01/07/2009

Terá Bento XVI falado ex-cathedra?

Algum tempo atrás, publiquei um artigo no MidiaSemMáscara tratando da condenação, em dois momentos distintos – uma como cardeal e outra como Papa – que Bento XVI fez à Teologia da Libertação, esta deformação, este câncer, que trouxe para o seio da Igreja a idéia de que o Reino de Deus é o governo marxista mundial que um dia ainda instituiremos. Papa Bento se insurge contra esse movimento diabólico como intelectual que é, tanto em seu livro “Introdução ao Cristianismo”, quanto na Encíclica Spe Salvi. Reproduzo o artigo mais abaixo, já que me é impossível fornecer um link.

Leio agora no FratresInUnum, que o Papa Bento XVI disse, aos cerca de 14 mil peregrinos reunidos na praça de São Pedro para a audiência geral, que “Depois do Concílio Vaticano II se produziu aqui e ali a impressão de que a missão do sacerdote em nosso tempo fosse qualquer coisa de mais urgente” que o anúncio da Palavra e a administração dos sacramentos, porque houve quem pensasse “que se devesse em primeiro lugar construir uma sociedade diferente, que o principal dever fosse o de construir, antes de tudo, a justiça social”. “Anúncio e poder, isto é, Palavra e sacramento”, são “os dois pilares fundamentais do serviço sacerdotal, para além de suas possíveis e múltiplas configurações” sem os quais “se torna muito difícil compreender a identidade do presbítero e de seu ministério na Igreja”.

Jesus disse: “O vosso falar seja SIM SIM NÃO NÃO; porque tudo o que passa disso vem do Maligno” (Mt 5, 37). Papa Bento XVI seguiu precisamente este preceito.

Considero que aqui o Papa fala como Vigário de Cristo e não como intelectual. O ocupante do trono, e herdeiro, de São Pedro fala sobre o sacerdócio, sobre o poder de quem recebeu Sacramento da Ordem. É precípua matéria de fé. O Papa fala sem rodeios. O que ele diz é: o dever do sacerdote é o anúncio da palavra de Deus e a distribuição do sacramento; anúncio e poder. Isso está em total concordância com tudo que a Igreja sempre falou, com o Depósito da Fé, com a Tradição.

Não sou teólogo e meus conhecimentos sobre Teologia são mínimos. Mas se Bento XVI não falou ex-cathedra, passou perto!

Rezemos pelo Papa. Peçamos que ele viva mais alguns anos e que continue seu caminho de restauração da verdadeira Igreja de Cristo.

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Cardeal e Papa Condenam a Teologia da Libertação


O cardeal a que me refiro no título é Joseph Ratzinger e o papa é Bento XVI. Um e outro condenaram veementemente a Teologia da Libertação em dois documentos importantes.

O cardeal escreve, em 2000, um prefácio ao seu livro (uma re-edição de um livro escrito na década de 1960) Introdução ao Cristianismo. No aspecto político, eu diria que a introdução vale mais que o livro. Claro que no aspecto doutrinal o livro é muito bom e a introdução, dispensável.

O papa escreve em 2007, uma encíclica intitulada SPE SALVI.

Tratemos pois, em primeiro lugar, do prefácio ao livro “Introdução ao Cristianismo”. Diz o cardeal que desde a publicação do livro na década de 1960, muita coisa aconteceu no mundo. Ele toma dois anos em particular para comentar os eventos mais importantes dos últimos trinta anos do século XX: 1968 e 1989. Em 1989 ele vê o ano em que o ciclo da esperança materialista termina e lamenta as tragédias que essa esperança trouxe ao mundo. Ele diz: “No fundo, a doutrina marxista da salvação, se bem que dividida em variantes diversas de instrumentalização, era vista como o único roteiro para o futuro, baseado em motivação ética e, ao mesmo tempo , em conformidade com a visão científica do mundo.” O papa retomará esse tema na encíclica e o desenvolverá mais profundamente. O cardeal considera assim que 1989 é o ano que simboliza o fracasso histórico da “doutrina marxista da salvação”.

Mas, que salvação seria essa? A que nos levaria ao reino de Deus dos Evangelhos? Não. O cardeal responde logo abaixo: “Quem faz Marx o filósofo da teologia aceita a primazia dos elementos político e econômico que passam a ser as verdadeiras forças da salvação.”

E, perguntariam os leitores, quem fez de Marx o filósofo da Teologia? O cardeal responde: “Durante mais de uma década, a teologia da libertação parecia indicar a nova direção na qual a fé haveria de tornar-se novamente formadora do mundo porque se unia de uma nova maneira como as descobertas do momento histórico”. Depois de reconhecer os problemas econômicos e sociais da América Latina e do papel social da Igreja onde quer que ela esteja, o cardeal diz que a Igreja, em nome de seu papel social, escolheu seu guia: “Mas de que maneira [a Igreja cumpriria seu papel]? Pareceu então ser Marx o grande guia”. E ainda aduz: “Cabia agora a ele o papel que, no século XIII, tinha sido de Aristóteles; sua filosofia pré-cristã [e portanto ‘pagã’] precisou ser batizada para que a fé e a razão pudessem encontrar a sua relação correta.

Mas qual seria o problema de aceitar Marx? Não poderíamos batizá-lo, como fez Santo Tomás com Aristóteles. O cardeal afasta essa possibilidade quando diz: “Mas quem aceita Marx (em qualquer uma das variantes neomarxistas) como o representante de uma razão universal não adota simplesmente uma filosofia, uma visão da origem e do sentido da existência, assume sobretudo uma prática [o que significa que] (...) a salvação do ser humano é realizada pela política e pela economia, que determinam a face do futuro.” O que é isso senão, de forma integral e acabada, a Teologia da Libertação?

Para dissipar alguma dúvida que ainda possa restar, o cardeal claramente diz: “Vejo o problema verdadeiro e mais profundo das teologias da libertação na ausência de fato da idéia de Deus, o que acabou afetando naturalmente de modo decisivo também a figura de Cristo (fato ao qual já aludimos anteriormente). Não que se tenha negado a existência de Deus – de modo algum. Ele apenas era dispensável na ‘realidade’ que exigia toda a atenção. Carecia de função”.

Até aqui o cardeal fala como um teólogo. O pastor, que ele era e é, fala o seguinte: “Mas Deus é ‘prático’, Ele não é um mero fecho teórico qualquer para a visão do mundo, servindo eventualmente de consolo, diante do qual se estaca ou se passa simplesmente adiante. (...) Quando Deus é deixado de lado, tudo parece inicialmente continuar como antes. (...) Mas tudo muda no momento em que a mensagem de que Deus estaria morto passa a ser realmente percebida, fulminando o coração dos homens.” Como não concluir, com o cardeal, que a Teologia da Libertação é a teologia do Deus morto?

Na encíclica SPE SALVI quem fala é o papa, com toda a sua autoridade e pastoralidade. Mesmo assim, ele é incisivo qual tinha sido o cardeal Ratzinger. Já no item 4 da encíclica, cujo assunto é a esperança cristã verdadeira, ele não deixa dúvidas sobre o Magistério Ordinário da Igreja: “O cristianismo não tinha trazido uma mensagem sócio-revolucionária semelhante à de Espártaco que tinha fracassado após lutas cruentas. Jesus não era Espártaco, não era um guerreiro em luta por uma libertação política, como Barrabás ou Bar-Kochba. Aquilo que Jesus – Ele mesmo morto na cruz – tinha trazido era algo de totalmente distinto: o encontro com o Senhor de todos os senhores, o encontro com o Deus vivo e, deste modo, o encontro com uma esperança que era mais forte do que os sofrimentos da escravatura e, por isso mesmo, transformava a partir de dentro a vida e o mundo. (...) Em virtude do Batismo, [os cristãos] tinham sido regenerados, tinham bebido do mesmo Espírito e recebiam conjuntamente, um ao lado do outro, o Corpo do Senhor. Apesar de as estruturas externas permanecerem as mesmas, isto transformava a sociedade a partir de dentro. Se a Carta aos Hebreus diz que os cristãos não têm aqui neste mundo uma morada permanente, mas procuram a futura (cf. Heb 11, 13-14; Fil 3,20), isto não significa de modo algum adiar para uma perspectiva futura: a sociedade presente é reconhecida pelos cristãos como uma sociedade imprópria; eles pertencem a uma sociedade nova, rumo à qual caminham e que, na sua peregrinação, é antecipada.”[as ênfases são minhas].

Como a esperança cristã (aquela que “atrai o futuro para dentro do presente, que muda o presente e que faz o presente ser tocado pela realidade futura, fazendo com que as coisas futuras derramem-se naquelas presentes e as presentes nas futuras”), uma virtude teologal, foi rebaixada a uma “esperança marxista da salvação”, já identificada pelo cardeal Ratzinger? O papa identifica o final do século XVIII como o início desse rebaixamento. Além da Revolução Francesa, ele cita uma obra de Kant, em que o filósofo defende como sendo um movimento evolutivo importante a passagem da “fé eclesiástica” para a “fé religiosa”. Diz o papa: “O ‘reino de Deus’, de que falara Jesus, recebeu aqui uma nova definição e assumiu também uma nova presença: existe, por assim dizer, uma nova ‘expectativa imediata’: o ‘reino de Deus’ chega onda a ‘fé eclesiástica’ é superada e substituída pela ‘fé religiosa’, ou seja, pela mera fé racional”.

A revolução de 1789 prepara, segundo o papa, outra revolução: a proletária. Marx então aparece como o teórico que irá propor um “novo e grande passo”, um passo “definitivo da história rumo à salvação, rumo àquilo que Kant tinha qualificado com o ‘reino de Deus’.” Mais a frente o papa diz, “o progresso rumo ao melhor, rumo ao mundo definitivamente bom, já não vem simplesmente da ciência, mas da política – de uma política pensada cientificamente, que sabe reconhecer a estrutura da história e da sociedade, indicando assim a estrada da revolução, da mudança de todas as coisas”. E conclui: “Assim, a esperança bíblica do reino de Deus foi substituída pela esperança do reino do homem, pela esperança de um mundo melhor que seria o verdadeiro ‘reino de Deus’.” Como não lembrar aqui do slogan “Um outro mundo é possível” ?

Matar Deus e reduzir a esperança bíblica à mera esperança do reino do homem, essas são as características principais da Teologia da Libertação, segundo Ratzinger e Bento XVI.

Como pastor, o papa ainda continua a nos orientar quando às questões relativas aos problemas humanos que a espúria teologia não consegue resolver. Ele diz: “Devemos – é verdade – fazer tudo para superar o sofrimento, mas eliminá-lo completamente do mundo não entra nas nossas possibilidades, simplesmente porque não podemos desfazer-nos da nossa finitude e porque nenhum de nós é capaz de eliminar o poder do mal, da culpa que – como constatávamos – é fonte contínua de sofrimento.” Fala ainda mais pastoralmente: “Não é o evitar o sofrimento, a fuga diante da dor, que cura o homem, mas a capacidade de aceitar a tribulação e nela amadurecer, de encontrar o seu sentido através da união com Cristo, que sofreu com infinito amor. ”

Assim, temos duas análises sobre a Teologia da Libertação, ambas completamente coincidentes. Uma de um grande intelectual, o cardeal Ratzinger, e outra do Papa Bento XVI. Os católicos temos assim não só a fundamentação teológica e filosófica para refutar a Teologia da Libertação, mas também a fundamentação doutrinária do Magistério Ordinário da Igreja. Seja por honestidade intelectual, que toca a todos, seja por observação ao Magistério da Igreja, que toca especialmente aos católicos, devemos não só refutar, mas lutar contra esse arremedo de teologia.

Abusos doutrinários, teológicos, litúrgicos e lógicos vêm sendo cometidos há quase quatro décadas dentro da Igreja Católica, particularmente no Brasil. É bom ver que alguém quer por a casa em ordem, sobretudo porque essa Casa, foi Deus quem fundou. É bom ver, ainda mais, que esse alguém é o representante do Chefe Supremo da Casa.[1]
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[1] Ver, sobre este mesmo assunto: Antídotos contra a Teologia da Libertação e Lições das Missas Dominicais pós-Concílio Vaticano II

2 comentários:

Anônimo disse...

Boa observação sua que não tinha notado. Acho que vai render muitas boas discursões sobre esta catequese de Papa nesta quarta-feira.

Hilton disse...

Parabéns pelo blog professor Angueth! Deixo o endereço do meu www.luminavirtutum.blogspot.com. Que Deus confirme sempre seu empenho em defesa da Tradição.