão não obedeceu.
Remova Adão e Eva da história e o Catolicismo passa a ser tão sem sentido
quanto um Deus que criou o sofrimento apenas por criar. Toda a Cristandade
sabia que isso é verdade – Patriarcas, doutores, santos e mártirs ao longo da história.
Isso era assim...
Não
tenho palavras para descrever o quão ultrajado me senti essa semana ao assistir
o Cardeal e Arcebispo de Sydney, Austrália – há rumores de que é um dos poucos
na lista do próximo conclave e um “conservador” extraordinaire – hesitar e depois ser
incisivo em afirmar que Adão e Eva nada mais são que construtos míticos,
personagens fictícios de uma história religiosa contada com propósitos
religiosos. Isso durante um debate entre o Cardeal George Pell e o ateu Richard
Dawkins, transmitido pelo popular programa de televisão australiano Q&A. Disponível em www.youtube.com/watch?v=tD1QHO_AVZA
Claro,
Sua Eminência admitiu que em algum ponto ao longo da escala evolutiva deve ter
havido um “primeiro homem”, mas que esse primeiro homem veio de fato do macaco.
“Os
humanos evoluíram de macacos?” perguntou o incrédulo Tony Jones, apresentador
do debate do Q&A.
“Sim,
provavelmente” replicou Pell “provavelmente – bem, dos neandertais.”
“Mas
o senhor aceita que humanos evoluíram de não-humanos, então qual foi o momento
em que a alma passou a existir?” perguntou Jones.
Cardeal
Pell: “A alma é o principio da vida. A partir do momento em que a alma foi
capaz de se comunicar é que surgiu o primeiro ser humano.”
Jones:
“O senhor está sugerindo a existência do Jardim do Éden com Adão e Eva?”
“Bem,
Adão e Eva são termos que significam ‘vida’ e ‘terra’. Como uma pessoa comum. É
uma bela, sofisticada e mitológica narrativa. Não é ciência. Mas existe para
nos contar duas ou três coisas. Primeiramente, que Deus criou o mundo e o
universo. Em segundo lugar, que a chave para todo o universo são os humanos. E
finalmente, é uma refinadíssima mitologia que tenta nos explicar o mal e o sofrimento
no mundo... É uma historia religiosa contada com propósitos religiosos.”
Sempre
que esses modernistas disformes e de miolo mole são salvos do fogo por um de
nossos clérigos progressistas, de início, me estremeço e depois fico com a
esperança de que o ateu sentado do outro lado da mesa não consiga aproveitar a
deixa. Dawkins não a desperdiçou: “Ah, então, estou curioso para saber”
retrucou o ateu, “Se Adão e Eva nunca existiram, de onde vem o Pecado
Original?”
Exatamente,
Sr. Dawkins! É tão simples que até um ateu entende. Ou o pobre Cardeal acredita
que o Gênesis é uma narrativa mítica por inteiro ou está tão envergonhado por
ele que se sente compelido a fingir que o Gênesis é verdade para impressionar
um palerma como Richard Dawkins. Seja como for, a posição do Cardeal se confronta
não somente com os ensinamentos de 1950 de Pio XII, em Humani Generis #37
(‘pecado original... procede do pecado real cometido pelo indivíduo Adão’), mas
também com os mais recentes ensinamentos católicos encontrados no Catecismo da
Igreja Católica, que cita repetidamente um Adão (e Eva) reais: cf. §374-375,
387, 377, 390, 399, 402-406, 416-417. Então qual é a real posição do Cardeal?
Quem ele imaginou que convenceria com sua baboseira? O ateu reconheceu
imediatamente a gafe teológica da analise do Gênesis; o verdadeiro católico ficou
escandalizado; e o mulçumano saiu andando alegre ao testemunhar mais um líder
católico dissipando o que sobrou da identidade católica.
Mas
o Cardeal não havia terminado. Quando perguntado se ateus podem alcançar o
paraíso, disse mais besteira: “sim, se bons e sinceros e em busca da verdade.”
Mas quando o moderador lhe perguntou novamente, antes de prosseguir com outra
pergunta, “Então o senhor está dizendo que um ateu pode de fato ir para o Paraíso?”
As palavras finais de Pell foram enfáticas: “Com certeza. Com certeza.” (Sim
ele repetiu a afirmação!)
Pell
evidentemente adotou a teoria o “cristão anônimo” de Karl Rahner. Poucos, se
não nenhum, entre os membros da plateia ou entre um milhão de telespectadores do
programa não poderiam ter tido outra impressão senão que, segundo um dos líderes
mais “conservadores” da Igreja Católica do mundo, não é preciso acreditar em
nada para se salvar – ou seja, a fé não é necessária para a salvação! Pode-se
imaginar que contra-testemunho para a Igreja e em relação ao Evangelho isto
significou para vasto número de protestantes devotos que ainda enfatizam o
papel da fé para a salvação, quase tanto quanto os católicos pré-Vaticano II
então faziam.
Mas
o Cardeal ainda não havia terminado. Quando perguntado a respeito do Inferno, ele
adotou a notória esperança de Han Urs von Balthasar de um “Inferno vazio”. Ele
disse que há um julgamento após a morte e sugeriu que talvez alguém como Hitler
possa ir para o Inferno. Mas, novamente, sua palavra final foi esquerdista:
Pell “espera” que ninguém de fato seja eternamente condenado. E o Cardeal não é
louco – ele não esperaria por algo impossível. Então o que será que acontece
com a afirmação de Nosso Senhor de que no dia do julgamento muitos quererão
entrar, mas não poderão? E o que será que aconteceu com os ensinamentos de fide do Concílio de Trento, que dizem
que a graça sobrenatural da fé é a sine
qua non para a justificação? E quanto àquela visão de um Inferno abarrotado
de almas de condenados que Nossa Senhora mostrou aos pastorzinhos de Fátima? Baboseira
mitológica pré-Vaticano II, eu presumo.
Quando
perguntado a respeito do “casamento” gay, Cardeal Pell evocou os usuais clichês
de repúdio ao ódio aos homossexuais, mas continuou com a seguinte lorota: “Nós
acreditamos que o casamento é entre um homem e uma mulher; para a continuidade da
raça humana. Nós acreditamos que o homem e a mulher são feitos um para o outro
espiritualmente, psicologicamente, fisicamente... Mas para dois homossexuais se
casarem? Fazem muito bem e não há razoes para não o fazerem.”
Pode-se
imaginar que o Cardeal simplesmente caiu de paraquedas nessa bagunça e precisa
parar de aceitar convites para aparecer na TV, ou que suas reais intenções eram
de diluir os ensinamentos da Igreja Católica a tal ponto que pudesse fazer, em
comparação, o insuportável Richard Dawkins parecer um homem de visão e de
ideias. A equipe de Dawkins muito provavelmente pagaria uma fortuna de 6
dígitos por tal liquidação a seu favor.
Resumindo,
de acordo com o Cardeal Pell: o Homem realmente evoluiu do macaco, Adão e Eva
não eram pessoas de verdade, o Gênesis é um mito, ateus certamente vão para o Paraíso,
e homossexuais, longe de estarem vivendo uma vida de pecado, são perfeitamente
livres para se casarem (seja lá o que isso possa significar!)
Como
amigos dessa estirpe a frente de Sua Igreja, para que Deus precisa de inimigos?
Enquanto
isso o Bispo Bernard Fellay se encontra a frente dos portões do Vaticano, de
chapéu na mão, a espera de assinar um testemunho de ortodoxia antes de ser
permitido entrar. Seus pecados? Bem, ele acredita que Deus criou nossos
primeiros pais, que Adão e Eva eram pessoas de verdade, que o Gênesis não é
meramente mitológico, que ateus e pessoas que odeiam a Deus dificilmente tem
passagem garantida para o Paraíso, e que homossexuais são merecedores da
acusação e do julgamento divino como qualquer outro pecador – homossexual ou heterossexual
– que se engaje em uma conduta imoral e impenitente.
Fecho
esta lamentação com o primeiro comentário postado no YouTube abaixo do vídeo do
debate Pell-Dawkins – que, só pra constar, foi assistido 76.776 vezes até
agora, número que não se compara com os milhões que o assistiram ao vivo:
“É-me
desconcertante ver como a hierarquia católica pode
conceder que a maioria das histórias bíblicas seja mito, mesmo continuando a
ensina-las como fato nas aulas de catecismo aos domingos, nas escolas católicas
e nas igrejas. A única parte da bíblia em que a Igreja Católica se mostra
intransigente é quanto a morte e ressureição de Cristo. Se até os católicos
mais velhos não acreditam em 99% da bíblia, por que devemos acreditar?”
De
fato! Bem vindo à Primavera do Vaticano II.