O outro texto é do livro de Luis Pazos, Lógica Econômica, Editorial Diana, México, 1999. O Instituto Liberal do Rio de Janeiro oferece ao público brasileiro alguns livros desse autor. O livro em pauta, se não me engano, não tem tradução para o português. Ele é um livro sobre a fundamentação lógica da Economia.
O assunto dos dois textos é o mesmo: fundamentação moral e religiosa da economia.[2] Essa combinação – moral, religião e economia – no Brasil, é explorada, quase exclusivamente[3], pela esquerda, e leva, quando envolve o clero católico, o nome de Teologia da Libertação. Jesus, segundo essa “teologia”, teria sido um marxista avant la letre. Isso resulta em que, mesmo quando o brasileiro tenta a difícil e nobre (a mais elevada) tarefa de se tornar religioso – principalmente, cristão católico –, ele, sem querer e na maioria das vezes, se torna, também ou até exclusivamente, marxista.
Contra essa situação lastimável, esses dois textos, talvez, façam um pequeno bem à alma de alguns que ainda não se contaminaram, a ponto de se tornarem surdos pela algazarra esquerdista.
Paulo de Tarso e o Dinheiro
Russel Kirk
Os primeiros cristãos, como os gregos da antiguidade clássica, perceberam que o dinheiro pode ser nocivo. Paulo de Tarso, que fez mais que qualquer um para difundir os ensinamentos de Jesus Cristo, escreveu ao seu amigo e discípulo Timóteo, em Éfeso, instruindo-o que os seguidores de Cristo devem se contentar com pouco, neste mundo:
Porque nada trouxemos ao mundo, tampouco nada poderemos levar. Tendo alimento e vestuário, contentemo-nos com isto. Aqueles que ambicionam tornar-se ricos caem nas armadilhas do demônio e em muitos desejos insensatos e nocivos, que precipitam os homens no abismo da ruína e da perdição. Porque a raiz de todos os males é o amor ao dinheiro. Acossados pela cobiça, alguns se desviaram da fé e se enredaram em muitas aflições.
1 Timóteo 6:7-10
Deve-se observar que o apóstolo escreve “o amor ao dinheiro.” Freqüentemente, essa frase é distorcida como se ela fosse “o dinheiro é a raiz de todo mal.” E, a expressão “todo mal”, é, também, mal-entendida como “todas as formas do mal” ou como “uma multiplicidade de males”. Paulo é muito claro, em outras passagens, sobre a existência de outros grandes males além do amor ao dinheiro.
O apóstolo Paulo diz, nessa passagem, que a adoração ao dinheiro, como se ele fosse um ídolo ou mesmo um espírito vivente, é uma armadilha e uma tentação. Jesus declarou:
Nenhum servo pode servir a dois senhores: ou há de odiar a um e amar o outro, ou há de aderir a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro.
Lc 16:13
Em resumo, o ser humano que ama o dinheiro adora um falso deus. Pois, só Deus e os homens merecem ser amados. Amar uma sacola de barras de ouro é um “desejo insensato e nocivo,” pois o ouro (ao contrário de Deus e dos homens) não pode retribuir esse amor.
O dinheiro pode comprar muita coisa – talvez, mais coisas do que deveria. Mas, ele não pode comprar o caráter, a honra, ou o amor das criaturas – ou o amor de Deus. (...)
Igualmente, o dinheiro pode comprar conforto, mas não pode comprar felicidade. O amor ao dinheiro pode tornar o ser humano um egoísta e solitário sovina, muito distante da felicidade. Por amor ao dinheiro, homens e mulheres, às vezes, cometem crimes terríveis, deformando ou destruindo, dessa forma, suas próprias almas. O livro dos Provérbios, nos capítulos 15 e 16, admoesta o leitor a estabelecer prioridades em relação ao dinheiro. Somos alertados em Pr 15:16, “Vale mais o pouco com o temor do Senhor que um grande tesouro com a inquietação.” Provérbios 16:8 tem uma ênfase similar; “Mais vale o pouco com justiça do que grandes lucros com iniqüidade.” Esses trechos da Escritura não desprezam a riqueza (grifo do tradutor); eles somente alertam para os perigos que estão associados com ela. Outro versículo que serve como um modelo para a formação de uma atitude em relação ao dinheiro é encontrado em Pr 16:16: “Adquirir a sabedoria vale mais que o ouro; antes adquirir a inteligência que a prata.”
O dinheiro em si não é nem bom nem mal. Tudo depende do uso que dele fazemos. Um uso prudente e caridoso do dinheiro é louvável. Um uso arrogante e esbanjador, desprezível. Inteligência, imaginação e princípios morais determinam nossas escolhas das formas de se empregar o dinheiro. Assim, a ciência da Economia não é “uma lei em si.” Para fazer boas escolhas econômicas – incluindo as escolhas das formas da utilização do dinheiro – todo indivíduo deve olhar para além da oferta e da procura, e para além das tabelas de juros, na direção dos ensinamentos religiosos, filosóficos e da literatura. O principal fundador da moderna Economia, Adam Smith, foi um professor de filosofia moral. Para usarmos bem o dinheiro, precisamos entender (como fez Smith) que acima das leis da Economia, há as leis da moralidade.
Muito pouca gente tem todo o dinheiro que deseja; alguns o têm por pouco tempo e depois o perde. Para esses, Pr 23:5 ensina “Mal fixas os olhos nos bens, e nada mais há, porque a riqueza tem asas como a águia que voa para o céu.” Alguns têm mais dinheiro do que seria desejável. Se todos tivessem dinheiro em abundância – dinheiro real que comprasse bens sem limite – a raça humana, provavelmente, se arruinaria, comendo, bebendo e dormindo em excesso. Se todos fossem ricos, certamente, muito pouco trabalho útil seria feito. Assim, quando você estiver com pouco dinheiro, pense nessas coisas.
O Cristianismo e a Pobreza
Luis PazosEm resumo, o ser humano que ama o dinheiro adora um falso deus. Pois, só Deus e os homens merecem ser amados. Amar uma sacola de barras de ouro é um “desejo insensato e nocivo,” pois o ouro (ao contrário de Deus e dos homens) não pode retribuir esse amor.
O dinheiro pode comprar muita coisa – talvez, mais coisas do que deveria. Mas, ele não pode comprar o caráter, a honra, ou o amor das criaturas – ou o amor de Deus. (...)
Igualmente, o dinheiro pode comprar conforto, mas não pode comprar felicidade. O amor ao dinheiro pode tornar o ser humano um egoísta e solitário sovina, muito distante da felicidade. Por amor ao dinheiro, homens e mulheres, às vezes, cometem crimes terríveis, deformando ou destruindo, dessa forma, suas próprias almas. O livro dos Provérbios, nos capítulos 15 e 16, admoesta o leitor a estabelecer prioridades em relação ao dinheiro. Somos alertados em Pr 15:16, “Vale mais o pouco com o temor do Senhor que um grande tesouro com a inquietação.” Provérbios 16:8 tem uma ênfase similar; “Mais vale o pouco com justiça do que grandes lucros com iniqüidade.” Esses trechos da Escritura não desprezam a riqueza (grifo do tradutor); eles somente alertam para os perigos que estão associados com ela. Outro versículo que serve como um modelo para a formação de uma atitude em relação ao dinheiro é encontrado em Pr 16:16: “Adquirir a sabedoria vale mais que o ouro; antes adquirir a inteligência que a prata.”
O dinheiro em si não é nem bom nem mal. Tudo depende do uso que dele fazemos. Um uso prudente e caridoso do dinheiro é louvável. Um uso arrogante e esbanjador, desprezível. Inteligência, imaginação e princípios morais determinam nossas escolhas das formas de se empregar o dinheiro. Assim, a ciência da Economia não é “uma lei em si.” Para fazer boas escolhas econômicas – incluindo as escolhas das formas da utilização do dinheiro – todo indivíduo deve olhar para além da oferta e da procura, e para além das tabelas de juros, na direção dos ensinamentos religiosos, filosóficos e da literatura. O principal fundador da moderna Economia, Adam Smith, foi um professor de filosofia moral. Para usarmos bem o dinheiro, precisamos entender (como fez Smith) que acima das leis da Economia, há as leis da moralidade.
Muito pouca gente tem todo o dinheiro que deseja; alguns o têm por pouco tempo e depois o perde. Para esses, Pr 23:5 ensina “Mal fixas os olhos nos bens, e nada mais há, porque a riqueza tem asas como a águia que voa para o céu.” Alguns têm mais dinheiro do que seria desejável. Se todos tivessem dinheiro em abundância – dinheiro real que comprasse bens sem limite – a raça humana, provavelmente, se arruinaria, comendo, bebendo e dormindo em excesso. Se todos fossem ricos, certamente, muito pouco trabalho útil seria feito. Assim, quando você estiver com pouco dinheiro, pense nessas coisas.
O Cristianismo e a Pobreza
O cristianismo, segundo uma concepção materialista da pobreza, seguida pelos partidários da “igreja dos pobres”, só aceitaria pobres entre seus seguidores e só eles entrariam no Reino dos Céus. O primeiro problema seria delimitar quem seria pobre e a partir de que nível de renda deixaria de sê-lo. A ONU, o Banco Mundial ou o Vaticano fixariam os níveis de pobreza?
O conceito evangélico de pobreza não se refere à carência de bens materiais, mas à humildade como qualidade espiritual. Cristo fala “aos pobres em espírito” em outra dimensão do ser humano, ignorada ou menosprezada pelos materialistas.
O contrário do pobre, nessa dimensão, não é o rico em bens materiais, mas o soberbo que, com base na riqueza material ou no poder, deprecia os demais e pensa que não necessita de Deus e da religião.
O teólogo Antonio Fuentes diz, em relação aos elogios de Cristo aos pobres: “Quando Ele chama de bem-aventurados os pobres, não elogia a pobreza material, nem diz que o pobre é feliz pelo simples fato de ser pobre. Os verdadeiros recebedores da primeira bem-aventurança são os pobres em espírito”.
Contrária, em certos aspectos, à visão materialista da pobreza nos ensinamentos de Cristo é a percepção maniqueísta da natureza humana. Tudo o que é material é considerado mal e tudo o que é espiritual, bom. O maniqueísmo também parte de uma visão equivocada da natureza humana.
Essa visão influenciou alguns filósofos católicos, como Santo Agostinho, que opôs a cidade terrena à cidade de Deus. Santo Agostinho foi maniqueísta numa etapa de sua vida e, mesmo que depois tenha retificado sua posição, lhe ficou, ainda, uma certa depreciação pelo lado material do ser humano. No entanto, Santo Agostinho entende corretamente o conceito evangélico de pobreza e riqueza, não comete o erro de dar uma interpretação unidimensional à mensagem de Cristo sobre a pobreza e a riqueza.
Diz Santo Agostinho: “Aprendeis a ser pobres e necessitados e a possuir algo neste mundo como se nada possuirdes. Porque existem mendigos repletos de orgulho e ricos que confessam seus pecados. Deus resiste aos orgulhosos, mesmo que estejam cobertos de sedas e não de farrapos, mas concede graça aos humildes, possuam eles bens deste mundo ou não” (Comentário Sobre a Graça).
Esse comentário de Santo Agostinho confirma que a mensagem de Cristo, corretamente entendida, se refere a dimensões muito diferentes da de uma desigualdade de classes baseada na posse de bens materiais. Na mensagem cristã, a pobreza é humildade e a riqueza é orgulho e avareza. Fazemos essas reflexões para demonstrar a confusão que pode causar o não reconhecimento das diversas dimensões do ser humano e a não distinção dos valores próprios de cada dimensão.
[1] Avisem isso, por favor, para os nossos candidatos presidenciais! (N. do T.)
[2] Ver artigo recente no MSM, de Ubiratan Jorge Iorio, intitulado Mercado e Moralidade. (N.do T.)
[3] Há, felizmente, algumas exceções, Olavo de Carvalho e o embaixador José Osvaldo de Meira Penna sendo duas delas. Do embaixador, vale a pena ler, dentre outros, Da Moral em Economia, UniverCidade, 2002. (N. do T.)