Quando recebo comentários de posts antigos, tenho o hábito
de ler os posts em questão e os outros comentários, já antigos. Deparei-me com
um comentário que merece ser respondido. O comentário está no post A
Neurociência Refuta o Livre-Arbítrio?.
Antes de irmos ao comentário, permitam-me indicar, aos
leitores interessados, alguns outros posts do blog sobre neurociência, que
listo a seguir: Diocese
de Belo Horizonte avisa: a neurociência agora substitui a Bíblia.; Neurocientista
(sic!) puxa orelha do blogueiro e ele responde.; e Leitora
esclarece seus pontos de vista: blog agradece.
Voltemos então ao comentário do anônimo. Ele diz:
“Caro
Antonio Emilio Angueth de Araujo, você acha mesmo que tem a resposta para tudo
recorrendo ao Deus. Mas quem cria a matéria que advém do nada, é o próprio
nada! é porque a matéria só pode existir advindo do seu contrario, e não porque
meros humanos acham que têm um Deus que se deu ao trabalho de nos dar a razão.
O nosso Deus são as leis que regem a matéria! O mundo não foi feito pra nós,
deixe-se de iludir com essas tretas. Nós podemos servir a matéria tentando
compreender-mo-nos para começar, e depois sim tentar compreender porque existe
a matéria.”
Esse comentário aparece depois de uma longa série de
comentários de leitores e de minhas respostas a eles. Os interessados podem
seguir a sequência das intervenções lá no post em questão.
Vocês podem notar, em primeiro lugar, a quantidade de
certezas que podem caber na cabeça de um idiota. Tais certezas irão garantir
que o indivíduo irá permanecer idiota pelo resto de seus dias.
O comentarista me pergunta: “você acha mesmo que tem a
resposta para tudo recorrendo ao Deus?”. Eu respondo: não, procuro respostas em
Deus somente para as questões fundamentais. Por exemplo, quando tenho que
escolher um dentista, recorro a outras fontes. Além disso, Deus não é uma coisa
arbitrária. Sua existência pode ser provada rigorosamente. E coisa certamente
curiosa para o anônimo: essa prova, em cinco vias, tem já 700 anos de idade e é
baseada em raciocínios aristotélicos que têm uns 25 séculos. O leitor está
atrasado de 7 séculos, na melhor das hipóteses, e de 25, na pior.
O comentarista continua: “Mas quem cria a matéria que advém
do nada, é o próprio nada!” O leitor aqui está perdido completamente e não sabe
o que diz. Aos leitores interessados nesse tópico, sugiro as primeiras páginas
da Filosofia Concreta de Mário Ferreira dos Santos. Veja só leitor anônimo, não
estou recorrendo a Deus para te refutar, e sim a um mero mortal que, aliás, já
morreu. Vocês verão como Mário parte do que ele chama ponto arquimédico, “cuja
certeza ultrapassa ao nosso conhecimento, independente de nós, e é ôntica e
ontologicamente verdadeira”. Esse ponto é a afirmação “alguma coisa há”. Daí
ele deduz “o nada absoluto, por ser impossível, nada pode”.
Pulo algumas frases idiotas e chego a: “O nosso Deus são as
leis que regem a matéria! O mundo não foi feito pra nós, deixe-se de iludir com
essas tretas”. Primeiramente, “nosso Deus” não, cara-pálida! Sei o suficiente
acerca da ciência para não fazer perguntas fundamentais a essa deusa de Augusto
Comte. É curioso também que o anônimo não quer se iludir “com tretas” e
acredita nos cientistas. Como suspeito que ele não entenda nada de ciência, ou de
leis da matéria, suponho que ele realmente acredite no que os cientistas falam
na televisão ou na Internet. Acredita em Richard Dawkins ou no Dráuzio Varella.
Se isso não é acreditar em tretas, não sei o que é.
A última frase do comentário é um mistério para mim.
Enfatizo a expressão “servir a matéria”. Sim, está certo, quem a tem como deusa, deve mesmo servi-la. Se
tivesse o leitor diante de mim, eu perguntaria: o que é a matéria, e ele teria
um colapso na minha frente.
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