26/10/2009

Lições das missas dominicais pós-Vaticano II– Parte XXVI

N’O DOMINGO, Semanário Litúrgico-Catequético, de 13/09/2009, Pe. Paulo Bazaglia comenta, no artigo intitulado “Encontrando a vida”, o Evangelho Mc 8, 27-35. Nesta passagem Jesus pergunta aos discípulos quem eles acham que Ele é, diz que vai sofrer muito, ensina a Pedro uma dura lição e acaba dizendo “quem quiser salvar a vida perdê-la-á, mas quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, salvá-la-á.”

O artigo do Pe. Bazaglia é, de fato, um exemplo didático do livre exame das Escrituras, proposto por Lutero. Se Pe. Bazaglia fosse pastor protestante, eu nada comentaria de seu artigo. Sendo padre, eu não posso deixar de comentar e reprovar o que ele escreve.

“Um dos grandes enganos do cristianismo, ao longo destes dois milênios, é ter transformado a cruz de Jesus de conseqüência em princípio”, diz Pe. Bazaglia. Veja que esse padre vem nos dizer que o cristianismo bimilenar, que só pode ser o catolicismo (palavra incômoda para os padres moderninhos), cometeu um engano que, não fosse, ele, Pe. Bazaglia, dele não teríamos notícia. Imaginem vocês toda a galeria dos Padres gregos e latinos, muitos deles santos e doutores da Igreja. Imaginem os santos medievais, Santo Alberto Magno, Santo Tomás de Aquino, São Boaventura. Imaginem depois, Santa Catarina de Sena, Santa Teresa de Ávila, Santo Inácio de Loyola. Um pouco depois, São José Maria Grignion de Montfort, Santo Afonso Maria de Ligório. Enfim, todos estes e muito mais, todos estavam enganados em relação ao significado da cruz. Numa missa imaginária em que se encontrassem todos esses santos, Pe. Bazaglia, em sua homilia, iria subir ao púlpito e dizer: todos os senhores estão e estiveram errados com relação ao significado da cruz. Imaginem a cena!

Ora, por que a Cruz deve ser o princípio para todo católico? Porque a Cruz significa Redenção e se não partirmos da Redenção, da certeza de que a Cruz nos redimiu, não a todos, mas a muitos de nós, de onde é que partiríamos? É ela que nos dá a confiança de que nós merecemos o perdão de Deus, não pelos nossos mérito, mas pelos méritos de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Pe. Bazaglia discorda disso. Querem ver? Ele diz: “Quando a cruz se transforma em princípio para a vida cristã, no entanto, a cruz de Jesus é traída. A cruz como princípio se torna facilmente dissociada da vida, levando a um espiritualismo vazio que nada transforma e pode chegar ao masoquismo.” Pe. Bortolini, em artigo do mesmo semanário, chama também de traidor a todo católico que respeita a tradição da Igreja. Agora, ficamos sabendo que nós católicos que colocamos a Cruz de Cristo como princípio de nossas vidas, somos também traidores, e também masoquistas. Chamar a frase do Pe. Bazaglia de herética é pouco. É preciso já ter perdido todos os resquícios de catolicismo para que se afirme algo tão blasfemo.

Duas lembranças me ocorreram quando li a frase acima. A primeira é que a acusação de masoquista foi feita também a São Padre Pio que, segundo os acusadores, se infligia os ferimentos dos estigmas de Cristo. Ele que viveu, durante 50 anos, literalmente crucificado. Este santo, Pe. Bazaglia, transformou a Cruz em princípio. Na verdade, ela, a Cruz, se incrustou em sua carne. São Padre Pio, rogai por nós.

A segunda lembrança foi a de 1Cor 1, 18: “De fato, a palavra da cruz é loucura para aqueles que se perdem; mas, para nós, que estamos no caminho da salvação, é força de Deus.”. Lembrei também de 1Cor 1, 22-23: “Na verdade, os judeus pedem milagres e os gregos procuram a sabedoria; nós, ao invés, pregamos a Cristo crucificado, que é um escândalo para os judeus e uma loucura para os gentios.”

Mas, Pe. Bazaglia nos informa que São Paulo estava “enganado” quando dizia (Gal 2, 19): “De fato, eu, por meio da lei, morri para a lei, a fim de viver para Deus; com Cristo me encontro cravado na cruz, e já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim.” Isso, no livre exame de Pe. Bazaglia é “espiritualismo vazio”. São Paulo estava “traindo a cruz” quando dizia (Gal 5, 24): “Ora, os que pertencem a Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e os seus desejos.”

Pe. Bazaglia ainda nos surpreende ao final do artigo. Ele diz: “O único bem que temos é a vida, presente de Deus, e somente a encontraremos à medida que a entregarmos em favor dos irmãos, pela mesma causa de Jesus.” Ai, meu Jesus Cristinho! Pe. Bazaglia não sabe o que quer dizer perder esta vida para ganhar a outra.

Vamos ver se este padre aprende alguma coisa sobre “perder esta vida” para obter a outra de Santa Teresa de Ávila. Ela diz no “Caminho da Perfeição”, capítulo VIII, o seguinte. Os negritos são meus.

“Agora vamos ao desapego que devemos ter, pois tudo está nisto se for com perfeição. Digo que aqui está tudo, porque, abraçando-nos só com o Criador e não se nos dando nada de todas as coisas, Sua Majestade infunde as virtudes de maneira que, trabalhando nós pouco a pouco o que está em nosso poder, não teremos muito a pelejar, pois o Senhor toma em Sua mão a nossa defesa contra os demônios e contra o mundo. Pensais, irmãs, que é pequeno bem procurar este bem de nos darmos todas ao Todo sem fazermos partilhas? E, pois n’Ele estão todos os bens.”

Então, “perder esta vida” é morrer para o mundo, “não se nos dando nada de todas as coisas”. Mais à frente, ainda falando às suas filhas do Carmelo, Santa Teresa diz: “mas resta desapegarmo-nos de nós mesmas e este apartar-nos de nós mesmas e sermos contra nós é coisa dura, porque estamos muito unidas a nós e nos amamos muito.”

Assim, Pe. Bazaglia, morrer para esta vida, estarmos “com Cristo cravados na cruz”, não é ser solidário, não é “entregarmos a vida em favor dos irmãos” – que pode muito bem significar um marxismo de segunda mão –, não é participarmos de pastorais de nossa paróquia, não fazermos doação para o “Criança Esperança”. É muitíssimo mais que isso. É desapegarmos das coisas do mundo e também de nós mesmos. É “sermos contra nós”. E isso, padre, significa estarmos crucificados com Cristo, significa colocarmos a Cruz em primeiro lugar, no princípio. E isso, quem o consegue?



1. Para fazer DOWNLOAD DO LIVRO com os primeiros 19 posts sobre a Missa de Paulo VI (e algumas coisas mais) clique aqui.
2. Para ver outros comentários sobre a Missa nova, clique:
Parte XX, Parte XXI, Parte XXII, Parte XXIII, Parte XXIV, A dissolução da catequese: Romano Amério conta como foi, Parte XXV

3 comentários:

Anônimo disse...

Com todo respeito professor, eu prefiro seus textos sobre outos temas. esse tópico é cansativo.

Antonio Emilio Angueth de Araujo disse...

Caro anônimo,

Obrigado pelo seu cometário e pela sua franqueza.

Talvez eu estaja mesmo exagerando, mas sofri muito lendo os folhetos dominicais. Acho também que eles transformam católicos em não-católicos. Considero a catequese deles uma catequese anti-católica. Procuro como meus comentários (admito que possam ser enfadonhos) contrabalançar o folheto com uma, espero, sã catequese.

Guardarei, contudo, suas considerações para que eu não passe da conta. Tenho recebido comentários positivos, tanto pessoais quanto no blog. Mas uma hora terei de parar.

Um abraço. Antônio Emílio Angueth de Araújo

FLOYD disse...

Só é chato para quem não gosta do tema; quem gosta, lê.
Portanto, quem não gosta,que leia os outros textos e deixe os "chatos" para quem gosta.
Simples assim.