20/08/2015

Saibam procurar os que desejam autoajuda.

A pequena introdução ao romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, contém mais sabedoria que todos os livros do acadêmico Paulo Coelho (lamentavelmente, membro da Academia que Machado fundou e que, como tudo o mais no Brasil, desceu a ladeira da mediocridade), se é que eles contêm alguma. Este romance é considerado por Sidney Silveira o maior romance já escrito no Brasil. Aliás, Sidney está ministrando, com o prof. Sérgio Pachá, um extraordinário e imperdível curso sobre Machado.

A introdução vale também como uma aula de como escrever, de como expressar, com pouquíssimas linhas, todo um modo de ser, de ver o mundo, de interpretar as relações humanas e sociais, de, enfim, se colocar no mundo como observador e crítico. Vamos ao texto, então. Divirtam-se! Os negritos são meus. Não os pude evitar!

Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente consternará, é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinqüenta, nem vinte, e quando muito, dez.. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou de um Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser. Obra de finado. Escrevia-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que a gente grave achará no livro umas aparências de puro romance, ao passo que a gente frívola não achará nele o seu romance usual; ei-lo aí fica privado da estima dos graves e do amor dos frívolos, que são as duas colunas máximas da opinião. 

 Mas eu ainda espero angariar as simpatias da opinião, e o primeiro remédio é fugir a um prólogo explícito e longo. O melhor prólogo é o que contém menos coisas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado. Conseguintemente, evito contar o processo extraordinário que empreguei na composição destas Memórias, trabalhadas cá no outro mundo. Seria curioso, mas nimiamente extenso, aliás desnecessário ao entendimento da obra. A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te não agradar, pago-te com um piparote, e adeus.
Brás Cubas


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